Na carta da semana passada, falei sobre essa ideia de que existe uma ordem por trás do caos do mundo. Uma unidade perfeita, que poderia ser descrita pela matemática. Uma Teoria de Tudo que, uniria todas as forças da física e poderia explicar ...
"Eu descobri que o silêncio, na verdade, é algo que você pode ouvir" | ||
Na carta da semana passada, falei sobre essa ideia de que existe uma ordem por trás do caos do mundo. Uma unidade perfeita, que poderia ser descrita pela matemática. Uma Teoria de Tudo que, uniria todas as forças da física e poderia explicar o Universo de uma forma simples e elegante. Dá pra ler ela aqui. | ||
Pro Stephen Hawking, se a gente conseguisse formular uma teoria assim, então a gente conseguiria contemplar a mente de Deus. | ||
De fato, as simetrias estão aí pra mostrar como a precisão da natureza pode ser virginiana quando ela quer. Como falei, é só olhar pra uma alcachofra que a gente entende que existe, sim, uma simetria, uma ordem única que rege o mundo. | ||
Mas... E se não for bem assim? | ||
No episódio 3 do podcast Brisas Cósmicas, que eu faço com o André (meu amigo que trampava comigo na Galileu), a gente discutiu exatamente isso. Saiu com atraso, mas já foi lançado, então, se quiser se aprofundar na ideia, ouve tudo aqui, porque tem as observações plenas e sensatas do André. | ||
Metade do programa, a gente se dedicou a falar do porquê a ideia de simetria faz sentido. Na outra metade, a gente falou porque essa mesma ideia também é meio absurda. | ||
Veja só, afinal, é um pouco de arrogância e prepotência querer reduzir toda a imensidão e complexidade do cosmos a uma coisa única, não é? | ||
É aquilo que eu sempre gosto de lembrar: tudo que a gente conhece do Universo — deste celular que você tá segurando até a última estrela que os telescópios conseguem observar — é matéria visível, isso representa 4% do Universo. O resto é energia e matéria escura. A gente não sabe o que é, mas consegue medir indiretamente (pela gravidade, por exemplo). | ||
Ou seja, 96% do Universo é feito de coisa que a gente não tem a mais remota ideia do que seja. E, talvez, não tenhamos nem capacidade ou instrumentos pra entender. Então, não seria absurdo assumir só por um milésimo de segundo, sozinho, no quarto, no escuro, que a gente simplesmente não sabe como funciona o Universo. Tudo bem aceitar que tudo é um mistério às vezes. | ||
Talvez até possamos perceber algumas coisas. Mas dizer que sabemos tudo? Seria bem idiota. | ||
Por isso, eu gosto da humildade do livro Criação Imperfeita, do físico Marcelo Gleiser, porque ele assume isso. Eu adoro essa palestra em que ele deu na USP, falando sobre o livro. Uma hora ele diz: | ||
Se existem assimetrias, se a Natureza é ligeiramente imperfeita, é porque a realidade física pouco se importa com a noção de perfeição. Perfeição é uma expectativa humana, apenas isso. A simetria é uma excelente aproximação, mas não expressa a realidade física mais essencial. | ||
É verdade, porque, ao mesmo tempo que existem as alcachofras perfeitas, também existem os maracujás. E, patchaquelamerda, que fruta feia. É até sinônimo de pele mal cuidada. Ninguém acha maracujá bonito, nem Deus. | ||
O próprio surgimento da vida se deu através de uma série de acidentes cósmicos. | ||
E se for isso? E se essa expectativa de encontrar uma simetria perfeita, uma Teoria de Tudo, seja só um ideal humano de perfeição. Tipo, quando você é solteiro, daí conhece um boy, fica com ele uma vez, e já faz planos de casar, ter dois filhos que não choram e uma casinha rústica e elegante em Boiçucanga. Depois o boy diz que não quer mais te ver e você fica puto com ele, quando, na verdade, a expectativa era toda sua. | ||
A vida é feita de imperfeições, não de perfeições. Outra coisa que o Gleiser fala: | ||
Isso não significa que devamos abandonar a simetria como ferramenta de exploração da Natureza. Devemos, no entanto, tratar a simetria e a assimetria como aspectos complementares da realidade física. É da tensão criativa entre a simetria e a assimetria que emergem muitas das estruturas que vemos no mundo. Metaforicamente, podemos dizer que as duas são o yin e o yang da criação. | ||
Gosto bastante dessa ideia de pensar de forma complementar e não excludente, tipo algo pode ser uma coisa "E" outra, não uma coisa "OU" outra. Como uma partícula de luz que se comporta tanto como fóton quanto como onda, ela é as duas coisas. | ||
Gosto também quando ele faz referência ao yin e yang (falei bastante deles nessa edição aqui), porque é aí que a gente vê como os orientais usaram vias totalmente diferentes para chegar em conceitos que a gente usa hoje na ciência ocidental. | ||
Em um trecho do livro O Tao da Física, o Fritjof Capra cita o cientista Joseph Needham, em uma passagem que eu acho bem interessante: | ||
Os astrônomos chineses não sentiam a necessidade de formas geométricas de explicação — os organismos componentes do organismo universal seguiam cada um o seu Tao, de acordo com sua própria natureza e podia-se lidar com seus próprios movimentos na forma essencialmente “não representacional” da álgebra. Os chineses estavam assim livres da obsessão dos astrônomos europeus pelo círculo como a figura mais perfeita, não estando igualmente subjugados à prisão medieval das esferas de cristal. | ||
Acho legal isso, porque traz outra forma de pensar. E eu gosto quando a ciência, a natureza e a filosofia mostram que a gente pode estar totalmente errado sobre o que a gente pensa. É um murro no ego. | ||
Isso mostra que o Drummond pode, sim, estar certo quando ele fala, no poema A Máquina do Mundo, que as coisas dão a volta e tornam a se engolfar na estranha ordem geométrica de tudo. Mas não tem nenhum problema se a gente perceber que essa "estranha ordem geométrica de tudo", na verdade, seja puro caos. | ||
Manter isso em mente e entender que nem tudo tem uma explicação lógica e racional pode ser libertador. | ||
O oráculo do Bowie, um conselho pra semana: | ||
O naipe de paus parece que tá querendo aparecer bastante nesse fim de ano. Essa energia do fogo, que inspira e nos move pra frente, é uma excelente forma de terminar e começar um novo ciclo. | ||
E esse 8 de paus doStarman Tarotnão poderia ser mais apropriado pra essas duas edições em que a gente tem discutido sobre simetria. Alô, sincronicidade! Olha o que o Angelis diz: | ||
O número 8 lida com estruturas — as geometrias — enquanto o naipe de paus carrega energia de combustão em estado bruto. Energia bruta sem estrutura se torna uma energia não confiável, incapaz de ser aproveitada para nos guiar a um propósito. Uma vez que você tenha a geometria perfeita da sua trajetória e a propulsão para chegar onde você quer, você pode trabalhar com concentração completa, sua produtividade vai crescer exponencialmente. | ||
Ou seja, foco, né. | ||
Ele termina falando que a gente deve dominar a técnica de criar as condições ideias pra tornar o nosso sucesso inevitável. | ||
Gosto disso, porque já é uma coisa que eu venho fazendo há um tempo. Tenho me recusado a me colocar em situações desconfortáveis e isso tem me trazido muita tranquilidade. | ||
Espero que essa energia do fogo possa nos dar o direcionamento que a gente precisa para se livrar de todas as tralhas e embustes nesse fim de ano, e que a gente possa seguir mais leve, respeitando nossos limites e construindo um entorno em que a gente possa brilhar que nem o Sol. | ||
Depois de seis meses escrevendo aqui, fico muito feliz de encerrar o ano com tanta gente maravilhosa lendo os sentimentos que eu traduzo nessas cartas. É engraçado como essas coisas ressoam em quem tá na mesma vibração que a gente. | ||
No fundo, todo mundo passa pelas mesmas tretas e quer as mesas coisas: um pouco de paz, tranquilidade e força pra lidar com as treta. | ||
Espero que 2019 tenha sido um ano de muitos aprendizados, e que o sopro de renovação de 2020 nos lembre de que tem sempre uma brisa pra clarear os pensamentos de uma mente cansada. | ||
Obrigado, obrigado, obrigado pela força. Ainda volto antes do Natal, mas já deixo aqui meu desejo de que, independente do que você faça nas festas, cultive bem suas relações para que elas possam sempre renascer em uma flor gigante de mil pétalas. | ||
Vai pela sombra e fica na paz de Bowie. | ||
Com amor, | ||
Nathan | ||
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