No texto de hoje, apresento os motivos pelos quais o Regime de Recuperação Fiscal (RRF), defendido por Romeu Zema, representa um perigo para Minas Gerais. Na prática, o RRF colocará nosso estado em uma prisão orçamentária pelos próximos trint...
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No texto de hoje, apresento os motivos pelos quais o Regime de Recuperação Fiscal (RRF), defendido por Romeu Zema, representa um perigo para Minas Gerais. Na prática, o RRF colocará nosso estado em uma prisão orçamentária pelos próximos trinta anos. | ||
Na reestruturação da dívida mineira de 1998, o governo da época apresentou o montante de R$14,9 bilhões. Entre os anos de 1998 e 2019, no entanto, pagamos à União R$45,8 bilhões de juros e amortizações, pois o acordo fixado na década de 1990 previa uma taxa fixa no assustador patamar dos 45% ao ano da taxa selic. | ||
Assusta pensar que, mesmo pagando mais de 3 vezes o valor original da dívida, em setembro de 2022, o montante devido por Minas Gerais à União encontra-se em R$85 bilhões. São 7 vezes mais do que o montante inicial. | ||
Antes de qualquer decisão por parte do governo atual, seria preciso auditar essa dívida para entender as irregularidades existentes. Contudo, o caminho escolhido por Zema foi outro… | ||
O draconiano RRF precisa ser explicado, mas, antes disso, é preciso saber que, em 2018, o Supremo Tribunal Federal concedeu liminar ao estado de Minas Gerais para suspender os pagamentos à União, pois entendeu haver, como mostrei aqui, irregularidades nos valores. | ||
Zema busca aderir ao RRF. Seus motivos públicos são o equacionamento da dívida (reconhecendo a existência dessa dívida que claramente já foi paga) e a racionalização dos gastos do estado. Eu imagino que haja um motivo velado muito positivo para o político do Novo: trata-se do fato de que a reestruturação dessa dívida, no âmbito do RRF, prevê uma SUSPENSÃO INICIAL DE 100% DO PAGAMENTO DA DÍVIDA NO PRIMEIRO ANO, com retorno progressivos desses pagamentos até o fim do RRF. | ||
Ora, o segundo mandato de Romeu Zema não pagaria NADA à União e as parcelas subsequentes só iriam aumentando. Ou seja, os próximos governos é que ficariam com a maior parte dos compromissos dessa reestruturação. | ||
Segundo a Assembleia Legislativa de Minas Gerais e o próprio Tesouro Nacional, o RRF impõe aos estados algumas condicionantes, quais sejam: | ||
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Há outras condicionantes, mas essas já dão uma ideia de como nosso estado estará refém de um regime digno de aplausos dos diretores do FMI, nas décadas de 1980 e 1990. | ||
Em primeiro lugar, a imposição de um teto de gastos é de uma ignorância granítica. A pandemia da COVID-19 demonstrou que não se pode impor tais limites em investimentos públicos, sobretudo em áreas sujeitas a emergências, como saúde e educação. Hoje, o teto de gastos da União já se encontra cheio de buracos e remendos. É totalmente disfuncional. | ||
A privatização de empresas públicas não deve ser um fim em si mesma, mas um meio pelo qual o Estado busque aumentar a eficiência na prestação de serviços. As parcerias público-privadas são positivas, as concessões rodoviárias e ferroviárias também. No entanto, estudos e mais estudos demonstram que monopólios naturais, como o tratamento e distribuição de água/esgoto e a geração e distribuição de energia, são mais eficazes quando controlados pelo poder público ou com arbitramento de preços. | ||
A impossibilidade de novos concursos deixa o estado de Minas engessado nas próximas três décadas. Já imaginou, caro leitor, os próximos governadores construírem novas escolas e hospitais, com o objetivo de ampliar os serviços públicos, mas não conseguirem contratar novos servidores? O mesmo vale para a segurança pública. | ||
Finalmente, a impossibilidade de alterar a alíquota de impostos impede qualquer tipo de política fiscal, seja para atrair investimentos (com a queda de impostos) ou para aumentar a arrecadação em um período de dificuldade (com o aumento das tarifas). | ||
Para completar o abraço constritor da União sobre Minas Gerais, o RRF prevê a constituição de um Conselho de Supervisão. Esse conselho irá monitorar as ações do governo do estado para evitar o descumprimento do acordo e sugere políticas e mudanças na condução da economia. É inconcebível o fato de que os membros desse conselho, indicados pelo estado, pelo Ministério da Economia e pelo TCU, podem simplesmente vir do mercado financeiro. Não é preciso serem servidores de carreira. | ||
As contas públicas de Minas Gerais e a forma pela qual o governo mineiro alocará seus recursos terão a supervisão de técnicos dos mesmos bancos diretamente interessados no pagamento da dívida. A população e suas necessidades certamente ficarão em segundo plano. | ||
Não podemos aderir ao RRF sem um amplo debate em relação à própria legalidade da dívida de Minas Gerais, quem dirá aceitar condicionantes que, na prática, inviabilizam investimentos tão necessários para um estado desigual como o nosso. É preciso, também, questionar o acordo feito com a União que simplesmente abriu mão de R$135 bilhões devidos pela Lei Kandir. | ||
Zema busca cumprir uma agenda neoliberal sem dialogar com a ALMG e com o povo mineiro. Isso é um erro e um perigo para o futuro do nosso estado. | ||
O purismo ideológico do Partido Novo não só é disfuncional, pois parte de premissas notoriamente falhas, como o tal do Estado Mínimo, como é imoral, pois deixa a necessitada população de Minas Gerais e do Brasil sem amparo. |