O poder do underground
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O poder do underground

Estas redes, usualmente, não possuem ligações verticais e suas interações ocorrem horizontalmente, na troca – sem cobrança - de conhecimento, ou na possibilidade de escapar do sistema que atrasa, ou ainda para transpor a hierarquia que não se...

Márcio de Oliveira
3 min
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Estas redes, usualmente, não possuem ligações verticais e suas interações ocorrem horizontalmente, na troca – sem cobrança - de conhecimento, ou na possibilidade de escapar do sistema que atrasa, ou ainda para transpor a hierarquia que não se alinha.

É, numa síntese petulante, um escambo de habilidades sem que seja necessária a moeda corrente da alocação, da formalidade ou da subordinação hierárquica.

Cisterna de Teodósio
Cisterna de Teodósio

Há exatos 25 anos, eu escrevia um livro que abordava a existência, a importância e principalmente, a influência, dos submundos corporativos no ambiente laboral. Argumentei que, por baixo de uma estrutura, em tese, perfeita e hierarquicamente organizada, pulsava o verdadeiro e decisivo dia a dia da empresa.

Com exemplos, apresentei este complexo tecido de conexões emaranhadas, conectado por túneis de conhecimentos complementares, parcerias incondicionais e colaborações cruzadas, nunca mapeados na planta geral do organograma ou no quadro da Visão.

Das quatro editoras que enviei meus manuscritos, nenhuma se dispôs a publicá-los...isto foi um tanto deprimente, confesso, para alguém de 23 anos disposto a confrontar teorias inflexíveis de Golias da Gestão, com a simples funda da prática...

Eu ainda guardo meus pergaminhos, recheados com anotações de dois amigos que se dispuseram a revisá-los. Porém, talvez, relendo-os agora com uma rodagem mais alta no odômetro da vida, eu devesse ser mais grato por este bloqueio literário!

Não que agora eu desacredite da existência deste underground, pelo contrário, reafirmo e renovo ainda mais minha convicção e, principalmente, por tê-lo vivenciado e utilizado muito fortemente.

Porém, há um erro crasso em minha leitura da época de como tratar estas galerias de cooperação: propus que líderes devessem trazê-las à tona, dá-las visibilidade, reconhecer e formalizá-las na estrutura oficial da empresa. Uma péssima conclusão para algo que justamente dependeria, vitalmente, de seu anonimato e intimismo para existir.

Um grande equívoco, sem dúvida! Em palavras na nossa mesa de bar, seria como convidar o diretor para o happy-hour, antecipando-me desde já nas desculpas por tal descortesia...

Creio, finalmente, compreender melhor hoje estas vinculações não institucionalizadas, e que são, em essência, redes fortes de relacionamentos, com seus elos e suas ligações definidos por legítimas conquistas dos que a compõem dentro de cada grupo! As posições ocupadas em sua malha não foram instauradas por requisitos decorrentes de políticas ou estratégias, nem pelo que se define como condição obrigatória para o mérito estabelecido.

Mas sim, legitimadas naturalmente e justamente pelas características próprias de cada integrante, seja por irradiar uma liderança técnica, seja pela habilidade de unir os diferentes, seja por saber despressurizar, seja, até mesmo, por ser, talentosamente, o bufão da corte!

Estas redes não possuem ligações verticais e suas interações ocorrem sempre horizontalmente, na troca – sem cobrança - de conhecimento, tanto na possibilidade de escapar do sistema que atrasa, como para transpor a hierarquia que não se alinha. É, numa síntese petulante, um escambo de habilidades sem que seja necessária a moeda corrente da alocação, da formalidade ou da subordinação hierárquica.

Por fim, entendo que não seja possível às corporações trabalharem sem as estruturas formais e os sistemas estabelecidos [até que eu publique o próximo livro, caso me permitam...] afinal é preciso haver padrão para a repetição e os processos de validações em sistemas de grande escala.

Entretanto, é absolutamente necessário que líderes consigam identificar estas redes subterrâneas, primeira e urgentemente, para não rompê-las, segundo, para permitir que as instituições usufruam de suas consistência técnica, convergência de ideias e até mesmo, heterogeneidade de abordagens.

** fim da parte I **