Keep it Simple!
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#0002: Como simplificar a tecnologia para garantir o acesso ao maior número de pessoas possível?

Tiago Ricotta
11 min
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#0002: Como simplificar a tecnologia para garantir o acesso ao maior número de pessoas possível?

Nosso mundo é complexo (1/7)

Nesta edição desta newsletter vamos falar um pouco sobre como a complexidade de tecnologias e processos podem trazer custos ocultos para a sua empresa e levar a uma série de frustrações e complicações em seus projetos.

Para começar vamos definir complexidade, escalabilidade, experiência do usuário e interoperabilidade que são conceitos que vou abordar a todo momento por aqui e que possuem mais relação entre si do que você imagina.

O que é Complexidade?

Característica do que é complexo,  de difícil compreensão ou entendimento. Qualidade do que é difícil, confuso, complicado. Qualidade daquilo que possui múltiplos aspectos ou elementos cujas relações de interdependência são incompreensíveis.  

O que é Escalabilidade?

a capacidade acelerada de expandir um produto em número de clientes e faturamento sem aumentar custos na mesma proporção.

O que é Experiência do Usuário?

a experiência geral de uma pessoa de utilizar um produto e avaliar o quão fácil e prazeroso este produto é desempenhando o que ele se propõe a fazer.

O que é Interoperabilidade?

A capacidade de diversos sistemas (e organizações) de trabalharem perfeitamente juntos, sem perda de dados e sem um esforço adicional.

Escalar uma solução dentro de uma grande organização com cultura já estabelecida é um desafio e tanto, este desafio evolui exponencialmente se esta solução for complexa aos olhos dos usuários, neste caso espere resistência.

Se esta solução não conversar com mais nada dentro da empresa e ocasionar em necessidade de integração via API ou o famoso PPCPPB (planilha pra cima, planilha pra baixo) será introduzido mais alguns fatores para gerar resistência interna.

Em outras palavras, ninguém quer ter 300 aplicativos instalados no celular ou ter que abrir 30 páginas no navegador baixando e subindo arquivos em sistemas diversos porque ninguém é capaz de entender o fluxo como um todo e resolver as coisas de uma forma simples.

Matriz de Complexidade (2/7)

Uma vez ouvi uma frase, que já não me lembro aonde para poder referenciar o autor, que dizia o seguinte: "entre o que você pensa, fala, alguém escuta, raciocina e entende são cinco chances que temos de errar"

Justamente por isso quanto mais simples forem as coisas melhor a escalabilidade de uma solução e evita-se os chamados custos ocultos. No último ano, devido a complexidade de alguns sistemas que estava lidando, geramos a seguinte matriz de complexidade de sistemas:

Matriz MCS - Matriz de Complexidade de Soluções (brincadeira, só para criar mais uma sigla)
Matriz MCS - Matriz de Complexidade de Soluções (brincadeira, só para criar mais uma sigla)

As quatro possibilidades da matriz  de complexidade aplicando-as para soluções de tecnologia são:

Quadrante 1 - não tão inteligentes e difíceis de usar: o pior caso de todos em que quem desenvolve acha muito fácil e quem utiliza pena para entender o que deve ser feito, no fim alguns poucos usuários vão ser os campeões da tecnologia e vão tentar desesperadamente formar novas pessoas para que seja possível escalar. A escalabilidade vem com altos investimentos.

Quadrante 2 - inteligentes e difíceis de usar: costumo comparar este lado do quadrante com as soluções alemãs, geralmente fazem tudo de forma primorosa, mas com uma UX (experiência do usuário) tenebrosa, quer um exemplo? Uma vez me deparei com um site de LMS (Learning Management System / E-Learning) alemão que virava do avesso, ou seja, se você respondesse as questões e apertasse next o sistema te dava metade da nota porque metade das questões você não tinha respondido, para responder você precisaria ter "virado a página" com a outra metade das questões... escalar isso vai te custar uma fortuna.

Experiência terrível do cliente da nisso...
Experiência terrível do cliente da nisso...

Quadrante 3 - não tão inteligente, mas fácil de usar: Microsoft e Google tem várias soluções que se encaixam neste quadrante, o maior exemplo é a tecnologia de formulário de ambas as empresas, você consegue fazer sua pesquisa de maneira muito fácil, mas se precisar de alguma coisa mais completa tem que recorrer ao Survey Monkey. É bem fácil de escalar, mas sempre fica com aquela frustração de não fazer tudo que precisa.

Quadrante 4 - inteligente e fácil de usar: não sei quantos aqui tiveram o prazer de abrir uma conta no C6 Bank e utilizar o app desta fintech, mas em termos de facilidade acredito que seja o que mais se aproxima desse desejo de ser inteligente e fácil para o usuário. No setor de AEC sei de apenas um projeto que visa chegar neste quadrante (vão ter que esperar), no geral não existem soluções representadas aqui.

Se você esta dentro de uma grande organização pode utilizar este conceito para pensar a estratégia de implantação de uma nova tecnologia, seu discurso perante a diretoria vai ter que ser ajustado de acordo com esta complexidade.

Sopa de acrônimos (3/7)

cada palavra um conceito...
cada palavra um conceito...

Se fizermos um comparativo dos cargos nas empresa AEC veremos que há uma grande carga de novos títulos nos últimos 2 ou 3 anos, é só dar uma passada no Linkedin para encontrar coisas que não existiam até 10 anos atrás como BIM Coordinators, Product Owners, Lean Consultants, Agile Coachs, VDC Managers.

O famoso medo de ficar de fora (fear of missing out - FOMO) é bem latente na indústria AEC, é aparecer uma nova certificação ou conceito que rapidamente é abraçado por alguns early adopters que começam o trabalho de evangelização do mercado.

Isto é muito positivo quando não gerava uma sopa de letrinhas de acrônimos em que em uma mesma frase passa a ser quase impossível não recorrer ao Google para entender o que, de fato, as pessoas estão falando.

Uma vez participei de uma evento para falar sobre metodologias ágeis no qual os participantes eram majoritariamente formado por arquitetos e engenheiros, em um intervalo de duas horas tiveram 4 palestras de 30 minutos cada uma em que a galera ali foi bombardeada por Ágil, Neuroarquitetura, WELL e técnicas de apresentação.

Qual a chance de absorver tanta coisa nova em 2 horas?

Neste ponto a gente volta a definição de complexidade "Qualidade daquilo que possui múltiplos aspectos ou elementos cujas relações de interdependência são incompreensíveis".

A indústria AEC não é sexy (4/7)

Que o mercado AEC esta cheio de problemas não é muita novidade, a novidade aqui é como quem esta trabalhando no mundo tecnologia enxerga o desenvolvimento de soluções.

Um doce para quem já ouviu um vendedor de tecnologia falar que é só apertar um botão, mas na prática a coisa funciona assim:

aperte um botão que te leva a outra janela com outro botão (looping infinito)
aperte um botão que te leva a outra janela com outro botão (looping infinito)

Eu tenho sobrinha nascida em 2017 que utiliza facilmente um celular e olhando a facilidade com que ela aprende a usar as coisas eu me questiono o quão atrativa a indústria AEC será para as novas gerações que nasceram no digital?

Imagina os futuros arquitetos e engenheiros entrando na faculdade e sendo proibidos de utilizar tablets e computadores para fazer desenhos nos dois primeiros anos da faculdade em nome do romantismo, ou pior, ter aula de desenho assistido por computador (CAD).

Falharemos miseravelmente como indústria AEC se apresentarmos o AutoCAD como forma simples de fazer projetos para as futuras gerações.

Além do AutoCAD outro grande vilão na indústria AEC é o Excel, isto porque quando um Product Owner pergunta ao usuário arquiteto ou engenheiro sobre como eles gostariam que fosse a experiência com determina solução que eles estão desenvolvendo, geralmente a resposta que vem é "que seja fácil como o Excel"

Ai o que acaba acontecendo? Temos praticamente TODAS as soluções de tecnologia AEC com cara de Excel, não importa se estamos usando um dispositivo super disruptivo de realidade aumentada como o Hololens, nós vamos projetar um conceito de planilhas e gráficos Gantt para gerenciar a obra em realidade aumentada:

One size fits all - tudo com cara de Excel, até no Hololens
One size fits all - tudo com cara de Excel, até no Hololens

Por que é importante tornar as coisas simples? (5/7)

Quando um produto, solução ou processo são complexos os custos ocultos explodem.

Um exemplo: se você tiver 200 profissionais de um determinado cargo na sua empresa e necessita padronizar um processo que leve 1 hora de treinamento, seu custo interno para adoção desta nova forma de fazer será de no mínimo 220 horas de treinamento.

Por que 220 horas? Será 1 hora de treinamento para cada pessoa (200 horas) + 20 horas de preparação, gravação e instrução do treinamento por parte de um professor.

Na indústria AEC, para um novo sistema ou processo, quantas vezes você participou de um treinamento de 1 hora? quantas vezes participou de treinamento de 10, 20, 30 ou 40 horas?

Vai aprender Microsoft Project? 24 horas em um curso padrão.

Vai aprender Autodesk Revit? 40 horas em um curso padrão.

Vai aprender Excel? 24 horas em um curso padrão.

Isto porque estou falando de cursos básicos e que te entregam um certificado que não tem validade nenhuma para o mercado, o que tem validade para o mercado é o que você sabe fazer com o conhecimento que você adquiriu no curso.

Como tornar a indústria AEC sexy? (6/7)

Basicamente estamos em um looping infinito:

Looping da complexidade da indústria AEC
Looping da complexidade da indústria AEC

O que deveria ser feito nesta questão de complexidade e fragmentação para que diminuíssemos custos ocultos e tornássemos a indústria AEC mais sexy para as futuras gerações?

Uma sugestão é seguir o que uma das maiores mentes especialistas no assunto de experiência do usuário disse em uma entrevista:

“Algumas pessoas dizem para dar aos clientes o que eles querem, mas essa não é a minha abordagem. Nosso trabalho é descobrir o que eles vão querer antes de o fazerem. Acho que Henry Ford disse uma vez: 'Se eu perguntasse aos clientes o que eles queriam, eles teriam me dito um cavalo mais rápido'. As pessoas não sabem o que querem até que você mostre a elas. É por isso que nunca confio na pesquisa de mercado. Nossa tarefa é ler coisas que ainda não estão na página ”

A começar pela forma como construímos nossas soluções, ao invés de ter uma relação de 1 para N quando falamos de ensino de tecnologia, deveríamos investir para ter uma relação de N para 1.

O que isto quer dizer e o que construir solução tem a ver com ensinar a usa-la?

O que toda empresa de tecnologia faz? Desenvolve o seu produto com as necessidades do mercado, forma um técnico / champion que sabe tudo do produto e que terá capacidade de ensinar outras pessoas a utilizar o produto. Esta é a relação 1 para N e assim se formam cursos de 40 horas para aprender a usar as coisas e os seus custos de implantação explodem.

E se fosse possível reunir o máximo possível de especialistas e condensar o conhecimento daquilo que é padrão e complexo de se ensinar transformando isto em linhas de códigos para que os usuários consigam desempenhar suas tarefas sem a necessidade de ter treinamentos de 40 horas em um produto? E se aplicarmos experiência do usuário para que eles saibam o que fazem intuitivamente de tão simples que as coisas são?

Atualmente é muito difícil, mas eu tentaria fugir de soluções em que você tenha que investir 40 horas em uma sala de aula para aprender somente o básico.

Agora vou fazer você pensar e talvez você não entenda (se for o caso me mandem inbox no Instagram @tiagoricotta ou no Linkedin que explico a afirmação abaixo).

Por que temos que ensinar arquitetos sobre as 64 opções de especificação de drywall se no fim tudo que é preciso para especificar já esta contido no ambiente em que o drywall esta inserido? Se temos a informação de nível acústico, tipo do ambiente (seco ou úmido), área e interface com outros elementos como forro isto já basta para tornar possível codificar e automatizar planejamento, orçamento e compra deste item.

E se já temos todas as informações em um projeto, por que não tornar isto visual para melhorar o entendimentos de todos?

Orçamentos e planejamentos visuais já são possíveis de serem feitos atualmente, o problema é que sempre se depende de um jeito de modelagem ou ligação com planilhas externas, o que implica em mais horas de treinamento e execução de tarefas.

Tirando o fato de que provavelmente será necessário instalar um software pesado e ter um computador com alta capacidade computacional para executar as tarefas, mais custos para as empresas.

Idealmente deveríamos buscar utilizar soluções nos navegadores (assim não precisamos instalar nada), buscar sermos o mais visual possível em todas as etapas do empreendimento com codificação (linhas de código de programação seus tarados por composição de custos) do máximo possível de coisas que são padronizáveis e focar o desenvolvimento das soluções com uma experiência focada nas pessoas e não nas ferramentas.

Projetamos com mouse na mão e não com as próprias mãos mesmo com toda a tecnologia que temos atualmente.

São várias pequenas grandes coisas que podem ser feitas para facilitar tornar nossa indústria mais sexy, a indústria de games tem muito a nos ensinar neste sentido.

Complexidade e custos ocultos (7/7)

Para finalizar este conteúdo pense que tudo aquilo que é complexo e de difícil entendimento vai ocasionar em custos para a sua empresa.

Cada tecnologia que você adotar em que será necessário um curso de 40 horas para o nível básico em que não há nenhuma garantia de que os resultados serão alcançados posteriormente é um risco que sua empresa esta correndo.

Cada hora de treinamento para ser executado exige um esforço grande em termos de montagem de material, disponibilização de máquinas, gravação de vídeos, horas do marketing para chamar as pessoas, tudo isso são custos ocultos que devem ser considerados.

O custo de implantar uma tecnologia não pode ser mais caro do que os benefícios que ela irá trazer, claro, sempre existe o intangível nas soluções, mas tenha em mente que os custos ocultos são um assassino silencioso, vai queimar o caixa da sua empresa se não houver controle da situação.

Isto é motivo para ficar com medo de mudar e deixar as coisas como estão? NÃO, não mudar com toda a transformação digital que esta em curso é um suicídio declarado, ou seja, temos que nos mover, mas não podemos deixar que a complexidade fique nas nossas mãos, quem fabrica tecnologia tem que tornar nossas vidas mais fáceis e não mais complexas.

Só estou compartilhando um pouco da minha experiência para que você não caia nas armadilhas do mercado.

Nunca é apertar só um botão.

Até a próxima,

Abs.

Tiago Ricotta

Publicado em 28 de Abril de 2021 às 14:30