A primeira dama, o hacker e o "herói" que virou juiz
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A primeira dama, o hacker e o "herói" que virou juiz

Se fosse um filme, esse enredo provavelmente se enquadraria nos gêneros policial, terror, suspense, ação, super-heróis, romance e até comédia.

HS Naddeo
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Era uma vez uma primeira dama de um país, muito descuidada, que teve seu aparelho celular hackeado, e dele teriam sido subtraída fotos íntimas que teriam sido usadas para fazer chantagem sob ameaça de que fossem expostas publicamente. Foi descoberto que o hacker chantagista estaria em São Paulo. Seu marido, presidente da república, acionou o secretário de segurança do estado de São Paulo, que fora nomeado por um governador tucano - que hoje em dia é visto na companhia de um bi-condenado na justiça em duas instâncias, com sentenças confirmadas pelo Superior Tribunal de Justiça.

Então, em desespero, o presidente da república pediu ajuda ao governador e ao secretário de segurança de São Paulo. Em aproximadamente uma semana, em operação sigilosa, descobriram e prenderam o hacker, além de recuperaren as fotos, sem que, pelo menos que se saiba, nenhuma tivesse sido vazada.

Em reconhecimento pela eficiência, ou mera gratidão, o tal presidente nomeou o tal secretário de segurança pública de São Paulo para o cargo de ministro da justiça. O ano era 2016, e a operação Lava Jato começava a ser combatida com força pelo STF e a Polícia Federal, responsável pelas operações que faziam a Lava Jato acontecer, sofria boicotes financeiros do governo federal, diminuindo drasticamente sua capacidade operacional. As forças tarefas da Receita, da PF e do Ministério Público também começavam a sofrer reduções e poder para combater a corrupção.

O nomeado ministro da justiça assumiu com fama e cara de combater o crime organizado. Falas contundentes, excesso de exposição na imprensa, pinta de defensor da lei, autor de diversos livros de direito constitucional, professor de direito. Antes, porém, advogava para uma cooperativa de transporte que, descobriu-se, lavava dinheiro para o crime organizado, mais especificamente para a maior facção criminosa do estado de São Paulo.

Pouco tempo depois, uma fatalidade daquelas que até Deus levaria horas explicando para fazer sentido para nós mortais, morre, em um sinistro acidente de avião, um ministro da suprema corte. Era fevereiro de 2017.

Para o seu lugar o tal presidente (cuja esposa imprevidente teve o celular hackeado e foi chantageada sob ameaça de revelação de fotos íntimas) tinha que nomear um substituto, e mais uma vez, por mérito, ou gratidão, escolheu o para a vaga seu ministro da justiça, o mesmo ex-secretario de segurança pública de São Paulo, herói da honra da esposa descuidada, que ele mesmo já havia nomeado ministro da justiça.

E assim, em uma carreira meteórica, o advogado da cooperativa lavadora de dinheiro da maior facção criminosa de São Paulo, se não do Brasil, virou ministro da suprema corte ocupando a vaga do falecido ministro que era conhecido como incorruptível e detentor de todos os processos da Lava Jato, que posteriormente foram redistribuídos e, coincidentemente, claro, foram parar nas mãos de um ministro que tem em sua biografia um legado de ativismo de esquerda e, como advogado, ter trabalhado durante muitos anos para o MST - Movimento dos Sem Terra.

Se fosse um filme, esse enredo provavelmente se enquadraria nos gêneros policial, terror, suspense, ação, super-heróis, romance e até comédia.

Policial porque pairou o tempo todo sobre o tema. Terror e suspense porque a esposa imprecavida deve ter passado mais bocados. Ação porque achar um hacker e prender o mesmo em poucos dias é uma operação digna de filmes do gênero. Super-heróis porque pela velocidade e eficiência na identificação e prisão do tal hacker certamente o tal secretário de segurança utilizou no mínimo visão de raios X e super audição. Romance, claro, afinal trata-se da relação amorosa e vida íntima de um presidente com sua primeira dama. Comédia não porque rimos da história, mas porque eles tiram da nossa cara.

Não vamos dizer que seria impossível um hacker conseguir acessar o telefone de uma primeira dama. Mas porque escolheria o celular dela? O que esperava encontrar no celular da esposa de um presidente da república? Fotos íntimas mesmo? Por que uma primeira dama teria fotos íntimas em seu celular, logo ela, recatada e do lar? Não parece meio absurdo que um hacker pé de chinelo que é preso em questão de dias tivesse a coragem de chantagear logo a esposa do presidente da república?

Era ele um hacker mesmo? Ou essas supostas imagens íntimas de uma primeira dama 43 anos mais jovem que seu marido presidente da república poderiam ter sido "vazadas" de outra maneira? Teria mesmo esse suposto hacker invadido o celular ou o que saiu desse aparelho poderia ter sido descoberto pelo serviço de inteligência que assessora o presidente e, com isso, ter facilitado a identificação e localização do receptor? Ou quem sabe a história é ainda mais cabulosa e todo o desenrolar dela tenha sido fabricado e usado para que um certo secretário de segurança pública alcasse vôos tão altos na rapidez com que tudo isso aconteceu?

A outros elementos estranhos no entorno disso tudo, como, por exemplo, a perseguição ao deputado Daniel Silveira e a proibição de operações policiais nas favelas, comunidades e aglomerados do Rio de Janeiro - e só nas do Rio de Janeiro - pelo STF, atribuição que deveria ser da política de segurança pública do estado, e não dá justiça, sob a justificativa da pandemia.

A pandemia acabou, as restrições no estado e na cidade foram retiradas, menos a proibição da operação nas favelas. Como se liga uma coisa a outra?

Daniel Silveira era Policial Militar exatamente no Rio de Janeiro e como deputado federal defende pautas conservadores e armamentistas e se tornou um ferrenho crítico da atuação do STF, em especial do ex-secretário de segurança pública de São Paulo e ex-ministro da justiça do governo do ex-presidente casado com a ex-primeira dama desavisada que guardava fotos íntimas em seu celular.

Talvez toda essa narrativa descrita acima não passe de teoria de conspiração ditada por vozes da minha cabeça. É muito possível, pois é difícil de acreditar que tanto descuido e tantas coincidências servissem apenas para levar um ex-advogado de uma cooperativa que lavava dinheiro para o crime organizado a ser membro da mais importante corte judiciária de um país. Mas... Estamos no Brasil.

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