capítulo seis
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capítulo seis

capítulo seis.

anderson
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capítulo seis.

O CORPO INTERIOR.

O ser é o seu eu interior mais profundo.

Você falou sobre a importância de existirem raízes profundas dentro de nós, habitando nossos corpos.

O que quis dizer com isso?

O corpo pode se tornar um ponto de acesso para o domínio do Ser. Vamos nos deter

mais profundamente nisso agora.

Ainda não tenho certeza se entendi o que você quer dizer com Ser.

“Água? O que você quer dizer com isso? Não estou entendendo nada”. É o que um

peixe diria, se tivesse uma mente humana.

Por favor, pare de tentar entender o Ser. Você já teve lampejos significativos do Ser,

mas a mente vai sempre tentar espremê-lo dentro de uma caixa e colocar-lhe um rótulo.

Isso não dá certo. O Ser não pode se tornar um objeto de conhecimento. No Ser, o sujeito

e o objeto formam uma coisa só. O Ser pode ser sentido como o eternamente presente Eu

sou, que está além do nome e da forma. Sentir e, em conseqüência, saber que você é e

permanecer nesse estado profundamente enraizado é o que se chama iluminação, é a

verdade que Jesus diz que nos libertará.

Libertará do quê?

Libertará da ilusão de que não somos nada mais do que o nosso corpo e a nossa

mente. É nessa “ilusão do eu interior”, nas palavras de Buda, que está o erro central.

Libertará dos inúmeros disfarces do medo, que é uma conseqüência inevitável dessa ilusão, o

medo que não vai parar de nos torturar, enquanto continuarmos extraindo o sentido do eu

interior exclusivamente dessa forma efêmera e vulnerável. E libertará do pecado, esse

sofrimento que inconscientemente infligimos a nós mesmos e aos outros, enquanto a ilusão

governar aquilo que pensamos, dizemos e fazemos.

Olhe além das palavras.

Não gosto da palavra pecado. Ela pressupõe um julgamento e uma atribuição de culpa.  

Posso entender isso. Durante muitos séculos, foram se acumulando interpretações

erradas em torno de palavras como pecado, devido à ignorância, à incompreensão ou a um

desejo de controle, embora todas contenham um fundo de verdade. Se você não for capaz

de olhar para além de tais interpretações e, por isso, não reconhecer a realidade para a qual

a palavra aponta, então não a use. Não se prenda às palavras. Uma palavra nada mais é do

que um meio para atingir um fim. É uma abstração. Tal qual um letreiro em forma de seta

em um poste, uma palavra aponta para além dela mesma. A palavra mel não é mel. Você

pode estudar e falar a respeito de mel pelo tempo que quiser, mas não vai saber o que é

enquanto não prová-lo. Depois de provar, a palavra perde a importância e não ficamos

mais presos a ela. De forma semelhante, podemos falar ou pensar sobre Deus, sem parar,

pelo resto da vida, mas será que isso significa que conhecemos ou que tivemos uma rápida

visão da realidade para a qual a palavra aponta? Ela não passa de um apego obsessivo a um

letreiro no poste, um ídolo mental.

O contrário também acontece. Se, por alguma razão, não gostamos da palavra mel,

pode ser que jamais o experimentemos. Se você tem uma forte aversão à palavra Deus, o

que é uma forma negativa de apego, pode estar negando não só a palavra como também a

realidade para a qual ela aponta. Você estará se privando da possibilidade de vivenciar essa

realidade. Tudo isso tem, naturalmente, uma relação direta com o fato de estarmos

identificados com as nossas mentes.

Portanto, se uma palavra não significa mais nada para você, jogue-a fora e use outra

que signifique. Se você não gosta da palavra pecado, chame-a então de inconsciência ou

insanidade. Essa atitude talvez lhe aproxime mais da verdade – a realidade que está além da

palavra – do que um longo uso equivocado da palavra pecado, deixando pouco espaço para a

culpa.

Essas palavras também não me agradam. Elas pressupõem que existe alguma coisa errada comigo.

É como se estivessem me julgando.

Claro que existe alguma coisa errada com você e ninguém está julgando nada.

Sem querer ofender, mas você não pertence à raça humana que matou mais de cem

milhões de membros da própria espécie, somente no século vinte?

Você quer dizer que existe culpa por associação?

Não é uma questão de culpa. Mas, enquanto a mente nos governar, fazemos parte da

insanidade coletiva. Talvez você não tenha olhado profundamente para dentro da condição

humana sob o domínio da mente. Abra os olhos e veja o medo, o desespero, a inveja e a

violência que penetra em tudo. Atente para a crueldade e o sofrimento abomináveis, em

uma escala jamais imaginada, que os homens infligiram e continuam a infligir a outros

homens, assim como a outras formas de vida. Você não precisa condenar, apenas observe.

Isso é pecado. Isso é insanidade. Isso é inconsciência. Acima de tudo, não esqueça de

observar a sua própria mente. Busque nela a raiz da insanidade.

Encontre a sua realidade invisível e indestrutível

Você disse que a identificação com a forma física faz parte da ilusão. Então como é que o corpo pode

nos levar à realização do Ser?

O corpo que podemos ver e tocar não consegue nos conduzir para dentro do Ser.

Mas esse corpo visível e palpável é só uma casca, ou melhor, uma percepção limitada e

distorcida de uma realidade mais profunda. Em nosso estado natural de conexão com o

Ser, essa realidade mais profunda pode ser sentida, a cada momento, como o corpo interior

invisível, que é a presença viva dentro de nós. Portanto “habitar o corpo” é sentir o corpo

bem lá no fundo, de modo a sentir a vida dentro dele e, assim, realizar que somos algo mais

além da forma exterior.

Mas isso é só o começo de uma jornada interior, que nos levará ainda mais fundo para

uma região de grande serenidade e paz, embora também de grande poder e de vida

palpitante. No início, talvez você só consiga ter rápidas visões dessa região, mas, através

delas, começará a perceber que você não é apenas um fragmento sem sentido em um

universo estranho, levemente suspenso entre o nascimento e a morte, com poucos

momentos prazerosos de curta duração seguidos de dor e, no final, de devastação. Por

baixo da forma exterior, estamos em conexão com algo tão grande, tão incomensurável, tão

sagrado, que não pode ser concebido, nem compreendido através de palavras, embora eu

esteja falando sobre ele agora. Estou falando não para dar a você alguma coisa em que

acreditar, mas para mostrar de que modo você pode conhecê-lo.

Enquanto sua mente absorver toda a sua atenção, você não conseguirá estar em

conexão com o Ser. A mente absorve toda a sua consciência e a transforma em matéria

mental. Você não consegue parar de pensar. O pensamento compulsivo se tornou uma

doença coletiva. Tudo o que você achava que sabia a seu respeito passa a se originar da

atividade mental. Sua identidade, como não tem mais raízes no Ser, se transforma em uma

construção mental vulnerável e indispensável, que cria o medo e este passa a ser a emoção

oculta predominante. Fica faltando, então, a única coisa que realmente importa em sua

vida, que é a percepção do seu eu interior mais profundo, a sua indestrutível e invisível

realidade.

Para se tornar consciente do Ser, você precisa ter de volta a consciência aprisionada

pela mente. Essa é uma das tarefas mais essenciais na sua jornada espiritual. Ela vai libertar

grandes porções de consciência que antes estavam presas nos pensamentos inúteis e

compulsivos. Uma forma eficaz de realizar essa tarefa é desviar o foco da atenção do

pensamento e dirigi-lo para o interior do seu corpo, onde o Ser pode ser percebido, numa

primeira etapa, como o campo de energia invisível que dá vida àquilo que você entende

como seu corpo físico.

Conecte-se com o seu corpo interior. 

Vamos fazer uma experiência agora. Talvez ajude fechar os olhos para este exercício.

Depois, quando o “estar dentro do corpo” se tornar algo fácil e natural, isso não será mais

necessário. Dirija a atenção para dentro do seu corpo. Sinta-o lá no fundo. Está vivo? Há

vida nas suas mãos, braços, pernas e pés, em seu abdômen, no seu peito? Você consegue

sentir o campo de energia sutil impregnando todo o seu corpo e fazendo palpitar cada

órgão e cada célula? Percebe o que está acontecendo em todas as partes do corpo ao

mesmo tempo, como se fosse um só campo de energia? Mantenha o foco, por uns

momentos, sobre a sensação que passa pelo seu corpo interior. Não comece a pensar sobre

ela. Sinta-a. Quanto mais atenção você der à sensação, mais clara e forte ela ficará. É como

se cada célula se tornasse mais viva e, se você tiver uma forte percepção visual, talvez

obtenha uma imagem do seu corpo ficando luminoso. Embora uma imagem assim possa

lhe ajudar temporariamente, preste mais atenção ao que você está sentindo do que a

qualquer imagem que possa surgir. Uma imagem, não importa o quanto seja bela ou

poderosa, já tem uma forma definida, e, por isso, deixa menos espaço para penetrar mais

fundo.

A sensação dentro do nosso corpo interior não tem forma, não tem limites, não tem

um fim. Sempre podemos penetrar mais fundo. Se você não consegue sentir muito bem

esse estágio, preste atenção ao que consegue sentir. Talvez exista um leve formigamento em

suas mãos e em seus pés. Já basta para o momento. Focalize apenas a sensação. O seu

corpo está se tornando vivo. Praticaremos outras vezes, mais adiante. Por favor, abra os

olhos agora, mas mantenha alguma atenção no campo de energia interior do corpo, mesmo

que esteja olhando a esmo. O corpo interior está na fronteira entre a forma e a essência,

que é a sua verdadeira natureza. Nunca perca o contato com ele.