Quando uma piada de Zappa irritou Dylan

Infidels é um quebra-cabeça. Todo fã e crítico tem a seleção perfeita do que seria o álbum ideal. Infelizmente Bob Dylan escolheu lançar a pior possível. 

A história de Infidels começa com uma visita de Bob a Frank Zappa num chuvoso dezembro de 1982. Em 1965, Zappa ouviu "Like a Solling Stone" e pensou em abandonar a carreira, pois o caminho que imaginava pro rock já tinha sido desbravado. Felizmente ele perseverou na música e poderia até ter sido o produtor de Infidels, não fosse pelo seu cachorro. Dylan tocou várias canções e perguntou se Zappa toparia a proposta, aceita na hora. Mas seu cão latiu, o que gerou a piada: "ele não gosta de cristãos".

Bem, Dylan vinha de uma conversão evangélica e de três discos puxando pro soul e pro gospel, além de shows nos quais fazia pregações fervorosas sobre o apocalipse e a salvação...

Depois de despachar Zappa por causa da trollagem, Dylan precisava de alguém pra lidar com as novas tecnologias de gravação no estúdio (o CD surgiu em 1982, e a MTV começava a bombar). Assim, recrutou o velho companheiro Mark Knopfler pra dar uma força. A banda era magnífica: Sly Dunbar e Robbie Shakespeare compunham a seção rítmica, Allan Clark (também do Dire Straits) se encarregou dos teclados e Bob ainda chamou Mick Taylor pra participar das gravações. 

Dylan estava escrevendo algumas de suas melhores letras em quase uma década, as gravações eram descontraídas (segundo Dunbar, não havia esforço, era só ligar os instrumentos e tocar) e todos pareciam contentes. Então Knopfler se mandou pra Alemanha, numa turnê com o Dire Straits, e disse que terminaria de mixar o disco na volta. Dylan não podia esperar (hipóteses: já havia passado tempo demais no estúdio; tinha de lançar um disco por ano de acordo com seu novo contrato; ele é o Bob Dylan) e contratou um novo engenheiro de som, remixou as canções e até fez playblack em algumas, além de descartar outras.

O resultado é este lindo disco que ouvimos hoje, surpresos e maravilhados.

Estou escrevendo um texto por dia para esta newsletter. Este é o décimo. Amanhã continuarei a falar de Infidels - ou melhor, do que ficou de fora. Até lá!