O mais mítico bootleg de Bob Dylan
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O mais mítico bootleg de Bob Dylan

Para comemorar o aniversário de lançamento do volume 4 das Bootleg Series, Bob Dylan Live 1966, The “Royal Albert Hall” Concert, que enfim veio a público em 13 de outubro de 1998, deixo aqui o texto que se refere a este show, presente na melh...

Gab Piumbato
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Para comemorar o aniversário de lançamento do volume 4 das Bootleg Series, Bob Dylan Live 1966, The “Royal Albert Hall” Concert, que enfim veio a público em 13 de outubro de 1998, deixo aqui o texto que se refere a este show, presente na melhor discografia comentada de Bob Dylan em português. Leia abaixo: 

Pronto, o mais mítico dos bootlegs, aquele que captura o Dylan surrealista, o Dylan “Judas” da plateia britânica, o Dylan à beira do cansaço e prestes a sair de cena por causa dum acidente de motocicleta. George Harrison convenceu os Beatles a pararem com os shows, pois temia pela sua vida. Bob Dylan bateu o pé, estendeu a sua bandeira e enfrentou a plateia: “Eles não podem me machucar. Óbvio que podem te afogar nos esgotos, te colocar no metrô e te carregar até Coney Island e te enterrar embaixo da roda-gigante. Mas eu me recuso a ficar aqui sentado me preocupando com a morte”.

Nada surpreendente para quem havia cantado durante o risco da guerra nuclear: “Let me die in my footsteps / Before I go down under the ground”.

Se você está aqui já sabe do que se trata: o primeiro disco tem o set acústico, com Dylan no violão e na gaita, e o segundo traz a eletricidade e a violência de The Band. Se você não conhece, separe um período para ouvir este álbum duplo de duas formas: com fones-de-ouvido e no volume máximo.

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Há muito material para explorar e aprofundar o conhecimento deste grande evento na história da humanidade. Para os registros em vídeo, o melhor é ficar com o conhecido No Direction Home, do mestre Scorsese. A BBC tem um dcoumentário chamado Ghosts of Electricty em que entrevista o responsável pelo grito de “Judas” antes da versão mais raivosa de (play fucking loud) “Like a Rolling Stone”. Por fim, em livro, de C. P. Lee, que esteve lá nessa noite, o relato Bob Dylan: Like the Night (Bob Dylan and the Road to the Manchester Free Trade Hall.

Caso este seja o seu Dylan preferido, procure os shows dessa turnê (em especial os da Austrália, por causa dos solos chapados na gaita), nos 8 meses de 65 e 66. Robbie Robertson se gaba de ter aprendido a tocar guitarra enquanto desviava dos objetos que o público atirava em cima dele. A bateria do Levon era o alvo preferido dos tomates. No histórico show em Forest Hills (28/8/1965), chegaram até a derrubar o pianista Al Kooper de seu banquinho.

Levon Helm pulou do barco (substituído por Mickey Jones, sim!, ele virou ator mais tarde), cansado dos confrontos com a audiência: “gosto da política do Bob: se você comprou o ingresso, você tem o direito de vaiar. Se você não gostou, expresse a sua opinião”. Não que isso vá mudar alguma coisa nos planos dylanescos.

O destaque mais óbvio iria para a “Judas version” de “Like a Rolling Stone”, entretanto sugiro que você pare tudo e escute agora “Tell Me Momma”. Greil Marcus escreveu um belo obituário para Rick Danko, “o homem do lado esquerdo”, posição que costumava ocupar discretamente no palco. Mas o seu baixo podia “fazer tremer a Torre Coit de São Francisco”, nas palavras de Ralph Gleason.

Segundo o cantor e compositor Phil Ochs, nessa época “Dylan se tornou parte da psique de muitas pessoas – e há tantos malucos na América, e a morte é parte da cena americana agora”.

A “viagem mortal” de Dylan culminaria na morte simbólica em cima da motocicleta: “Seu humor negro, o conceito apocalíptico em suas novas canções e declarações à imprensa, seu consumo abundante de substâncias químicas, sua recusa em dormir, e a intensidade de suas performances no palco, tudo parecia suportar a teoria de que havia um homem esperando a crucificação pública e a santificação” (Clinton Heylin).

Leonard Cohen cantou “You want it darker” em seu disco final: “Vilified, crucified / in the human frame”. Os fãs de Bob Dylan não mataram a sua chama, mas a consumiram até quase a sua extinção. Que sorte a nossa, do nosso herói ter sobrevivido. Que sorte a nossa, poder ouvir o registro dessa viagem mortal em sua integridade.


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