Sou um homem de sorte. Não pelas coisas que conquistei na vida. Mas, por quem escolhi na vida. Para ser sincero, essas escolhas me levaram ao País das Maravilhas.
Sou um homem de sorte. Não pelas coisas que conquistei na vida. Mas, por quem escolhi na vida. Para ser sincero, essas escolhas me levaram ao País das Maravilhas. |
Sim, ele existe. Eu te juro que existe. Pois, já estive lá por três vezes. Antes de te contar como e o que fiz lá, quero te dizer que, apesar dos pesares, sempre é possível retornar. |
Também quero te contar que o Coelho e o Chapeleiro são os seres mais sábios com os quais já tive contato. Eles acertaram em absolutamente tudo, só se esqueceram de me contar dois pequenos detalhes. De fato, o eterno, por vezes, pode durar apenas um segundo. No meu caso, a eternidade, na primeira vez, durou um ano. Na segunda vez, ela me foi gentil e durou três anos. Na última vez em que sorriu para mim, ela durou uma madrugada. |
Viu? Um homem de sorte. Em trinta anos de vida, já estive na mesma mesa, saboreando um delicioso prato de cumplicidade, com um dos deuses mais bonitos do universo por três vezes distintas. |
Sei que estou falando demais. Mas, sempre falamos demais ao tentar explicar o inexplicável. Este é o defeito de todos os escritores e eu não posso fugir disso. Por isto, sempre concordei com o Veríssimo, ao afirmar que uma boa forma de ser feliz é deixar os escritores falando sozinhos. |
Mas, se você chegou até aqui, acho que já é tarde demais para te fazer desistir, certo? Não posso te contar tudo que fiz no País das Maravilhas. Mas, posso te contar como fiz para chegar lá. Você irá perceber que em todas elas, existe uma ou algumas mulheres envolvidas, uma dose de sorte e dois terços de coragem e amor. |
Na primeira vez, só me toquei que estive lá quando retornei. Hoje consigo ver com clareza que estive lá de janeiro de 2001 até janeiro de 2002. Na época, eu tinha 10 anos. Minha passagem de ida foi um bilhete. Um bilhete que tenho guardado até hoje. Ele é escrito à caneta, em um papel de carta verde claro e com um adesivo do pikachu. Ele contém os seguintes dizeres: “te espero no bate-papo da UOL, às 20:30 de hoje”. Também contém uma assinatura. Porém, não vou te contar de quem é esta assinatura. O mundo é um lugar pequeno demais e eu já passei da fase de entrar neste tipo de confusão. |
Lembro-me de que a minha mãe me acompanhou nesta aventura. Ela ficou ao meu lado e me deu coragem para seguir em frente. Assim, o bilhete virou uma conversa, na conversa existia uma declaração e a declaração foi concretizada em uma sala de cinema. |
O meu País das Maravilhas era minha relação com a minha mãe, meu colégio, meu karatê e ela. Ela tinha sorriso fácil e eu amava vê-la sorrir. Dez anos depois do País das Maravilhas, a encontrei. A primeira coisa que notei foi que ela havia perdido aquele sorriso. Uma pena. Naquele dia eu aprendi que a vida, infelizmente, leva embora a maior parte dos nossos sorrisos bobos. |
Na volta desta primeira viagem, o Coelho me ensinou a lição mais difícil de todas. Ele me ensinou que tudo é uma questão de tempo. Significa que tudo passa. E foi aqui, que ele se esqueceu do primeiro grande detalhe, qual seja, e o depois? Quer dizer, o que fica depois que tudo passa? Eu fiquei dois anos chorando e refletindo essa lição e minha conclusão foi: tudo passa, difícil é saber o que sobra. Para mim, significa que o problema não é o tempo que passa. Mas, sim, o tempo que sobra. E foi aqui, que o tempo se tornou um dos meus fantasmas. |
Aos doze anos, sequei as lágrimas e resolvi voltar ao País das Maravilhas. Para voltar, reli o livro e descobri a lição do Chapeleiro. Nesta segunda leitura, o Chapeleiro me ensinou que basta estar cercado de pessoas que fazem sorrir o coração e você estará no País das Maravilhas. Mal sabia eu que aqui também faltava um pequeno grande detalhe. |
Estar cercado de pessoas que fazem sorrir o coração quer dizer que o que realmente importa é quem você tem na vida. O que você tem na vida é secundário. É atribuir valor às coisas e não preço. |
Você pega tudo que tem valor, abraça e vive todos os dias com eles. |
Foi o que fiz. Eu fiz amigos. Afinal, bons amigos são a família que nos possibilitaram escolher. Eu fiz escolhas. Eu escolhi festas divertidas demais para serem legalizadas. Eu escolhi aventuras e histórias para contar. Assim, a delinquência juvenil me caiu feito uma luva. |
Desta vez, a passagem de ida foi uma briga. Quando me dei por mim, estava ao lado de um garoto trocando socos com outro grupo de garotos. Não tenho ideia do motivo disso. Aliás, nesta segunda vez, eu não sei explicar porque fiz metade das coisas que fiz. Mas fiz. E valeu a pena cada segundo. |
Nós ganhamos aquela briga. Ao final, eu me apresentei para ele. O garoto loiro e de olhos verdes, então, sorriu para mim, me abraçou e me disse seu nome. Eu tinha 13 anos quando isto aconteceu e só fui me separar dele no final dos meus 16 anos. |
Nós dois juntos, formamos uma turma com outros quatro amigos. Desta turma, nasceu uma gangue. Esta gangue me deu as lembranças mais engraçadas da minha vida. Nós fizemos tudo. Graças a eles, eu pude entender Shakespeare: você e seu melhor amigo podem fazer algo ou não fazer nada e mesmo assim, terão grandes momentos juntos. |
Minha vida foi recheada de sorrisos, beijos, brigas, confusões, bebidas e mais beijos por três anos. Eu fui tão feliz, que quando voltei, podia jurar que nunca mais seria feliz daquele jeito. |
Infelizmente, eu estava certo. O nível de felicidade que atingi, exige um preço. Este preço é ter uma leitura completamente equivocada da realidade. Em palavras simples, eu era um adolescente rico, burro e inconsequente demais para entender como a vida pode ser difícil. Sem sombra de dúvidas, eu era ignorante. |
Veja, não quero ser grosseiro. Na maior parte das vezes o ignorante não é ignorante por opção. Em sua maioria, os ignorantes simplesmente não tiverem a sorte(ou azar) de ter cultura. |
Este é o segundo detalhe que o Chapeleiro não me contou. Por vezes, para ir ao País das Maravilhas e viver lá por tanto tempo, é preciso que o passageiro seja ignorante. Neste caso, posso dizer, que ignorância é uma bênção. |
Voltar pela segunda vez do País das Maravilhas me jogou direto no colo da depressão. É engraçado, pois, o mesmo período que passei sorrindo, eu passei chorando. Nas minhas lágrimas, não havia nada além da lição do Coelho, da lição do Chapeleiro e vários livros. Eu lia livros incessantemente na esperança de que um deles me ensinasse a voltar para o País das Maravilhas. |
Ocorre que, quanto mais culto eu ficava, mais distante estava do País da Maravilhas. Perceber isso foi difícil. Mas eu sou um homem de sorte, lembra? A vida aqui na terra, após a depressão, foi doce e me trouxe surpresas agradáveis. Seria injusto reclamar. Sobretudo, depois de reencontrar minha amiga eternidade e o País das Maravilhas quando eu menos esperava. |
Em minha última estada, não recebi uma passagem de ida. Desta vez, foi um convite. Digo isto, pois poderia tê-lo recusado. O convite se deu às quatro horas de uma madrugada de um sábado. O convite, era um pedido de socorro do amor. |
Eu sabia que ela me ligaria. Tanto sabia, que dez minutos antes da ligação, eu tomei um café e fumei um cigarro. Mas admito que não sabia que ela seria o meu convite para minha última vez no País das Maravilhas. Na época, achei que era só mais uma das minhas aventuras. |
Com um sorriso nos lábios, aceitei o convite. Com uma mentira bem contada, consegui traze-la para o meu quarto. Com um suspiro na nuca e um beijo roubado, fui transportado para o País das Maravilhas. |
Agora o País das Maravilhas era minha cama e ela. Ela e o melhor sexo da minha vida. Ela foi o meu maior prazer no País das Maravilhas, ao ponto de que aquela madrugada até hoje não terminou dentro de mim. |
Por conta desta madrugada, eu finalmente consegui entender o livro todo. A grande lição de “Alice no País das Maravilhas” é que a felicidade é um segundo. Apenas um segundo que lutamos a vida toda para que se torne a eternidade. |
É uma batalha perdida. Pois, inevitavelmente, iremos cair na lição do Coelho ou não conseguiremos por em prática a lição do Chapeleiro. A verdade é que o eterno pode ser um segundo. Mas, um segundo nunca será eterno. Talvez, o segredo seja eternizar o segundo certo. Ela durou uma madrugada, mas é minha maior eternidade. Afinal, alguns infinitos são maiores do que outros. |