População, amostragem, desvio padrão, variância, amplitude, margem de erro, todos esses termos fazem parte do universo da estatística. E quando chegam as eleições, a maioria dos brasileiros passa a conviver mais de perto com esse tipo de voca...
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População, amostragem, desvio padrão, variância, amplitude, margem de erro, todos esses termos fazem parte do universo da estatística. E quando chegam as eleições, a maioria dos brasileiros passa a conviver mais de perto com esse tipo de vocabulário, o que pode gerar estranheza e preocupação em alguns. | ||
Hoje eu recebi uma mensagem que me fez pensar a respeito do assunto. Faço parte de um grupo no Whatsapp com mais dois amigos, ambos bolsonaristas. Irei nomeá-los Tico e Teco para lhes preservar a identidade e a dignidade. | ||
Outro dia, Tico estava criticando as pesquisas eleitorais e o fato de um ex-presidiário (Lula) liderar as pesquisas para o mais alto cargo da República. Um dos argumentos lançados para duvidar dos resultados foi o seguinte: “não conheço uma pessoa sequer que tenha sido entrevistada por esses tais institutos de pesquisa que a mídia contrata”. | ||
Hoje foi a vez do Teco, que enviou um vídeo, desses que circulam com assustadora velocidade nas redes sociais de bolsonaristas, no qual um indivíduo promove sua própria pesquisa, feita nas ruas de alguma cidade do Sul do Brasil. O sujeito do vídeo construiu uma caixa de madeira, com pequenas hastes de metal presas à base, representando, cada haste, um dos candidatos à presidência. Havia anéis que os pedestres entrevistados deveriam colocar em volta da haste que representava seu candidato. Nessa pesquisa, Bolsonaro termina à frente e, por isso, o camarada conclui que as pesquisas da grande mídia estão “ludibriando” o eleitor. | ||
Respondi com a seguinte frase: isso é o mais puro “terraplanismo” estatístico! | ||
Faz sentido, pois, assim como a hipótese da Terra plana, as contestações à estatística, à Justiça Eleitoral e ao sistema eletrônico de votação são, basicamente, a negação de fatos que passaram pelo crivo da metodologia científica, amplamente aplicada nas mais diversas sociedades, pelo menos, desde a consolidação do Positivismo acadêmico no século XIX. | ||
A essa altura do texto, o caro leitor deve ter debochado da estupidez dos meus amigos Tico e Teco. Realmente, a dupla pouco se preocupa em buscar a realidade dos fatos. Preferem se esconder no conforto da verdade que lhes convém, uma verdade que eles aceitam docilmente, apesar dos absurdos nos quais se sustentam. Tico e Teco são (zero surpresas) homens brancos de classe média, com educação superior. | ||
Há, contudo, uma massa de brasileiros que não tiveram as mesmas oportunidades que meus amigos Tico e Teco. Essas pessoas genuinamente ignoram os termos estatísticos e a metodologia usados nas pesquisas. A eles interessa apenas quem está na frente e por quantos pontos. Boa parte desse público não mais se sujeita à autoridade de William Bonner e seu jornal. Eles têm acesso às mesmas redes sociais que Tico e Teco, e estão suscetíveis a acreditar nas mesmas falsas verdades. | ||
Estamos em um momento da história no qual as sociedades democráticas não conseguem acompanhar a velocidade de circulação das informações. Vimos isso no Brexit, na eleição de Donald Trump e na própria eleição de Bolsonaro, em 2018. Não se pode subestimar o papel que as redes sociais, as fake news e o fenômeno mais amplo da pós-verdade podem imprimir no resultado final. | ||
Na eleição de 2018, cometi o erro de achar que a maior parte dos cidadãos brasileiros que escolheram o atual presidente eram Ticos e Tecos. Não pretendo fazer o mesmo em 2022. | ||
Tenhamos cuidado para distinguir os idiotas dos ingênuos e ignorantes! |