Para entender de forma substantiva a atual situação financeira de Minas Gerais, é preciso olhar um pouco para o passado.
Para entender de forma substantiva a atual situação financeira de Minas Gerais, é preciso olhar um pouco para o passado. | ||
Durante o chamado Milagre Econômico, entre os anos 1968 e 1973, o crescimento do PIB brasileiro foi sustentado, em boa parte, por empréstimos externos. O continente europeu, sobretudo a Alemanha Ocidental, crescia a altas taxas e registrava enormes superávits comerciais com os Estados Unidos. A grande entrada de dólares na Europa precisava, então, ser “reciclada”. Bancos europeus buscavam, pois, mercados como o Brasil para emprestar o excesso de dólares. | ||
Quando, em 1973, o primeiro Choque do Petróleo abalou as estruturas da economia internacional (países da OPEP elevaram sobremaneira os preços do petróleo em resposta a mais uma guerra entre Israel e países árabes), os “eurodólares” tornaram-se inviáveis. Além disso, o petróleo consistia em 80% da pauta importadora do Brasil. O crescimento estava em risco. | ||
Como o regime militar tentava se legitimar por meio dos bons resultados econômicos, entre as duas possibilidades de estabilização econômica, ajuste recessivo ou intensificação do endividamento, os governos Médici e Geisel optaram pela segunda. Assim, o governo brasileiro buscou uma nova forma de financiar sua expansão econômica: os “petrodólares”. Com a alta dos preços do petróleo, países como Arábia Saudita, Irã e Iraque passaram e emprestar suas reservas, só que, dessa vez, com juros flexíveis. O empréstimo feito em 1974, por exemplo, teria um juro pós-fixado, que variava de acordo com os juros internacionais. | ||
Assim, quando ocorreu o segundo Choque do Petróleo, após a Revolução Iraniana de 1979, os juros internacionais explodiram. A dívida pública brasileira elevou-se de forma astronômica, assim como a dívida de Minas Gerais, que emulou a estratégia do governo federal para fazer investimentos em infraestrutura. Nosso estado promovia investimentos aos moldes da China atual. Em 1976, o investimento em Minas alcançou 36% do PIB (o FMI considera 20% como um patamar saudável). Além disso, o estado mineiro promoveu uma política agressiva de concessão de incentivos fiscais para atrair empresas estrangeiras e recebeu mais de 30 multinacionais, inclusive a FIAT, o que correspondeu, na década de 1970, a 25% de todo investimento externo recebido no Brasil. | ||
A década de 1980, devido à crise da dívida e à hiperinflação, ficou conhecida como a “década perdida”. A economia brasileira deixou de crescer no ritmo acelerado que vinha crescendo desde a década de 1940. O mesmo ocorreu com Minas Gerais. O governo federal teve que fazer acordo com o FMI, declarar moratória da dívida, fazer planos econômicos para combater a inflação (Plano Cruzado, Plano Bresser, Plano Verão, Collor 1, Collor 2). | ||
Somente com o Plano Real é que o Brasil conseguiu estabilizar seu sistema monetário, a partir de 1994, embora tenha elevado sua taxa básica de juros de forma astronômica (a taxa selic chegou a impressionantes 45% ao ano, entre 1997 e 1999). | ||
Aqui é que começa o estranho caso da dívida de Minas Gerais com a União. | ||
O governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), em 1997, promoveu o refinanciamento da dívida dos estados com a União, com base em uma carta de intenções assinada com o FMI, ainda em 1991. Os estados foram então obrigados a aderir a um programa de ajuste fiscal, privatização de empresas e bancos estaduais. Além disso, essa cartilha obrigou os estados a assumirem o passivo dos bancos regionais (no caso de Minas, do BEMGE, Credireal e Minas Caixa) antes de privatizá-los ou fechá-los - como foi o caso da Minas Caixa. Os bancos privados que compraram o BEMGE e o Credireal ficaram somente com as carteiras lucrativas. Viva a privatização! | ||
Assim, ao refinanciar sua dívida com a União, Minas Gerais apresentou os seguintes números (os dados foram fornecidos à CPI da Dívida Pública de 1998): | ||
Percebe, caro leitor, que, já de partida, aproximadamente um terço da dívida refinanciada junto à União (durante o governo de Eduardo Azeredo, político do PSDB já condenado e preso por corrupção) sequer corresponde à "dívida pública” de Minas Gerais? | ||
Foi nesse contexto draconiano que a União aprovou a Lei Kandir, pela qual o estado de Minas Gerais foi obrigado a isentar do ICMS as exportações de produtos primários e semielaborados em troca de compensações futuras aos estados por parte da União. A mineração agradece! | ||
São essas compensações, que hoje somariam R$135 bilhões, que Zema acordou em receber apenas R$8,7 bilhões, em suaves 18 anos. Em contrapartida, nossa dívida com a União gira em torno de R$85 bilhões… | ||
Pararei por aqui, neste momento. A novela continua! | ||
PS: as fontes utilizadas para o texto foram as seguintes - A ordem do progresso (Marcelo de Paiva Abreu) e Auditoria Cidadã da Dívida. |