Após encerrado o expediente, o trabalhador admira os cem produtos que ele produziu naquele mês. De peito estufado, vai até o capitalista:
Após encerrado o expediente, o trabalhador admira os cem produtos que ele produziu naquele mês. De peito estufado, vai até o capitalista: |
- Ô, explorador, o meu salário, faz favor. |
- Aqui está. |
- Que!? Só!? Mil e quinhentos!? Tudo o que produzi vale quanto? |
- Quarenta mil. |
- Então, explorador, então! E você me paga com mil e quinhentos!? É escravidão que diz?! |
- Ora, rapaz. Tenho de pagar os fornecedores de matéria-prima, o contador, a empresa de fornecimento de energia elétrica, a de fornecimento de água, os impostos que o governo me arrancam, e... |
- Não me interessa. Eu, eu, eu produzi aqueles cem produtos. E eles valem quarenta mil. Quarenta mil, e não mil e quinhentos. Ouviu?! Entendeu?! |
- Ora, eu sei quanto eles valem. Fiz as contas. E o seu salário está embutido no preço final. E tenho de tirar minha margem de lucro, para recuperar o capital inicial. |
- Quero quarenta mil. |
- Que!? Que absurdo. E eu recuperarei o que investi?! |
- Não me interessa! Quero quarenta mil! |
- E viverei de quê?! Diga-me. |
- Você está me explorando. Se eu produzi aqueles produtos, eles são meus, e não seus. |
- Para produzi-los, você usou as minhas máquinas, o meu estabelecimento, a energia que eu pago. |
- Deixe de conversa fiada, explorador. O que produzi é meu. |
- É justo que você receba os quarenta mil pelo que você produziu, se você produziu o que produziu com as matérias-primas que eu comprei?! |
- É. É claro que é. O que eu produzo é meu. Se o que produzi vale quarenta mil, e não mil e quinhentos, então você me deve quarenta mil. |
- O que você produziu é seu? |
- É. |
- Você produziu aqueles cem produtos? |
- Produzi. |
- Então leve-os para a sua casa. |
- O quê!? Que absurdo! |
- São seus aqueles cem produtos, não são? |
- Sim. São meus. Eu os produzi, são meus, portanto. |
- Trate, portanto, de retirá-los do meu depósito. |
- Quê!? Como farei isso!? Não tenho como tirá-los daqui. |
- Problema seu. O depósito é meu. E eu não quero os seus produtos aqui. |
- Mas eu não tenho como tirá-los... |
- Se quiser, mantenho-os aqui, mas você terá de me pagar aluguéis mensais. |
- Aluguéis?? Mas não tenho dinheiro. |
- Não é problema meu. Pague-me aluguel, ou tire-os daqui. |
- Mas... Mas o que farei com eles?! Eles não me servem de nada. |
- Venda-os. |
- Que. Vendê-los?! Mas eu não sei vender produtos; sei apenas produzi-los. |
- Contrate um vendedor. |
- Quê!? Contratar um vendedor!? |
- Sim. E pense: O produto é de quem produz, ou de quem o vende? |
- Mas... Mas... E o meu salário!? |
- Já está pago. |
- Tá pago?? Como assim?! |
- Os produtos são seus; você os produziu. Não devo mais nenhum tostão a você. |
- Mas.. e se eu não os conseguir vender?! |
- Nada posso fazer. É assunto seu, e não meu. |
- Mas eles não têm valor, para mim, se guardados em minha casa. E se ninguêm comprá-los?! |
- Não quero saber. Não me intrometo em assunto que não me diz respeito. |
- Mas... Se ninguém comprá-los, eles não têm valor, pois ficarão encalhados na minha casa. |
- Não quero saber. |
- Se eu não vender nenhum deles, eu não terei os meus quarenta mil. |
- Por gentileza, retire do meu depósito os seus produtos. |
- Espere um pouco, senhor. |
- Diga, e logo. Tenho de ir-me. Espera-me a minha esposa. |
- Tenho uma proposta para fazer ao senhor. |
- Sou todo ouvidos. |
- Compre-me os meus cem produtos. |
- Mil e duzentos. É pegar ou largar. |
- O quê!? Mas... Mas... Mas... |
- Retirei-os daqui. Já. Imediatamente. Ou pague-me aluguel. Diária: cinquenta. |
- Mas... Mas... Mas... |
- Retire-se. E carregue com você os seus produtos. |
- Mas... Mas... Mas... Tudo bem... Aceito... Aceito os... |
- Mil e duzentos. Aqui estão. |
- Obrigado. |
- Disponha. |