Estado de Rondônia completa 39 anos concretizando sonhos acalentados desde 1960
O fluxo migratório quase incontrolável rumo à Amazônia Brasileira acelerou a instalação do Estado de Rondônia. Quatro décadas depois da chamada Marcha para o Oeste, a ocupação da nova fronteira agrícola brasileira vacinou contra a febre amarela todos aqueles que desembarcavam no Centro de Triagem de Migrantes em Vilhena, a 704 quilômetros de Porto Velho. | ||
Tratores abrem uma estrada no interior do município de Ariquemes no início dos anos 1980; Estado começava a crescer | ||
O Estado criado pela Lei Complementar nº 41, de 22 de dezembro de 1981, tendo Porto Velho escolhida como Capital, está inteirando 39 anos nesta segunda-feira (4) e já teve 11 governadores antes do atual, coronel Marcos Rocha. | ||
Em 1985, Rondônia alcançava seu primeiro milhão de habitantes e atualmente sua população supera 1,7 milhão. É considerado o Estado que mais cresce no País. Tem taxas superiores à média nacional e sua base econômica se destacando cada vez mais. | ||
Na região Norte, o Estado é o primeiro exportador de carne bovina, o maior produtor de cassiterita (minério de estanho), o segundo maior produtor de soja, o terceiro maior produtor de arroz, o primeiro produtor de leite, o segundo maior produtor de peixe nativo do Brasil. | ||
Segundo Rocha, esse fator de estabilidade tem possibilitado investimentos que contribuem cada vez mais com emprego e renda”. | ||
“Enalteço essa data tão importante para o Estado pujante que não para de crescer e passa a ser olhado com respeito e oportunidades entre os demais estados e, inclusive, outros países”, diz o governador, 12º mandatário estadual. | ||
O governador lembra o apogeu da vinda de milhares de pessoas em busca do sonhado Eldorado. “Vieram todos para as terras de Rondon”, ele comemora. | ||
Rocha se diz orgulhoso de ser um governador escolhido democraticamente. E reafirma ter o apoio do Governo Federal “para seguir construindo um legado de respeito que vai ficar com a população”. | ||
“Com a graça de Deus, continuaremos trabalhando firme; viva o nosso 4 de janeiro, data de instalação do Estado de Rondônia!”, exaltou. | ||
“A condição de território foi uma questão de estratégia de segurança nacional no Governo Vargas, mas a passagem a Estado foi uma longa caminhada”, analisa o jornalista, pesquisador e memorialista Lúcio Albuquerque. | ||
“Em 1962, o então deputado federal Aluízio Ferreira, que encerrava a carreira política, apresentou projeto de lei criando o Estado”, ele assinala. | ||
“O sonho vinha sendo acalentado desde a criação do Território do Guaporé, pelo presidente Getúlio Vargas em 1943”, lembra o memorialista Anísio Gorayeb. “Em 1956, passou a se chamar Território Federal de Rondônia em homenagem ao marechal Cândido Rondon, cuja expedição estendeu linhas telegráficas até Santo Antônio do Rio Madeira”. | ||
Aluízio Ferreira (d) com o barbadiano Charles Schokness | ||
Em janeiro de 1980, um convênio entre os Ministérios do Interior e da Fazenda já possibilitava a arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICM, depois ICMS) e o Imposto Único sobre Minerais (IUM). No entanto, a efetiva emancipação só aconteceria em 1982*. | ||
“Até aí, éramos apenas um braço da União e diretamente subordinados à Capital do País, sem o direito de eleger governador, prefeito, senador, tendo apenas um deputado federal, enfim, sem democracia”, diz Gorayeb. | ||
Nomeado pelo presidente Ernesto Geisel, o coronel Humberto Guedes sucedeu em maio de 1975 ao coronel João Carlos Marques Henriques (1969-1972). | ||
Guedes preparou mais cinco municípios | ||
Rondônia tinha apenas dois municípios: Guajará-Mirim e Porto Velho, ambos sem eleições e com prefeitos nomeados, porque eram considerados áreas de segurança nacional. | ||
“Até o dia 2 de abril de 1979, o coronel Guedes fez avançar o futuro Estado”, relata o economista Sílvio Persivo, que trabalhou na Secretaria de Planejamento naquele Governo. | ||
Para preparar as bases municipais, Guedes trouxe técnicos da Universidade de Brasília (UnB), o arquiteto e urbanista Sylvio Sawaya, da Universidade de São Paulo (USP), e diversas pessoas especializadas, e nisso contou com uma ajuda forte do capitão da Aeronáutica e coordenador regional do Incra, Sílvio Gonçalves de Farias. | ||
Guedes também contratou o geógrafo baiano e graduado em Direito Milton Santos (já falecido) para pensar o Estado. | ||
“Estava acontecendo grande evasão dos pequenos proprietários, e para evitar isso ele projetou o que se chamava de Núcleos Urbanos de Apoio Rural (Nuars), pequenas cidades com estrutura suficiente para que o agricultor não saísse para os grandes centros urbanos”, conta Persivo. | ||
O então secretário de planejamento Luiz Cézar Auvray Guedes (filho do governador) recorreu à experiência do Estado do Pará para elaborar o 1º Plano de Metas de Rondônia, cujo objetivo foi obter um documento que também envolvesse outros segmentos da sociedade. | ||
Luiz César Guedes trouxe técnicos de diversas regiões | ||
O Governo contratou economistas, administradores, sociólogos, arquitetos, geógrafos, entre outros profissionais, em sua maioria oriundos das Universidades do Ceará e de Pernambuco. | ||
“Existem ações que ocorrem de dentro para fora, e manter o território administrado de fora para dentro reduz o potencial da região”, dizia Guedes. O ex-governador referia-se às ações do Ministério do Interior. Já o ex-vereador e ex-deputado estadual Amizael Silva (PDS), relator da primeira Constituição Estadual, dizia: “Governador de Território é como um funcionário de terceiro escalão”. | ||
“Guedes e outro ex-governador, Paulo Nunes Leal, deixaram marcas gigantescas nessa construção”, opina o jornalista Lúcio Albuquerque. Segundo ele, Leal (1959-1961) conseguiu com o então presidente Juscelino Kubitscheck a abertura da rodovia BR-29 (depois 364), ligando Brasília a Porto Velho e a toda Amazônia. | ||
“Nos ligava ao resto do mundo, por assim dizer”, elogia. Com Guedes (1975-1979) foram criados mais cinco municípios; houve a interiorização de técnicos agrícolas, engenheiros agrônomos e outros para fortalecer a produção agrícola. | ||
Desde 1967 atuando nesta parte da Amazônia, a partir de 1976 o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) ampliou a distribuição de lotes a pessoas casadas, fixando a população, mesmo sem dispor de assistência de saúde e sob forte ataque do mosquito anofelino, transmissor da malária. | ||
“Teixeira seguiu a trilha deixada por Guedes, e um dos pontos altos do novo governador, que assumiu em 1979, foi fazer o morador do território acreditar que o Estado era possível”, assinala o jornalista. O ex-governador e ex-prefeito de Manaus foi escolhido pelo ex-presidente João Baptista de Oliveira Figueiredo. | ||
“Coube a Guedes criar a estrutura necessária, do ponto de vista administrativo para fazer a base maior, deixando para seu sucessor um caminho mais aplainado para o projeto do Estado”, explica. | ||
JERÔNIMO SANTANA DISCORDA | ||
O ex-deputado federal, prefeito e depois governador, Jerônimo Santana (MDB) queixava-se de que seu projeto de lei (de 1978) fora modificado pela assessoria do então ministro do Interior, Maurício Rangel Reis. “Eles copiaram!”, insistia. | ||
Goiano de Jataí, Santana insistiu três vezes, por lei complementar para criar o Estado. Na votação, exercia a liderança da bancada do MDB na Câmara, absteve-se de votar, e deixou o Plenário. | ||
Avesso à tecnocracia quando parlamentar, ele teve de se valer dela para estruturar o seu Governo, na sequência do “mandato tampão” do professor e ex-deputado estadual Ângelo Angelim (MDB). | ||
TEIXEIRÃO INTRANSIGENTE | ||
Gaúcho nascido em General Câmara, | ||
Teixeirão discordava de possíveis alterações no projeto de criação do Estado. Ele não tirava uma vírgula do que propunham os então ministros Mário David Andreazza (Interior) e Leitão de Abreu (Casa Civil). | ||
Considerado uma espécie de “padrinho” de Teixeirão, Andreazza visitou Rondônia algumas vezes, participando de festivas entregas de títulos de terras ao longo da BR-364. | ||
Conheça a transição entre o antigo território federal e o Estado | ||
Abi Ackel, Andreazza e Teixeirão entram no Ginásio Cláudio Coutinho para o ato de promulgação da Constituição do Estado | ||
“Certidão de batismo não é a Lei que criou, mas a primeira Constituição” | ||
Mesmo com a aprovação da lei que criou o Estado, assinada pelo presidente Figueiredo, publicada no Diário Oficial, e a exoneração do governador do território que deixara de existir, Teixeira continuou, até 6 de agosto de 1983, data em que foi promulgada a Constituição. | ||
Foram então criados por decretos o Tribunal de Justiça e o Tribunal de Contas, lembra o jornalista Lúcio Albuquerque. | ||
“A instalação do Estado, em 4 de janeiro de 1982, foi marcada por alguns fatos interessantes, como o notório mau humor do ministro da Justiça Abi-Ackel, representante do presidente João Figueiredo, e o seu próprio discurso em tom de advertência: “A certidão de batismo do Estado não é a lei que criou, mas a sua primeira Constituição”, diz Albuquerque. | ||
“Desde a criação do Estado, 22 de dezembro de 1981, até a posse de Teixeira, em 29 daquele mês, houve um interregno de uma semana, ou seja: não tivemos efetivamente um governador, porque, naturalmente, com a extinção do território, Teixeira também estava sem função”, comenta Gorayeb. | ||
A controvérsia seria o Art. 26 da Lei Complementar nº 41/81: “Até a nomeação do governador, a Administração do Território Federal de Rondônia será integralmente mantida, na sua estrutura, competência e vinculação ministerial, cabendo-lhe gerir, a partir da vigência desta Lei, o patrimônio do Estado”. | ||
Para Gorayeb, “não havia mais uma | ||
administração do Território de Rondônia, porque o ente criado pelo presidente Getúlio Vargas em 1943 deixara de existir. “Mas, no meio daquela festa toda, quem estava preocupado com isso?”, ele ponderou. | ||
Não foi caso único na história de Rondônia, lembram os memorialistas, alinhando: 1) na época de Território Federal do Guaporé, um governador mandou prender médicos e engenheiros, porque estariam tramando a criação de um “estado socialista”; 2) houve casos de coronéis nomeados governadores, que tinham como subalternos generais. | ||
GOVERNADORES DO ESTADO, DE 1982 A 2021 | ||
JORGE TEIXEIRA | ||
Último governador nomeado do Território Federal de Rondônia, Jorge Teixeira de Oliveira. Foi também designado por decreto presidencial assinado pelo presidente João Baptista de Oliveira Figueiredo, para ser o primeiro governador do novo Estado. Permaneceu no cargo de 4 de janeiro de 1982 a 10 de maio de 1985. | ||
JANILENE VASCONCELOS | ||
ÂNGELO ANGELIM | ||
Tampão, porque administrou o Estado no período entre a saída do último governador (ainda nomeado pelo presidente da República) e a eleição de Jerônimo Santana em 1986. Dedicou-se em seguida ao ramo cerealista. A indicação resultou de um consenso entre o PMDB e a Frente Liberal: “O nome de Angelim obteve aprovação do Senado Federal, embora tenha encontrado resistência de parlamentares (Amir Lando e Amizael Silva) que pretendiam o cargo, e de adversários políticos, entre eles o senador Odacir Soares (PDS)”, lembra o jornalista Lúcio Albuquerque. | ||
JERÔNIMO SANTANA | ||
OSWALDO PIANA FILHO | ||
O médico Oswaldo Piana (PTR), primeiro legítimo “filho da terra”, governou Rondônia de 15 de março de 1991 a 1º de janeiro de 1995. Não disputou mais eleições. | ||
VALDIR RAUPP | ||
Ex-diretor do Departamento de Estradas de Rodagem de Rondônia, o catarinense Valdir Raupp (MDB) governou de 1º de janeiro de 1995 a 1º de janeiro de 1999. Incentivou o projeto de saída para os portos do Oceano Pacífico. Foi depois senador da República por dois mandatos. | ||
JOSÉ BIANCO | ||
O paranaense José de Abreu Bianco (PFL), exerceu o mandato de 1º de março de 1999 a 1º de janeiro de 2003. Fez reforma tributária e readequou o funcionalismo. | ||
Foi também senador. Depois do mandato, tentou uma vaga na Câmara Federal e não se elegeu. | ||
IVO CASSOL | ||
Ivo Cassol (PPS), catarinense, entrou em 1º de janeiro de 2003 e saiu em 31 de março de 2010. Apoiou a agricultura. Foi também senador da República. Seu vice, João Cahulla (PR), também exerceu uma parte do mandato, de 31 de março de 2010 a 1º de janeiro de 2011. | ||
JOÃO CAHULA | ||
Em 2006, João Cahulla foi eleito vice-governador, e em 31 de março de 2010, com a renúncia de Ivo Cassol, assumiu a vaga de governador. | ||
CONFÚCIO MOURA | ||
O goiano Confúcio Moura governou de 1º de janeiro de 2011 a 5 de abril de 2018. Hoje é senador da República. Criou projetos educacionais, de floresta plantada, e incentivou a piscicultura, ao mesmo tempo em que fortaleceu a Secretaria da Agricultura e o bloco de governadores da Amazônia. | ||
DANIEL PEREIRA – O paranaense Daniel Pereira (PSB) teve oito meses de mandato, de 6 de abril de 2018 a 31 de dezembro de 2018. Deu início ao planejamento da regularização fundiária. Ele é o atual coordenador regional do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). | ||
MARCOS ROCHA | ||
Coronel da Reserva Remunerada da Polícia Militar, o atual governador, Marcos Rocha, foi eleito pelo PSL em 2018, assumindo o cargo em 1º de janeiro de 2019. Na segunda quinzena de dezembro de 2020, ele recebeu o título honorífico de Cidadão do Estado de Rondônia, concedido pela Assembleia Legislativa, em reconhecimento aos serviços públicos e trabalho já executados. | ||
Ele já foi diretor do Colégio Tiradentes, secretário municipal de educação de Porto Velho, secretário Estadual de Justiça, além de ter sólida carreira na PM. | ||
Mesmo em ano de pandemia mundial do novo coronavírus, em 2020 ele empenhou-se pelo crescimento de Rondônia. | ||
A política de regularização fundiária entrou na pauta de suas prioridades. Entre outras realizações, Rocha determinou à Superintendência Estadual de Patrimônio e Regularização Fundiária (Sepat) o tombamento e entrega de mais de 1.900 títulos em todo o Estado. | ||
Anteriormente à pandemia, a Sepat recebeu um recursos de R$11,8 milhões, do Ministério da Agricultura, para aplicar diretamente no setor. Em 27 de novembro, a Assembleia Legislativa aprovou a Lei nº 4.892, que regulamentou a política de terras públicas rurais e urbanas. | ||
SAIBA MAIS | ||
► Em 15 de novembro de 1982 o eleitorado brasileiro foi chamado a eleger os governadores que administrariam seus estados pelo interregno temporal de quatro anos, a contar de 15 de março de 1983, num pleito que envolveu 58,6 milhões eleitores. | ||
►Acontecia, então, a primeira eleição direta para governador de Estado desde os anos 1960, valendo o “voto vinculado”. O eleitor teria que escolher candidatos de um mesmo partido para todos os cargos em disputa, sob pena de anular seu voto. | ||
► Os resultados auferidos pelo governo (PDS) foram similares aos quatro partidos de oposição (PMDB, PDT, PTB, PT) e tal equilíbrio influiu na composição do Colégio Eleitoral em 1985. | ||
► O pleito foi regido pela Lei nº 6.978 de 19 de janeiro de 1982 e pela Lei nº 7.015 de 7 de julho de 1982, dentre outras. Nele, Rondônia elegeu senadores, deputados e federais, deputados estaduais, mas o coronel Jorge Teixeira foi mantido no cargo. | ||
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