Finalizada a apuração das urnas eletrônicas, em mais uma excepcional demonstração da eficácia de nosso sistema, os resultados merecem algumas ponderações. Irei escrever durante a semana para tentar construir análises e arriscar algumas previs...
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Finalizada a apuração das urnas eletrônicas, em mais uma excepcional demonstração da eficácia de nosso sistema, os resultados merecem algumas ponderações. Irei escrever durante a semana para tentar construir análises e arriscar algumas previsões por aqui. | ||
Hoje, no entanto, quero deixar uma provocação que ficou na minha cabeça desde ontem à noite… | ||
Em uma entrevista concedida no ano de 2015, Umberto Eco, falecido escritor, linguista e filósofo italiano, afirmou que “as redes sociais deram voz a uma legião de imbecis”. Para o autor de O nome da rosa, clássico da literatura (posteriormente adaptado para o cinema), “os imbecis, normalmente, eram imediatamente calados, mas agora eles têm o mesmo direito à palavra de um Prêmio Nobel”. | ||
Não se trata aqui de julgar, de modo preconceituoso, o caráter das pessoas, mas de reconhecer que pessoas de boa índole, bons filhos, maridos, esposas e pais, podem ser verdadeiros imbecis em diversos aspectos da vida. Essas pessoas, com o advento das redes sociais, passaram a ter mais e mais espaço para divulgar suas imbecilidades e influenciar outras pessoas. | ||
A sociedade brasileira, como qualquer outra sociedade do mundo, sobretudo no Ocidente, está repleta de imbecis. Pior ainda, a proporção de imbecis nas redes sociais é ainda maior que no dia a dia. Vivemos em um país no qual “influenciador digital” se tornou uma profissão almejada pela juventude. As plataformas Tik Tok, Instagram, Twitter, YouTube e tantas outras estão cheias de “personalidades digitais” que movem a opinião de seus seguidores. | ||
Nesse contexto, Bolsonaro elegeu-se, em 2018, com uma plataforma sustentada nas teorias da conspiração (para além do antipetismo). | ||
Nas eleições de ontem, percebi que houve diversos eleitos para o Senado e para a Câmara que se enquadram nesse perfil. O mais notório deles é Nikolas Ferreira, o deputado federal mais bem votado da história de Minas Gerais. | ||
Nikolas se enquadra no perfil de imbecil traçado por Umberto Eco. Em uma roda de conversa, seria reprimido por suas ideias mal acabadas e sem sentido. No entanto, as redes sociais serviram a ele como uma plataforma para suas idiotices e suas teorias conspiratórias, a exemplo da cruzada contra a ideologia de gênero e o movimento antivacina (durante uma PANDEMIA). O deputado eleito emite opinião sobre tudo, lembra de tudo, não esquece nada. Ainda que ignore a vasta maioria dos assuntos sobre os quais faz juízo de valor, Nikolas afirma com a teatralidade necessária para entreter seus seguidores e convencê-los. | ||
Essas pessoas, por sua vez, também imbecis para a maior parte desses assuntos, ressaltam a necessidade de ter alguém que lhes represente em cargos de poder. | ||
Nessa realidade virtual, os algoritmos fazem o restante do trabalho. Criam-se bolhas onde o que se veicula é bastante palatável para certo grupo de imbecis. Eles se reforçam mutuamente e constroem uma realidade própria, insana, mas que é representativa. | ||
O bolsonarismo compreende diversas bolhas de imbecis. Há a bolha do Nikolas, que abrange desde jovens alienados até senhoras conservadoras da tradicional família mineira. Há a bolha do Ricardo Salles, composta por negadores das mudanças climáticas e apoiadores do desmatamento dos biomas brasileiros. Há a bolha do Pazuello, naturalmente de baixos quociente de inteligência e respeito pela vida. | ||
Os exemplos são muitos. Poderia falar de Hamilton Mourão, Mário Frias, Carla Zambelli, Bia Kicis… Fato é que existe um padrão que tem acompanhado a progressiva destruição da política tradicional no Brasil, iniciada pela Operação Lava-Jato. | ||
Como lidar com essa realidade eu não sei dizer, mas é uma reflexão importante a ser feita. | ||
PS: existem vários pontos de luz a serem ressaltados nessas eleições também. Não se enganem. Elegemos três deputadas federais transexuais, elegemos a primeira indígena de Minas Gerais como deputada federal. Também ampliamos as bancadas do PT e do PSOL que, evidentemente, irão combater esses imbecis em Brasília. Conseguimos eleger uma bancada estadual mais hostil a Zema que a anterior, o que certamente impactará na urgente disputa sobre o Regime de Recuperação Fiscal. | ||
PPS: amanhã farei uma análise mais técnica com os números e distribuição geográfica dos votos. Não tive muito tempo para organizar as conclusões e possíveis consequências dessa disputa de segundo turno. Seria bom ter uma decisão sobre o pensamento de Tebet e Ciro. |