A importância do xadrez na vida de Bob Dylan
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A importância do xadrez na vida de Bob Dylan

Corre uma lenda na internet bastante divertida: Bob Dylan teria pago a Bobby Fischer, então campeão mundial de xadrez, para que o gênio americano aceitasse jogar uma partida com ele. Embora atribuída ao biógrafo Bob Spitz, esta história não c...

Gab Piumbato
4 min
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Corre uma lenda na internet bastante divertida: Bob Dylan teria pago a Bobby Fischer, então campeão mundial de xadrez, para que o gênio americano aceitasse jogar uma partida com ele. Embora atribuída ao biógrafo Bob Spitz, esta história não consta em seu relato da vida de Mr. Zimmerman.

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Nos cafés onde se apresentava, era comum haver tabuleiros de xadrez - e também nos quartos de colegas de faculdade. Dylan estudou por um curto período na Universidade de Minnesota, em Dinkytown, onde costumava jogar xadrez com outro músico folk, John Koerner, conhecido pelo apelido de "Spider" ("Aranha").

Em sua autobiografia, Dave Van Ronk afirmou: "A primeira coisa que você notava nele naqueles dias era que ele estava repleto de uma energia nervosa. Nós jogávamos bastante xadrez, e seus joelhos estavam sempre batendo contra a mesa. Ele se sacudia em espasmos, sentado na beira da cadeira".

"Ele dominava os movimentos, mas tinha pouca paciência ou concentração que o jogo exigia" (Spitz). Ainda segundo Van Ronk: “Ele estaria jogando de acordo com seu potencial - que estava acima da média - e você estaria cometendo erros que normalmente não cometeria contra qualquer outro oponente”.

Depois de meia hora de jogo, Bob se inclinava sobre o tabuleiro e soltava algum enigma do tipo: "Não tenho certeza de como se joga este jogo." Então, ele despreocupadamente deslizaria uma peça de um lugar para o outro e daria um sorriso. "Oh, sim - xeque-mate!". Para Von Ronk, era um pesadelo, pois um jogo de xadrez era muito mais do que um mero jogo de xadrez para Dylan, acostumado às pelejas psicológicas. 

Jogando xadrez no avião com The Band (1974)
Jogando xadrez no avião com The Band (1974)

A mais importante delas envolve Mark Spoelstra, outro compositor e amigo da época (1961). Quando Dylan ainda estava tentando fazer seu nome nos cafés de NY, ele costumava ir à casa de Spoelstra e jogar xadrez. Numa noite em que a partida não se desenrolava, Dylan passou todo o tempo quieto e distraído, até anunciar solenemente: "Quero que você ouça umas coisas nas quais estive trabalhando por um tempo. Escrevi algumas coisas...estou escrevendo as minhas próprias canções". 

E uma das suas mais famosas e mais bem acabadas seria "Don't Think Twice, It's All Right", fruto de seu relacionamento com Suze Rotolo. Hoje todos sabemos que ela foi para Itália, o que o deixou choramingando pelos cantos. O que poucos sabem é que a irmã dela, Carla, o encontrou uma vez no Washington Square Park. Ele estava vendo os velhos jogarem xadrez. "Eu mal o reconheci. Ele era uma triste figura, melancólico e apático. Nunca havia visto Bob tão deprimido".

Outro evento importante em sua trajetória foi a apresentação no Orange County, um clube de xadrez em New Jersey. Dylan tocou três canções, uma delas sendo uma paródia de uma canção folk tradicional, transformando a narrativa original na história de um compositor folk que era pago com peças de xadrez. A performance impressionou Noel Stookey (o Paul do trio "Peter, Paul and Mary"), que louvou o gênio dylanesco em atualizar um formato antigo para a experiência pessoal de um artista que tentava encontrar o seu caminho autêntico.

A referência mais bizarra a sua paixão pelo xadrez está no pedido de divórcio feito por Sara, no fim dos anos 1970. Entre as suas alegações consta a de que Dylan não teria visto o nascimento de sua filha porque tinha de terminar uma partida de xadrez...

Could I been used and played as a pawn? It certainly was possible as the gay night wore on

Por fim, como nota de rodapé, um bastidor deste texto: ao pesquisar hoje sobre este tema, encontrei o texto de Albert Silver no Chessbase. Ele conta a história de uma pianista brasileira, Rosana Maria Martins, que teria tido um breve namoro com Bob Dylan em sua passagem pelos Estados Unidos. É a única referência a essa história em toda a internet - e em suas biografias, até onde sei, nunca vi este caso ser citado. Supostamente Bob teria dito a ela que Bach era uma de suas maiores influências, mas considerando que ele também disse à mãe de Suze Rotolo que tinha uma doença degenerativa nos olhos, é bom desconfiar do seu amor pelo compositor clássico alemão...

Fica aqui o talento de Rosana:

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