Terror Cósmico, até onde ele pode ir?
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Terror Cósmico, até onde ele pode ir?

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David Avelar - Literatura
10 min
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Cheiro de Livro - Sua sinestesia literária já vai começar!

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Eu sei que existem diversos teóricos que se esforçam para estudar com profundidade a literatura em suas diversas camadas. Não é esse o meu desejo, eu quero trazer para vocês uma oportunidade de pensar sobre o que é feito na academia de forma menos engessada ou complicada! Sou apenas um mediador, como sempre as fontes estão no final do texto!

Dito isto, quero expressar algumas percepções que construí sobre um dos subgêneros que mais me cativa! Penso que cativar é uma boa forma de sentir as obras dessa categoria, porque convenhamos, quando se fala em horror ou terror, é o total ou parcial assombro, agonia e inquietação, o que normalmente sentimos, ou buscamos!  

Então, o que encontramos ao ler as tais obras de Terror Cósmico, subgênero do horror gótico criado por H.P. Lovecraft?

Rituals of Cthulhu. Crédito e diretos reservados: MrZarono in Deviantart.
Rituals of Cthulhu. Crédito e diretos reservados: MrZarono in Deviantart.

Inquietações, essas são quase sempre as sensações sentidas e reverberadas no Terror Cósmico. As obras desse subgênero são tão dinâmicas quanto possível em suas estruturas, ora indo para a ficção científica, ora indo para a fantasia urbana, mas  há algo que as perpassa e que faz essa ligação: a extrema reflexão sobre inquietações presentes nas sociedades ocidentais contemporâneas!

Antes de me aprofundar sobre o Terror Cósmico quero falar sobre dois preceitos que levo em consideração para me aprofundar na compreensão desse subgênero: as perspectivas esotéricas e exotéricas. Aqui não têm as perspectivas místicas, longe disso, mas sim as percepções de cunho filosófico, onde o esotérico é referente ao círculo restrito e fechado que envolvia o Lovecraft e o exotéricos os círculos públicos e abertos que o perpassam e o ultrapassa. Guardem esses termos que eu voltarei a eles ao longo deste artigo!

É interessante pensar no contexto esotérico e interno no qual o autor que criou esse gênero estava imerso. Assim eu destaco dois:

  • A grande guinada dos avanços tecnológicos científicos sobre a sua sociedade;
  • A perda, ao menos para o autor, de um sentido religioso central.

E porque isso é digno de destaque? Vivenciar essas duas situações de forma tão íntima possibilitaram ao Lovecraft a criação das suas narrativas mais centradas em um pavor sóbrio e sombrio que não carece de nós, a humanidade, para existir. Esses pavores, sempre estiveram ali, e nós, tão passageiros como os escritos nas areias de uma praia, não os percebemos, e para nossa sorte, somos ignorados! Ao menos em geral!

Assim, a crise das religiões e a ausência de um sentido externo para a nossa existência deixa um vazio e um medo profundo e é isso, que a Literatura de Terror Cósmico consegue muito bem explorar! Mas, mais especificamente, a carência da importância humana para a significação do cosmos!

E quanto a cientificidade, qual a relação dela no Terror Cósmico de Lovecraft?

 O Chamado de Cthulhu - H. P. Lovecraft. Crédito e diretos reservados: Salvador Sanz – Skript Editora
 O Chamado de Cthulhu - H. P. Lovecraft. Crédito e diretos reservados: Salvador Sanz – Skript Editora

A sociedade na qual o autor viveu estava passando por grandes mudanças sociais. Desde as condições sociais quanto na política. E tudo isso influencia na construção do imaginário coletivo de uma sociedade.

A Literatura não passou incólume a essas mudanças, e a escrita gótica foi igualmente influenciada.

A ficção lovecraftiana consegue, desta forma, estar perfeitamente alinhada com este estado de espírito contemporâneo (perceba que não apenas o moderno!)

Contrariamente a Poe, mais centrado nos impulsos interiores perversos, Lovecraft transporta a ameaça para fora do indivíduo. Na sua perspectiva, todo o Universo é, no melhor dos casos, indiferente à nossa existência.

A constatação de que a espécie humana não constitui a peça central do Universo pode ser extremamente perturbadora. Mais, até, do que a conturbação existente nas esferas interiores da psique humana, bem como no conflito dicotômico entre o bem e o mal, tão recorrente na tradição do Gótico!

E aqui vem outro ponto central dessa subgênero, o mundo natural, que estava finalmente sendo totalmente explorado com os avanços sócio-tecnológicos, agora era escrito sobre um olhar aterrador, de que ele próprio, mesmo aquela parte mais conhecida da nossa cidade é inteiramente alienígena. 

Esta marca exterior do terror está profundamente ligada à sua percepção e àquilo que o conto Gótico pretende provocar: o medo.

Agora, embora já tenha falado que essas histórias transitam por outros gêneros, e envolvam toda uma cosmo-mitologia, é importante destacar que outra característica do Terror Cósmico é o realismo exacerbado.

Seja no detalhamento de estruturas tecnológicas; conhecimento científico apurado; descrição fundamentada da arquitetura, sociedade, cidades e mesmo das pessoas!

Isso é fundamental porque faz com que o leitor, mesmo tendo a ciência de que são obras de ficção, se perguntem: "Esse fato aqui, aconteceu realmente?" "Essa cidade existe?" "Isso é um ponto histórico do qual o autor está usando como base?"

Quantas vezes não vi em fóruns online se Arkham era real? Ou se existe de fato a Miskatonic University?

1 - Arkham City.  Crédito e diretos reservados: Call of Cthulhu 7th Edition Keeper Screen Pack; 2 - Miskatonic University.   Crédito e diretos reservados: Blog sobre los mitos de Cthulhu.
1 - Arkham City.  Crédito e diretos reservados: Call of Cthulhu 7th Edition Keeper Screen Pack; 2 - Miskatonic University.   Crédito e diretos reservados: Blog sobre los mitos de Cthulhu.

A ligação entre realidade e ficção tem que ser construída de modo tão natural que o leitor não consiga distinguir o que existe ou não! Esse realismo, embora frio e impessoal, auxilia na construção de proximidade e ajuda a deixar uma sensação maior de impotência quando o clímax das histórias acontecem, afinal: "Aquilo é real? Se fosse, eu também não conseguiria escapar de lá!"

Agora, para finalizar, a estrutura básica tem algo mais que as histórias do Terror Cósmico tem de ter: uma inspiração do medo em uma perspectiva quase religiosa, ou ao menos de uma forma de insana devoção.

O Mundo tem de ser gigante em opressão, e expor o homem, na figura dos seus protagonistas, como seres de pequenez ante o universo, de verdadeira insignificância! Isso é de uma violência tamanha que, para os moldes atuais de grande individualidade, consegue nos prender e assombrar.

Bem, até aqui falei bastante de como surgiu e o que é o Terror Cósmico de Lovecraft, mas e quanto a pergunta deste artigo, até onde vai o Terror Cósmico?

1 - O Farol (2019); 2 - The Thing (1982); 3 - Aniquilação (2018). Direitos reservados aos seus respectivos detentores. Imagem Divulgação.
1 - O Farol (2019); 2 - The Thing (1982); 3 - Aniquilação (2018). Direitos reservados aos seus respectivos detentores. Imagem Divulgação.

Eu realmente acredito que as histórias desse gênero não tem algum tipo de limite, e se ele existe ainda não foi encontrado. Mas deixe-me fazer algumas considerações sobre.

Já elenquei alguns dos pontos principais que se destacam no Terror Cósmico, entre eles o fato do humano não ser o centro das histórias, mas sim os fenômenos extraordinários. 

O público contemporâneo, cada vez mais e mais descrente, o que não significa no todo a ausência de uma  espiritualidade, na ausência de crença num Deus, seja cristão ou de qualquer outra religião, o sentimento de solidão que resulta da indiferença do Universo perante a nossa existência, pode ser ainda mais perturbador e indutor de terror.

Assim é importante que as histórias de Terror Cósmico em sua construção tenham, em maior ou menor escala, essa a indiferença universal, com toques de ainda mais opressão externa, como a presença ou menção de seres absolutos que nos transcendem largamente em longevidade, poder e propósitos (totalmente alheios aos nossos)! Isso amplia proporcionalmente, o potencial criador do terror, atingindo o terror cósmico pretendido!

Claro que, o Terror Cósmico transcende ao  Cthulhu Mythos, mas é inegável que o fascínio que o poder das entidades do Mythos parecem exercer sobre os fãs e leitores desse gênero! O impacto que o panteão detém na cultura popular contemporânea é indesmentível, muito em parte graças ao contributo do círculo de amigos e seguidores de Lovecraft.

The King in Yellow.  Crédito e diretos reservados: MrZarono in Deviantart.
The King in Yellow.  Crédito e diretos reservados: MrZarono in Deviantart.

Aqui se encontra o fator exotérico que o Terror Cósmico em muito cativa! Desde a criação das obras, elas foram produzidas em contribuição coletiva! Do famoso círculo da geração do autor de Providence, podemos destacar os autores: Robert E. Howard, Clark A. Smith, August Derleth Robert Bloch e Robert Chambers! Autores que não só contribuíram fomentando o próprio Mythos quanto divulgando e mantendo vivo as obras desse subgênero.

Claro, isso sempre com uma visão ocidentalista! Mas é importante destacar que na cultura pop, o Terror Cósmico permeou-se através de diversas mídias, como o cinema, a televisão e a música, indo para além da própria literatura!

Todas as obras do Terror Cósmico tem em maior ou menor grau as características que destaquei no artigo, e elas contam com um pragmatismo da pequenez humana, do medo de não termos a centralidade no universo e a negação a nossa incapacidade, seja esbarrando no terror absoluto, seja na busca pelo controle usando a ciência ou mesmo pelo ato de desafiar as forças cósmicas com a magia!

Agora na contemporaneidade não teria como não destacar três autores que são mestres no Terror Cósmico, porém com uma visão diferente do início do gênero!

Junji Ito, o mangaká Japonês que melhor explora os desdobramentos desse gênero! A agonia que o autor coloca em suas obras supera o terror comum, com grande habilidade ele trás uma dimensão nova que permeia o absurdo e o concreto da realidade! Destacando com veemência a bizarria da sociedade, que em geral nos passa despercebida!

Junji Ito. Imagem divulgação.
Junji Ito. Imagem divulgação.

Ele explora o Terror Cósmico para realizar um enfrentamento a posições culturais do Japão, como a forma de encarar a ancestralidade recente ou o desafio de lidar com questões sociais sensíveis, como os desdobramentos da II Guerra Mundial!

O segundo autor é o estadunidense Matt Ruff. Pessoalmente foi dele a obra de terror que mais me assustou, Território Lovecraft! Nela o terror não se centra na pequenez humana, mas na invisibilidade do ser humano, não por forças cósmicas, mas através da ignorância e crueldade humana em sua forma mais vil: o racismo!

Acompanhando o protagonista o oculto e a desenvoltura do Mythos assombra, mas o verdadeiro terror está nas relações interpessoais que qualquer um dos protagonistas afro americanos têm de lidar com as pessoas brancas!Matt Ruff

Matt Ruff e Território Lovecraft. Imagem divulgação. Direitos reservados aos seus respectivos proprietários.
Matt Ruff e Território Lovecraft. Imagem divulgação. Direitos reservados aos seus respectivos proprietários.

Por fim, é uma obra por enquanto disponível apenas no formato de audiolivro, do grande escritor, professor e narrador Marcelo Fávaro: Nehebkau: A Ilha das Cobras - #447. Os traços e a construção do Terror Cósmico é tão natural, que notamos e sentimos do início ao fim!

Nela seguimos o protagonista relatando os estranhos acontecimentos que o levaram a parar na ilha de Queimada Grande, após um naufrágio em uma pescaria que foi dando errado!

Claro, fazendo meu próprio jaba, no canal do Marcelo Fávaro tem um conto meu, Horror No Câmara Cascudo. O que poderia dar errado quando quatro paleontólogos descobrem uma nova estrutura fóssil dentro das dependências do maior museu de paleontologia do Rio Grande do Norte? Olhe e descubra por você mesmo!

Marcelo Fávaro. Amigo e Escritor!  Imagem divulgação.
Marcelo Fávaro. Amigo e Escritor!  Imagem divulgação.

Por fim, acredito que as potencialidades do Terror Cósmico são gigantescas! Podendo explorar as condições emocionais, dando ao homem um sentimento simbólico do irreal, do etéreo e do místico! Fazendo uso de qualquer coisa! Desde as condições mentais e emocionais do presente a momentos cotidianos, como o  pôr do sol; os sonhos; névoas; febre, a loucura, o túmulo, as colinas, o mar e etc. – ou seja tudo isso e muitas outras coisas que  mantêm uma certa potência imaginativa, apesar de nossas análises científicas reais delas!

E você, qual terror quer ler/escrever?!

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Referencias:

GÓTICO AMERICANO. Maria Antónia Lima. Centro de Estudos Anglísticos da Universidade de Lisboa – CEAUL/ECS. Lisboa, 2018.