A Crise do Polissindético

Por Ronaldo Raposo.

Meu dia de brilhar finalmente tinha chegado: daria minha primeira entrevista para TV aberta. Já estava mirando o estrelato, pensando que, logo após, o próximo passo seria um convite do Boninho para ingressar na casa mais vigiada do Brasil. Antes disso, claro, eu precisava preencher uma fichinha com as informações que apareceriam na minha chamada. E lá fui eu:

• Nome: Ronaldo Raposo
• Idade: 20 anos
• Profissão: __________

Ok, eu sou estudante. Certo. Mas, nossa, estudante soa tão clichê e vazio. Graduando? Além disso, eu já faço tantas outras coisas. Por exemplo, eu escrevo aqui. Escritor? Eu também faço análises semanais sobre Política Internacional para uma revista. Analista Político? Sem contar meu estágio, onde atuo com Relações Governamentais. Consultor Jr.? E ainda tem meu projeto social de apoio comunitário a universitários de baixa renda. Empreendedor social? Sem contar, claro, a pesquisa que venho conduzindo junto a um think tank. Pesquisador? E os freelas que eu faço programando? Desenvolvedor?

Tantas eus em um só. O que eu vou escolher para me representar? Bom, eu não estava dando a entrevista a esmo: tinha um propósito, um recorte. Assim, eu poderia escolher o eu que mais se adequasse à ocasião. Mas e quanto aos outros eus? Eles não se sentiriam um pouco renegados não? Talvez… Então eu estaria sendo injusto comigo mesmo (aliás, comigos mesmos).

Daí que eu percebi que tinha chegado a minha vez de passar pela Crise do Polissindético. O termo, cunhado por ninguém mais ninguém menos que eu mesmo, faz referência a figura de linguagem chamada Polissíndeto, que se trata da repetição constante de uma mesma conjunção entre orações ou termos. E o que isso tem a ver com a gente aqui? Bom, retorno ao exemplo:

• Profissão: Graduando & Escritor & Analista Político & Consultor Jr. & Empreendedor Social & Pesquisador & Desenvolvedor

A situação toda me fez perceber que eu tava perdido no meu próprio personagem. Afinal, é inegável dizer que, para cada um desses "títulos", eu assumo uma personalidade diferente: para alguns, um tom mais sério; para outros, um ar mais sarcástico e descontraído. Em determinados ambientes, uma visão estratégica voraz e, em outros, uma ataraxia da alma surpreendente. E qual o problema disso, afinal?

Nenhum. Por vezes somos demandados a nos encaixarmos em um label, um rótulo, uma categoria totalizante que expresse, em uma palavra, quem a gente é. Isso é cada vez mais impossível e, bom, que os deuses me livrem de um dia conseguir colocar toda minha essência em uma só palavra -- a não ser que eu tenha liberdade para criá-la, rs.

Essa news é, antes de tudo, um lembrete: alimente sim seus Divertida Mentes. O mundo dos creators é dinâmico e múltiplo -- ser mais de um é, em vez de um problema, uma dádiva para gente. Caso o ambiente que você se insere não acolhe muito bem isso, talvez seja hora de repensar os espaços que você ocupa.

Sempre que penso nessa questão, eu gosto de olhar para trás e lembrar dos tempos medievos. Um cara que eu admiro muito desse período é Robert Grosseteste, inglês que foi político, filósofo escolástico, teólogo, cientista e bispo. Sua capacidade intelectual era tão grande que, na verdade, Grossteste é seu apelido -- significa, literalmente, cabeçudo, em francês. Imagina a dificuldade que esse cara teria hoje em dia para preencher o LinkedIn, tendo tantas atribuições assim?

Então, essa news, além de um lembrete, é também uma ode às nossas múltiplas atribuições. Desde que isso não implique na nossa saúde e bem-estar, que possamos cada dia mais sermos tantos eus quanto já somos. Hoje, me apresento como estudante, redator e analista. Amanhã, posso me colocar como trainee e bacharel. Depois, como comediante e comentarista -- por que não?

Um viva ao polissíndeto!

👤  FALANDO DE VÁRIOS LUGARES

Essa daí é o Sérgio Lopes, um publicitário de 61 anos que, em meados de 2007, abriu mão de uma carreira em ascensão no meio das agências de produção de conteúdo para criar a Conteúdos Diversos, uma produtora de conteúdo multiplataforma com o objetivo de alinhar entretenimento, mídia, marcas, produtos e serviços. O que Sérgio faz é unir os apelos distintos das plataformas para, a partir de uma narrativa, criar um storytelling conciso que represente uma marca em sua totalidade -- o famoso storytelling transmídia. Vale a pena conferir o trabalho dele e de sua equipe!

📚  RONALDICAS

Quanto tempo que não aparece um filminho por aqui, né? Não seja por isso: a indicação de hoje vai para o drama Alexandria (2009), que trata da maneira ficcional a história de Hipátia, primeira matemática mulher que se tem registros.

O longa, além de trazer a atmosfera do período antigo, mostra bem a multiplicidade das identidades dos indivíduos dessa época, os quais eram embebidos pelos números, letras e notas -- tudo em uma mesma pessoa.

🏞️  O QUE MAIS ROLA NA CREATORSFERA...

O twitter lançou em alguns países uma maneira nova de visualização dos trending topics, mais uma maneira de te manter entretido na ferramenta.

Um estudo da MLS constatou que existe uma desigualdade racial de pagamentos para influencers, seria isso parte do algoritmo?? No mínimo estranho..

Falando agora de games em blockchain, a binance está quente no investimento!! Um fundo de 200 milhões de dolares

Ainda falando em web3, kickstarter planeja uma migração e para a blockchain e migrará a plataforma para a nova tecnologia, em breve.