Método fônico na reunião de pais
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Método fônico na reunião de pais

O que tratar na reunião de pais de uma sala de alfabetização em que as crianças serão ensinadas a ler pelo método fônico de alfabetização?

Mariane Assis Dias
13 min
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O que tratar na reunião de pais de uma sala de alfabetização em que as crianças serão ensinadas a ler pelo método fônico de alfabetização?

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Primeiramente os pais precisam ter claro o que é a alfabetização:

"A alfabetização é o ensino das habilidades de leitura e de escrita em um sistema alfabético, a fim de que o alfabetizando se torne capaz de ler e escrever palavras e textos com autonomia e compreensão"

Pessoa alfabetizada é, portanto, aquela que domina o sistema alfabético e é capaz de decodificar (ler) e codificar (escrever) a relação grafema-fonema e tem como finalidade produzir e compreender textos.

O sistema alfabético é representado pelas letras do alfabeto que por sua vez são sinais representativos dos sons da fala. O alfabeto foi uma forma de representar, portanto, os sons da fala. Esses sons podem ser: sons vocálicos ou sons consonânticos. Os sons vocálicos são as vogais que do ponto de vista articulatório podem ser consideradas sons formados pela vibração das cordas vocais e modificados segundo a forma das cavidades supralaríngeas, que devem estar sempre abertas ou entreabertas à passagem do ar. Enquanto que, nas consoantes, há sempre uma cavidade bucal promovendo o obstáculo à passagem da corrente expiratória (Cunha & Cintra, 1989). Esses sons são os fonemas de uma língua que permite distinção, assim, o fonema é a menor unidade sonora da palavra que permite distinções semânticas e está presente em nosso inconsciente desde que aprendemos a falar.

Inicialmente esse conhecimento dos fonemas para falar é algo natural, inconsciente, já nascemos preparados para isso. No entanto a aprendizagem consciente de que as letras que vemos representam sons que falamos e ouvimos não é natural. Essa associação precisa ser feita explicitamente e conhecer isso faz parte do princípio alfabético: saber que a letra representa um som, um nome e uma forma gráfica.

A relação grafema-fonema deve ser dada pelo conhecimento explícito de que um fonema (a menor unidade sonora da palavra, popularmente conhecido como fones ou sons que ouvimos e falamos), cujos sons podem ser representados por um grafema (uma letra ou grupo de letras).

Em um contexto de ensino explícito, sistemático e bem instruído parte-se do princípio que a aprendizagem da leitura não é natural e para ler primeiro é preciso aprender a ler.

Os pais precisam receber a informação clara e que não tenham dúvidas de que para aprender a ler é preciso instrução explícita.

Embora o fonema para a fala seja natural, no caso da leitura é preciso uma representação consciente e isso faz uma diferença enorme: aprendemos a falar naturalmente, mas, não aprendemos a ler naturalmente, a leitura exige uma instrução específica. Para descobrir a maneira como as palavras escritas alfabeticamente correspondem a palavras faladas, a criança deve descobrir os fonemas. Ora, como sabemos, sem receber uma instrução sobre o código alfabético, a criança não descobre os fonemas. Aí está um círculo vicioso que é apenas aparente, mas que permite ilustrar a dificuldade da aprendizagem da leitura e da escrita. Alvin e Isabelle Liberman afirmaram que a fala é fácil de ser adquirida e a leitura é difícil porque é preciso passar do fonema inconsciente à consciência do fonema. Para a criança utilizar o sistema alfabético na leitura ela precisará descobrir os fonemas, compreender que o que ela fala e ouve tem relação com o que ela vê através da letra, automatizar esse reconhecimento e ser capaz de analisar e sintetizar os fonemas constituintes da palavra é o que fará diferença na aprendizagem da leitura.

E a forma mais eficiente para garantir que todas as crianças aprenderão a ler é: o ensino explícito das menores unidades constituintes da palavra, os sons que as letras representam, para a posterior formação das sílabas e palavras, através de uma instrução fônica explícita.

Sem a instrução direta a percepção dos sons da fala escapa completamente a 25% dos estudantes do primeiro ano, ou sejam, a cada 100 alunos, 25 deles não terão nenhum consciência quanto a isso (Adams, 2006). Na educação a incapacidade ou a dificuldade em perceber e manipular esses sons da fala implicará em dificuldades para a aprendizagem da leitura e escrita. Pois, sabe-se que conhecer e identificar os sons das letras significa aumentar a capacidade e a habilidade de promover a leitura bem sucedida na alfabetização.

David Kilpratick, professor da Universidade Nova York, citou em uma entrevista que ensinamos a ler de maneiras diferentes, mas as crianças aprendem a ler com proficiência apenas de uma maneira. As evidências científicas reforçam a necessidade da instrução fônica sistemática (RENABE, 2021) e não há evidências de que isso desanime as crianças ou torne a leitura mais difícil. Na verdade, é o oposto. Quando você NÃO fornece às crianças uma visão do código e NÃO as arma com uma visão da linguagem, tanto falada quanto escrita, o que acontece é um mistério, não há certeza no sucesso da aprendizagem em leitura, visto os atuais índices de proficiência em leitura dos alunos brasileiros no final do terceiro ano, quando aproximadamente 50% das crianças não conseguem ler fluentemente e consequentemente compreender textos (PISA, 2018).

Depois dessa aprendizagem, utiliza-se a leitura para aprender e compreender textos.

  • Como as crianças aprendem a ler?

Todas as crianças precisam aprender as mesmas coisas para se tornarem leitores hábeis (Seidenberg, 2017). Um leitor hábil é um bom leitor que identifica palavras com precisão, fluência e velocidade, dentro e fora de textos (EHRI, 2014). 

Para ler corretamente um bom leitor precisa:

  1. Desenvolver o conhecimento da linguagem;
  2. Ser capaz de reconhecer palavras.

Para desenvolver o conhecimento da linguagem a criança precisa ser exposta a interações verbais de qualidade, fatos, acontecimentos, histórias reais que dão a ela a oportunidade de ter contato com a estrutura da língua. Por exemplo, nesses diálogos cotidianos a criança percebe que a fala tem uma estrutura que comunica significado, uma organização, que exige um raciocínio verbal para compreender o que se fala e o que está implícito nos diálogos e principalmente o desenvolvimento de vocabulário acidental. Aquele que a criança é exposta pelos diálogos. Para isso basta a criança estar imersa em um ambiente que ocorram diálogos ricos e variados. Além de diálogos frequentes, crianças imersas em ambientes de leitura em voz alta são beneficiadas. Entre os benefícios da leitura em voz alta está a estimulação da escuta ativa da criança e isso pode ser capaz de contribuir com o aumento da atenção e memória, além da promoção da compreensão oral, que é a capacidade da criança compreender o que ouve. Não é possível compreender o que se lê, sem antes ser capaz de compreender o que se escuta. Depois de consolidadas, as habilidades de compreensão oral também são usadas na leitura (Brasil, 2019).

Um dos indicadores mais importantes de quão bem uma criança aprenderá a ler é a diversidade e a qualidade de sua linguagem falada e vocabulário, e a exposição a novas palavras e seus significados pode ocorrer fortemente através da leitura em voz alta.  Purcell-Gates (2017)  descobriu que, após controlar a renda e o nível de educação dos pais das crianças de 5 anos que ainda não tinham aprendido a ler, as crianças que foram expostas a leitura em voz alta, nos últimos dois anos, usou uma linguagem mais literária, frases mais longas e estruturas de frases mais sofisticadas. Além disso, um adulto lendo com uma criança tem mais probabilidade de explicar ou expandir os significados de palavras e conceitos que a criança ainda não conhece, aumentando seu conhecimento prévio.

  Para ser capaz de reconhecer as palavras e decodificar o código escrito, ou seja, para ler, a criança precisa de um ENSINO EXPLÍCITO, SISTEMÁTICO E BEM INSTRUÍDO que a permita compreender como o que está escrito se relaciona com o que ela ouve e fala. Para ler a criança precisa compreender que a escrita mapeia a fala. Para isso ela precisa estar atenta aos sons da fala. Em um primeiro momento, durante o ensino explícito a atenção dela estará voltada para as maiores estruturas da linguagem, que são as frases, que por sua vez, as frases são compostas por palavras e estas por sílabas, por fim, cada sílaba é formada por fonemas que são os sons das letras.  

Além das unidades constituintes da linguagem, a criança também deverá ser conduzida a percepção de que a língua tem uma forma. Que há palavras que rimam (têm o final igual) e palavras que têm o mesmo som inicial. Essa primeira percepção é chamada de consciência de rimas e aliterações.

FRASES – PALAVRAS – SÍLABAS – SONS DAS LETRAS

Ao conhecer a estrutura destacada acima a criança desenvolverá a consciência de frases e palavras; consciência de sílabas e consciência fonêmica. Nesta última, ao aprender que cada letra tem um som e memorizar cada um desses sons, a criança é ensinada a perceber esses sons nas palavras. Essa é uma das habilidades preditoras mais importantes que a criança precisa desenvolver para aprender a ler. Ao aprender os sons constituintes da palavra MOLA ela estará atenta às menores unidades da palavra e perceberá que se trocar algum som e consequentemente, alguma letra da palavra, o significado também mudará. Por exemplo, na palavra MOLA se substituir a vogal O pela vogal A formará a palavra MALA. Em um primeiro momento as atividades de consciência fonêmica são desenvolvidas oralmente, isso porque a criança deve estar atenta aos sons constituintes da palavra. Assim como as demais habilidades citadas acima, no início não significa que a criança aprenderá a escrever palavras que rimam ou aprender a escrita de todas as famílias silábica e ser capaz de separar as sílabas em um papel, mas sim, prestar atenção nesses segmentos da fala oralmente e ser capaz de identifica-los de forma oral.

Quando o conhecimento dos sons das letras, incluindo a memorização desses sons e identificação desses sons nas palavras, estiver consolidado, chegou o momento de associar e automatizar o reconhecimento do som de cada letra com a sua forma gráfica. Esse reconhecimento é chamado de desenvolvimento do PRINCÍPIO ALFABÉTICO. Nesse momento a criança será ensinada que ao ver a forma gráfica de uma letra deverá associar ao seu valor sonoro. Para que, ao juntar os sons das letras ela consiga decodificar uma palavra. Assim ela aprenderá a ler identificando letra por letra, não dependerá de pistas visuais para a leitura ou memorizar a forma global das palavras. Crianças que aprendem a ler dessa forma são capazes de ler quaisquer palavras que lhe são apresentadas, dentro e fora de contextos.  

Nesse ensino explícito, sistemático e bem instruído na aprendizagem da leitura, a escrita pode ser desenvolvida paralelamente, através do treino motor da escrita das letras isoladamente. Mais importante do que escrever através da memorização das formas das palavras é a criança aprender a ler. Aprendendo a ler da forma citada acima a escrita será uma consequência e após a decodificação das palavras (leitura), ela será capaz de codificar as palavras que escuta (escrita).  Assim, primeiro se aprender a ler, depois a escrever.

Em um ensino sistemático, a aprendizagem da leitura concentra-se inicialmente na leitura de palavras e posteriormente frases e textos. Para ler bem é preciso treino constante de ficha de leitura de palavras, por exemplo. Ao consolidar a leitura de palavras, deve-se avançar para leitura de uma pequena frase e posteriormente de textos. Esse avanço permitirá que a criança passe a ler cada vez mais rapidamente, com maior precisão, velocidade e entonação correta em cada palavra. Com a automatização das habilidades de reconhecimento de palavras é liberado espaço na memória para os processos de compreensão. Um leitor hábil tem uma execução fluente da leitura e coordenação de reconhecimento de palavras e compreensão de textos (PNA, 2019).

  • Em resumo, quais são as habilidades preditoras essenciais para a aprendizagem da leitura?
  1. Desenvolvimento do vocabulário;
  2. Compreensão da estrutura da linguagem oral e escrita: "O que são frases? Palavras? Sílabas? Quais são os sons das letras? Como perceber os sons das letras nas palavras?
  3. Desenvolvimento do princípio alfabético: conhecer que a letra tem um nome, mas mais importante; que representa um som. 
  • Como os profissionais desenvolvem as habilidades preditoras com as crianças?

Em sala de aula ou no atendimento de crianças as profissionais da área da alfabetização devem adotar um ensino explícito, sistemático e bem instruído da relação letra-som. Para isso preparam a criança para perceber e memorizar os sons das letras. Por isso atividades de desenvolvimento da memória e desenvolvimento da escuta atenta ativa podem ser desenvolvidas em paralelo às atividades formais de alfabetização.

Ao invés de reforçar a cópia e escrita de palavras e atividades em folha, as profissionais evidenciam atividades orais que desenvolvam a capacidade de percepção auditiva e oral da linguagem, afinal a alfabetização começa pela percepção auditiva. Embora usemos nossos olhos para ler, o mapeamento da leitura passa pelos nossos ouvidos. Pois as letras escritas em um papel têm uma relação sonora com o que ouvimos e falamos. A escrita (codificação) é uma consequência da aprendizagem da leitura (decodificação).

As letras são apresentadas pela sua forma gráfica, mas, sobretudo pelos seus sons, para isso a profissional utiliza de dramatizações dos sons das letras para auxiliar a memorização das crianças. Por exemplo, ao apresentar a letra V, sua forma gráfica e seu som, a profissional apresentará o som do avião para representar a letra V. Dessa forma, no início do processo o nome da letra não será algo prioritariamente trabalhado, bem como a ordem alfabética. Mais importante do que isso é a criança saber os sons de cada uma das letras e reconhecer as letras pelos sons. Pois essa informação é crucial para a aprendizagem da leitura e decodificação das primeiras palavras.

Na fase da leitura, primeiramente são apresentadas palavras para a criança ler e conforme as estruturas silábicas forem apresentadas palavras mais difíceis são apresentadas para as crianças. Nesse ensino sistemático parte-se do mais simples ao mais difícil. Primeiro se aprende a ler com as palavras, depois avança para frases e textos. A compreensão leitora é o objetivo final da alfabetização, lemos para compreender, mas no início do processo da aprendizagem da leitura não significa que a criança conseguirá compreender tudo que lê. Sobretudo no início, já que as estratégias de decodificação demandam muita atenção da criança. Para desenvolvimento da compreensão leitora é preciso exposição e treino de leitura.

Neste caminho  e a devida apresentação do que as crianças serão ensinadas, não há família que não confie na sua formação pedagógica, por este motivo invista na sua formação para passar a segurança que precisa aos pais e ser reconhecida profissional por isso.

Bom trabalho à você que optou pelo ensino explícito, sistemático e bem instruído e que diante disso ensinará claramente as habilidades preditoras que antecedem a leitura e consequentemente, o método fônico de alfabetização.

Abraços,

Mariane

Referências

Adams, M. 2006. Consciência fonológica em crianças pequenas. Artmed.

PNA, 2019. Política Nacional de Alfabetização. Brasília: MEC, SEALF. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/images/banners/caderno_pna_final.pdf

Purcell-Gates, 2017. In: “Parents as Literacy Brokers” in “The Routledge International Handbook of Early Literacy Education”. Ed.: Natalia KucirkovaCatherine E. SnowVibeke GrøverCatherine McBride. Routledge. 

M. Seidenberg, 2017.  Language at the Speed of Sight: How We Read, Why So Many Can't, and What Can Be Done About It. Basic Books; Reprint edição (6 março 2018)