Dia 48 (2 de outubro) - A eleição dos imbecis
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Dia 48 (2 de outubro) - A eleição dos imbecis

Finalizada a apuração das urnas eletrônicas, em mais uma excepcional demonstração da eficácia de nosso sistema, os resultados merecem algumas ponderações. Irei escrever durante a semana para tentar construir análises e arriscar algumas previs...

Diogo Machado
4 min
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Nikolas Ferreira e Olavo de Carvalho
Nikolas Ferreira e Olavo de Carvalho

Finalizada a apuração das urnas eletrônicas, em mais uma excepcional demonstração da eficácia de nosso sistema, os resultados merecem algumas ponderações. Irei escrever durante a semana para tentar construir análises e arriscar algumas previsões por aqui.

Hoje, no entanto, quero deixar uma provocação que ficou na minha cabeça desde ontem à noite…

Em uma entrevista concedida no ano de 2015, Umberto Eco, falecido escritor, linguista e filósofo italiano, afirmou que “as redes sociais deram voz a uma legião de imbecis”. Para o autor de O nome da rosa, clássico da literatura (posteriormente adaptado para o cinema), “os imbecis, normalmente, eram imediatamente calados, mas agora eles têm o mesmo direito à palavra de um Prêmio Nobel”.

Não se trata aqui de julgar, de modo preconceituoso, o caráter das pessoas, mas de reconhecer que pessoas de boa índole, bons filhos, maridos, esposas e pais, podem ser verdadeiros imbecis em diversos aspectos da vida. Essas pessoas, com o advento das redes sociais, passaram a ter mais e mais espaço para divulgar suas imbecilidades e influenciar outras pessoas.

A sociedade brasileira, como qualquer outra sociedade do mundo, sobretudo no Ocidente, está repleta de imbecis. Pior ainda, a proporção de imbecis nas redes sociais é ainda maior que no dia a dia. Vivemos em um país no qual “influenciador digital” se tornou uma profissão almejada pela juventude. As plataformas Tik Tok, Instagram, Twitter, YouTube e tantas outras estão cheias de “personalidades digitais” que movem a opinião de seus seguidores.

Nesse contexto, Bolsonaro elegeu-se, em 2018, com uma plataforma sustentada nas teorias da conspiração (para além do antipetismo).

Nas eleições de ontem, percebi que houve diversos eleitos para o Senado e para a Câmara que se enquadram nesse perfil. O mais notório deles é Nikolas Ferreira, o deputado federal mais bem votado da história de Minas Gerais.

Nikolas se enquadra no perfil de imbecil traçado por Umberto Eco. Em uma roda de conversa, seria reprimido por suas ideias mal acabadas e sem sentido. No entanto, as redes sociais serviram a ele como uma plataforma para suas idiotices e suas teorias conspiratórias, a exemplo da cruzada contra a ideologia de gênero e o movimento antivacina (durante uma PANDEMIA). O deputado eleito emite opinião sobre tudo, lembra de tudo, não esquece nada. Ainda que ignore a vasta maioria dos assuntos sobre os quais faz juízo de valor, Nikolas afirma com a teatralidade necessária para entreter seus seguidores e convencê-los. 

Essas pessoas, por sua vez, também imbecis para a maior parte desses assuntos, ressaltam a necessidade de ter alguém que lhes represente em cargos de poder.

Nessa realidade virtual, os algoritmos fazem o restante do trabalho. Criam-se bolhas onde o que se veicula é bastante palatável para certo grupo de imbecis. Eles se reforçam mutuamente e constroem uma realidade própria, insana, mas que é representativa.

O bolsonarismo compreende diversas bolhas de imbecis. Há a bolha do Nikolas, que abrange desde jovens alienados até senhoras conservadoras da tradicional família mineira. Há a bolha do Ricardo Salles, composta por negadores das mudanças climáticas e apoiadores do desmatamento dos biomas brasileiros. Há a bolha do Pazuello, naturalmente de baixos quociente de inteligência e respeito pela vida. 

Os exemplos são muitos. Poderia falar de Hamilton Mourão, Mário Frias, Carla Zambelli, Bia Kicis… Fato é que existe um padrão que tem acompanhado a progressiva destruição da política tradicional no Brasil, iniciada pela Operação Lava-Jato.

Como lidar com essa realidade eu não sei dizer, mas é uma reflexão importante a ser feita.

PS: existem vários pontos de luz a serem ressaltados nessas eleições também. Não se enganem. Elegemos três deputadas federais transexuais, elegemos a primeira indígena de Minas Gerais como deputada federal. Também ampliamos as bancadas do PT e do PSOL que, evidentemente, irão combater esses imbecis em Brasília. Conseguimos eleger uma bancada estadual mais hostil a Zema que a anterior, o que certamente impactará na urgente disputa sobre o Regime de Recuperação Fiscal.

PPS: amanhã farei uma análise mais técnica com os números e distribuição geográfica dos votos. Não tive muito tempo para organizar as conclusões e possíveis consequências dessa disputa de segundo turno. Seria bom ter uma decisão sobre o pensamento de Tebet e Ciro.