#0035: Em 2017 tive a oportunidade de conhecer algumas empresas de engenharia na Korea e criar alguns vínculos com profissionais do tigre asiático, esta semana me apresentaram um fluxo de trabalho de construção de navios que venho aqui compartilhar c
#0035: Em 2017 tive a oportunidade de conhecer algumas empresas de engenharia na Korea e criar alguns vínculos com profissionais do tigre asiático, esta semana me apresentaram um fluxo de trabalho de construção de navios que venho aqui compartilhar com vocês. | ||
Design-Build-Measure-Adjust-Ship (1/7) | ||
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A pandemia esfriou bastante a loucura de outrora de tentar conquistar os mais de 196 países cadastrados em linhas imaginarias que teoricamente divide esse globo que habitamos, devo fizer que na última década foi bem divertido passar por essas linhas imaginarias e ir conhecendo pessoas e locais com histórias bem diferentes entre si. | ||
Numa dessas andanças fomos parar nas Koreas e entre comentários oficiais norte-coreanos em um vídeo no YouTube removido por infringir direitos autorais do AC DC e visitas a Yonsei University para falar com o Ghang Lee, ouvimos pela primeira vez sobre como a indústria de construção de navios era avançada (proud to be first, they said). | ||
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Desde então vira e mexe falamos com alguns amigos que fizemos naquela época e sem muito motivo aparente essa semana nos apresentaram algo mais profundo do que “somos os primeiros em construção de navios”. | ||
Pode parecer que o tópico não tem nada a ver com o que venho compartilhando nos últimos textos, mas o processo é tão minuciosamente engenheirado que trouxe milhões de insights que se encaixam bastante nos conceitos que temos evoluído. | ||
Para quem quer ir bem mais a fundo no processo, recomendo demais este material que conta bastante como foi o desenvolvimento da indústria na Ásia e os principais problemas e soluções encontradas pela indústria. | ||
O interessante da jornada é que o navio em si não é 100% feito na Korea, a produção muitas vezes é espalhada por 15 países diferentes (Vietnam, Japão, China, Indonésia, Índia, etc..) em que cada empresa fabrica a sua parte e envia para montagem final nas docas da Hyundai ou Samsung Heavy Industries. | ||
E é aí que o processo fica interessante, por que como fazer para que cada um fabrique a sua parte e no final tudo se encaixe? | ||
Vamos levantar este pano. | ||
Design-Build (2/7) | ||
Na parte de projetos e fabricação não tem muita novidade se você está no mundo de tecnologia de projetos, basicamente tudo é modelado e compatibilizado em 3D numa lógica de Total Assembly. | ||
Nesta lógica o que existe é uma árvore de produção com um assembly principal que seria o navio completo e a partir daí você vai dividindo o navio em partes fabricadas criando sub-assemblies que terão itens que por consequência terão parts, nada muito novo no mundo de manufatura, se você já abriu um Solidworks sabe do que estou falando. | ||
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O legal da história é o grande investimento na simulação da deformação do aço em um projeto como este, só na Samsung Heavy Industries são aproximadamente 120 engenheiros fazendo simulações e cálculos para o navios que a empresa produz. | ||
A Samsung além de celulares e eletrônicos também faz navios e pasta de dente nas horas vagas, é uma das famosas chaebol coreanas – um conglomerado industrial gigantesco que é controlado por uma família – podemos dizer que seria uma campeã nacional que fala Hangul (idioma coreano). | ||
Joga aí no Google Park Geun-hye e você vai ver que tem coisas que não acontecem só Brasil. | ||
Measure (3/7) | ||
É até meio insano imaginar que um processo extremamente complexo de construção de um navio passava por um controle de qualidade utilizando uma trena. Meio insano, mas era assim que os caras faziam até a década de 90, o que acabava acarretando vários tipos de retrabalho quando as peças de juntavam. | ||
No meio da década de 2000 houve uma evolução deste processo para que utilizassem estações totais para captura da precisão daquilo que era construído, o processo ainda era manual mas o final o resultado era uma tabela de cálculo de várias coordenadas para fazer as coisas se juntarem. | ||
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Na década passada tivemos a evolução do método de controle para que tudo fosse registrado em modelos 3D, assim cada ponto capturado pela estação total era registrado no modelo. | ||
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Nos últimos anos a coisa tem evoluído para deixar de lado uma estação total e a captura dos dados fabricados passou a ser feita utilizando nuvem de pontos com o controle de qualidade realizado através do cruzamento entre o projeto e a nuvem de pontos. | ||
Esta harmonização por assim dizer é feita através de servidores que centralizam a informação e são como um ponto único de verdade. | ||
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Cada pontinho amarelo é um ponto de interferência a ser ajustado entre o modelo e a vida real. | ||
As-Built vs As-Built (4/7) | ||
O legal de ouvir o pessoal conversando sobre o processo foi verificar a iteração e melhoria contínua do workflow durante os anos e as histórias dos porquês as coisas foram se encaminhando para esse tipo de desenvolvimento de hoje em dia. | ||
Imagina você fabricar uma peça a 1500km de distância e chegar na hora do encaixe a coisa não bater. Para que isso não ocorra existe um procedimento chamado de pre-fabrication review e post-fabrication review. | ||
No pre-fabrication, como o próprio nome diz, é a compatibilização da pré-fabricação via modelo. No post-fabrication é a junção das nuvens de pontos fazendo o seu comparativo com o modelo de pre-fabrication para calcular as deformações e só quando estas forem corrigidas é que as peças são enviadas para a montagem final. | ||
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Vendo essas coisas eu lembro de um dos melhores museus que já visitei na vida que foi o Vasa Ship Museum, em Stockholm na Suécia. Para que não conhece a história do Vasa este era um navio de guerra sueco construído em madeira ali entre 1626 e 1628 que afundou depois de navegar pouco mais de 1km. | ||
A história do porque o Vasa afundou é uma das melhores histórias de engenharia do fracasso que você pode ler e aprender com este material aqui, é bem interessante. | ||
AEC? (5/7) | ||
O interessante de ir navegando de uma indústria para outra é verificar como as coisas são feitas de formas distintas, mas parecidas. Na indústria de Óleo & Gás, por exemplo, esse tipo de procedimento é bem comum e maduro em seu desenvolvimento, há bastante similaridade no processo. | ||
Quando falamos de AEC, praticamente quase todo o processo aqui descrito possui seus paralelos, o que me chamou atenção no workflow dos navios foi o processo evolutivo da captura de coordenadas daquilo que era fabricado e com o advento da criação das reuniões de post-fabrication para análise do que eles chamam de As-Built vs As-Built. | ||
Particularmente ir na bunda do mosquito da coordenada X, Y e Z de cada ponto das extremidades da peça fabricada foi uma boa novidade. Existem pranchas e mais pranchas que são geradas com essas informações para correção das deformidades. | ||
Claro, voltando ao chaebol, assim como existe a Samsung Heavy Industries também existe a Samsung Construction & Trading Corporation (Samsung C&T Corp.), pessoal lá tem um portfólio bem legal, desafiador e que bebe bastante da água de outras empresas do grupo: | ||
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Outro lado do mundo (6/7) | ||
Particularmente eu gosto bastante do modelo mental asiático de trabalhar, talvez eles exagerem em alguns momentos em relação a carga horária excessiva e não poder recusar um convite do seu chefe para ir beber, mas no geral quanto algo tem que ser feito a coisa é feita. | ||
A qualidade dos produtos e serviços prestados também é de se elogiar, elaboramos uma tese no qual rodaríamos o escritório em 24 horas com o propósito de enviar a nuvem de pontos para o Vietnam as 18hrs e receberíamos o modelo pronto as 8hrs da manhã do dia seguinte. | ||
A qualidade do produto recebido foi muito boa, mas precisaríamos de alguns ajustes em termos de modelagem e informação para que o processo fosse para frente. Moneywise, com o dólar abaixo de R$ 4,00 valeria a pena pela velocidade. | ||
Tenha em mente que nem tudo em projeto tem como decisão o custo, a velocidade muitas vezes importa e as pessoas até pagam mais caro se tiverem o produto na metade do tempo. | ||
Dito isto, referências são importantes e constituem um repertório de aprendizado que pode fazer bastante diferença em processos, por isso prezo bastante por manter os contatos das viagens e ir trocando figurinhas com esse pessoal. | ||
Networking não é acionar as pessoas quando você precisa, lembre-se disso. | ||
Aprendizado (7/7) | ||
Conectar coisas e conceitos talvez seja aquilo que mais goste de fazer, beber de outras fontes é bom e sempre nos leva a ter um insight diferente para problemas atuais. | ||
Estamos chegando ao final do ano de 2021 e muita coisa aconteceu, vários aprendizados e principalmente muita discussão bacana com quem acompanhou a newsletter até aqui. | ||
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Abs. | ||
Tiago Ricotta | ||
Publicado em 15 de Dezembro de 2021 às 17:30 |