e tem uma coisa que eu gosto, é literatura de viagem.
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Se tem uma coisa que eu gosto, é literatura de viagem. | ||
Desde pequena, sempre adorei. Desde que descobri que as pessoas no passado viajavam. Até gosto de viajar eu mesma (quando me dá na telha, e de preferência sozinha), mas não tem nada melhor do que livros sobre viagens que aconteceram cem, duzentos, às vezes oitocentos anos atrás! Porque aí, nesses livros, não se trata só sobre uma viagem a um lugar, um espaço físico: é também uma viagem no tempo. | ||
Ali, se desbrava além da geografia: os costumes, as roupas, o vocabulário, a tecnologia, as relações humanas (que tendem a se repetir, devo confessar), tudo são “novidade” para o leitor. Às vezes eu acho que a literatura de viagem devia se chamar, na verdade, de “literatura de viagem (no tempo)”, assim, com os parênteses mesmo. | ||
O livro aí na foto é o “Viagem ao Brasil (1644–1654) de Peter Hansen Hajstrup”, editado por Benjamin Nicolaas Teensma, Bruno Romero Ferreira Miranda e Lucia Furquim Werneck Sodré. Saiu pela queridíssima Editora CEPE, e chegou até a ser finalista no prêmio Jabuti de 2017, na categoria de História. Essa viagem ao Brasil do título é feita por um soldado pobre, de baixa patente (relato raro de se achar na história!), saído da longínqua Jutlândia na Dinamarca para o Nordeste brasileiro recém-invadido pelos holandeses. Apesar de Peter Hansen ter lutado em batalhas importantes da época (como a dos Guararapes, que aconteceu não muito longe de onde eu morei toda minha infância e adolescência, a cidade de Jaboatão dos Guararapes), o que mais chama atenção no livro é o seu cotidiano e o mundo que o cerca, repleto de miséria e desgraças de toda sorte. | ||
Esse texto aqui não é uma resenha, é importante deixar claro. Li o livro há anos atrás e, na verdade, nunca o terminei. Vale salientar que eu abandonar um livro não significa que o livro não seja bom, só que eu estava provavelmente lendo e fazendo mil coisas ao mesmo tempo, sempre pensando em voltar à leitura, e ops!, três anos se passaram. ¯\_(ツ)_/¯ | ||
Essa viagem ao Brasil de Peter Hansen de Hajstrup ilustra bem o sentimento que tenho com literatura de viagem. Esse soldado dinamarquês do século XVII veio para as “minhas” cidades, Recife e Jaboatão dos Guararapes, e provavelmente atravessou caminhos que eu mesma fiz por aqui. Mas ali, através dos olhos dele e de quatro séculos de diferença, a cidade não é a mesma. O relato de Peter Hansen é, para mim, o mais próximo que vou ter de experimentar uma máquina do tempo. | ||
Muitas dessas narrativas são tendenciosas (quando não completamente mentirosas! Já ouviram falar sobre “George Psalmanazar, o homem de Formosa”?), mas é também esses erros propositais e, às vezes, acidentais que faz a coisa toda ainda melhor. Te dá a oportunidade de investigar, de ler a nota de rodapé, de encontrar coisas novas que nem aqueles viajantes que relatam a história ficaram sabendo (ou sequer entenderam). Esse tipo de viagem no tempo só dá pra fazer através de livros. | ||
Atualmente, quem diria, não dá mais pra viajar por espaços físicos, nem quando a viagem é curtinha. Então ficamos com as memórias e os livros pra ocupar esse pedacinho de vida. Essa foto aí não é atual — acho que dá pra perceber, né? Numa livraria, num local público. Essa foto é também uma viagem no tempo para mim. Ainda tenho esse livro (nunca terminei de ler!), mas não tenho mais a livraria, a rua, o espaço aberto que o comprei. Acho que nunca tive. Hoje, tenho só saudade mesmo. |