Resumo da semana - 11/09/21
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Resumo da semana - 11/09/21

Duas coisas são péssimas para uma democracia: a judicialização da política e a politização da justiça. Ambas, infelizmente, seguem em alta no Brasil. A esquerda, derrotada nas urnas, lança mão do "tapetão" judicial com enorme frequência, enco...

Constantino
18 min
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Politização da Justiça

Duas coisas são péssimas para uma democracia: a judicialização da política e a politização da justiça. Ambas, infelizmente, seguem em alta no Brasil. A esquerda, derrotada nas urnas, lança mão do "tapetão" judicial com enorme frequência, encontrando boa vontade numa corte suprema que detesta o presidente. E esta, por sua vez, pratica cada vez mais ingerência nos demais poderes, com um ativismo extremamente preocupante.

Essa combinação é péssima para o país. Uma república que mereça tal nome precisa ter instituições sólidas e independentes. O nome vem de "res publica", ou coisa pública, e o foco não deveria ser atender interesses particulares. Em nossa "república", porém, grupos de interesses dominam a política e também a justiça, como fica claro. Tudo vira moeda de troca para servir aos donos do poder. A Folha divulgou uma notícia no começo da semana alegando que o STF usará a agenda econômica para pressionar Bolsonaro no caso de radicalização com o 7 de setembro.

O que mais me espanta não é se isso for verdade, pois é crível, mas sim a naturalidade com que a nossa imprensa trata uma clara chantagem do STF, ou seja, o uso de pautas econômicas como moeda de troca, vindo da corte constitucional, que age como um partido de oposição. Nossos jornalistas acham normal um STF que usa decisões sobre questões econômicas para pressionar o presidente. República de bananas, só se for!

Enquanto isso o Senado segura a sabatina do nome indicado por Bolsonaro para o STF, para a vaga de Marco Aurélio Mello. Em Brasília, fala-se abertamente de que é uma "retaliação" ao presidente pelo seu tom belicoso, ou seja, não importa que o presidente tem a prerrogativa de indicar alguém, que cabe ao Senado avaliar a escolha dentro dos critérios objetivos de reputação ilibada e notório saber jurídico.

Até Dias Toffoli passou na sabatina do Senado! Ele estava sob o mensalão, é verdade. Mas André Mendonça, que tem bom trânsito no Congresso e no STF, continua na "geladeira" por barganha política. O senador independente Eduardo Girão condenou a postura nada republicana.

Aliás, vale pensar numa coisa: André Mendonça, com bom trânsito no Senado, sequer foi sabatinado ainda, por retaliação a Bolsonaro. Imagina se o presidente tivesse indicado um nome mais conservador para agradar sua base! Não parece justo simplesmente criticar que o presidente não escolhe aquele nome ideal para o STF. Teria de combinar antes com os "russos", ou chineses, que mandam de fato no país...

Quem define a verdade?

À exceção dos cínicos e canalhas, todos que defendem uma postura o fazem porque julgam estar do lado certo, com a verdade em mãos. É por isso que, desde tempos imemoriais, há um debate ferrenho sobre quem poderá ter a última palavra sobre o que é verdadeiro e o que é falso. Na tradição liberal, que persistiu ao longo de muita luta e também derramamento de sangue, optou-se pela humildade epistemológica e a ampla liberdade de expressão.

Desde John Milton, passando por John Stuart Mill e tantos outros, os liberais pregaram o debate quase irrestrito e cada indivíduo livre para julgar por conta própria. Se você está seguro de suas verdades, cabe a você persuadir os demais, confrontar seus supostos equívocos com argumentos convincentes para mostrar-lhes que estão no engano e despertarem para a luz da verdade. É por isso que no Ocidente liberal há quase irrestrita liberdade de expressão, ao contrário de sociedades coletivistas e autoritárias, em que o estado decide o que é verdadeiro ou não.

A liberdade de expressão no Brasil está ameaçada hoje por aqueles que se dizem liberais, democratas e tolerantes. Eles "sabem" que os bolsonaristas são uns "negacionistas", eles viram a luz da ciência, eles definem o que é verdadeiro e o que é falso. Ao revogar a Lei de Segurança Nacional, Bolsonaro vetou alguns artigos, entre eles justamente o poder estatal de punir "disparos em massa inverídicos contra a democracia". Eis como o editorial do Estadão enxergou o caso:

O Congresso estabeleceu dois novos crimes contra o processo eleitoral. Jair Bolsonaro vetou o crime de comunicação enganosa em massa (promover ou financiar campanha para disseminar fatos que sabe inverídicos, e que sejam capazes de comprometer a higidez do processo eleitoral; pena de um a cinco anos de reclusão). Sem pudor, tenta manter impunes as ações bolsonaristas contra o sistema eleitoral. [...] O Congresso não criminalizou nenhuma manifestação de pensamento. Apenas protegeu o Estado Democrático de Direito, o que evidentemente dificulta os intentos do bolsonarismo. Cabe ao Legislativo proteger seu bom trabalho, derrubando os cinco vetos. Não deve haver impunidade para quem atua contra o regime democrático.

Para o jornal, seria crime contra o sistema eleitoral espalhar desconfiança em relação ao modelo eletrônico que só Brasil, Butão e Bangladesh adotam. Seria crime repetir que nossas urnas são opacas, caixas-pretas sem transparência, e que não são invioláveis, ao contrário do que afirma o TSE, isso sim uma Fake News. O jornal, que se vangloria de defender instituições e a liberdade de pensamento, quer interditar o debate e exige que todos aceitem o que diz o TSE e ponto final. Qualquer outra coisa seria "atuar contra o regime democrático", pelo visto.

É uma postura temerária! Isso sem falar do escancarado duplo padrão, da seletividade. Afinal, o establishment não está perseguindo comunistas, que abertamente atacam o regime democrático e pregam a ditadura do proletário. Esses gozam de um salvo-conduto para destilar ódio contra o sistema "burguês", e alguns pedem até a dissolução do STF. Mas eles podem tudo, enquanto os bolsonaristas que criticam o STF e o TSE são "golpistas". O Estadão não quer saber dos perigos de delegar a alguns poucos "iluminados" o poder de decidir o que é verdade.

À contramão do Estadão, a Gazeta do Povo escreveu um editorial em defesa da liberdade de expressão e denunciando o perigoso "Ministério da Verdade" criado pelo Supremo: "STF quer usar monitoramento para combater a 'desinformação' e o 'discurso de ódio' – e quem definirá o que é 'narrativa odiosa' será, certamente, o próprio Supremo. [...] E bem sabemos quais são os critérios dos membros da corte, que ameaçam de prisão quem chama o Supremo de 'uma vergonha', ou que buscam destruir a carreira de membros do Ministério Público que criticam decisões – decisões, e não pessoas, que fique claro – bastante criticáveis da corte. A julgar pelo retrospecto, qualquer crítica legítima, seja formulada em termos brandos ou de forma mais incisiva, será classificada como 'discurso de ódio' se ferir os brios dos ministros".

Em suma, estamos diante de um velho embate que os liberais conhecem há séculos. De um lado, arrogantes autoritários que juram ser os detentores da Verdade e querem calar os demais; do outro lado, os mais humildes que reconhecem a falibilidade humana e enxergam no próprio método científico a vantagem da abertura constante a questionamentos, já que aquilo considerado verdade ontem pode se mostrar falso amanhã. O irônico é que os autoritários dogmáticos acusam os liberais humildes de fascistas, negacionistas e golpistas que atentam contra as liberdades e a democracia. É o golpe perfeito: matam a liberdade e a democracia em seu nome!

Mídia exposta

Uma multidão tomou as ruas do Brasil neste 7 de setembro, tornando o aniversário de nossa independência num ato cívico e patriótico maravilhoso. Famílias inteiras, muitas crianças, todos de verde e amarelo pedindo respeito à Constituição e liberdade, cantando o hino nacional. Foi emocionante acompanhar, ainda que de longe.

Não obstante, a ala militante da imprensa insistiu em suas narrativas sem qualquer elo com a realidade. São todos golpistas, fascistas, num ato antidemocrático. Decidiram antes nas redações que a manifestação ao lado do presidente seria assim, enquanto a outra, da oposição vermelha, seria a democrática. E não há fato capaz de mudar tal narrativa.

Falaram em bolsonaristas armados e perigosos, e vimos uma enorme manifestação pacífica e ordeira, como costuma acontecer do lado patriota. A polícia conseguiu impedir uma meia dúzia de vândalos, mas do outro lado. Soco inglês, símbolo da anarquia e coquetel Molotov foram apreendidos com manifestantes da oposição. Silêncio da mídia.

Acompanhar o ato por uma dessas emissoras foi um ato de coragem e resistência, mas são os ossos do ofício. A GloboNews chegou a dizer que tinha muita gente passeando pela Av. Paulista num dia bonito de feriado. Poxa, queriam só dar uma volta e acabaram enchendo os atos “antidemocráticos”, que coisa! O “especialista” disse que a manifestação era uma espécie de apoteose do cercadinho do presidente. Cercadinho enorme esse, hein?!

Miriam Leitão disse que os bolsonaristas escolheram Alexandre de Moraes como inimigo pois ele vai presidir o TSE ano que vem, ou seja, pura estratégia golpista para o caso de derrota nas urnas. Nada a ver com as decisões abusivas dele, imagina! Nenhuma palavrinha sobre prisões arbitrárias numa clara perseguição a bolsonaristas daquele que era filiado ao PSDB antes. Tudo conspiração!

Os "analistas" também focaram na aglomeração em meio à pandemia, enquanto enalteciam o outro lado, pedindo vacina, emprego e respeito à Constituição. Enquanto diziam isso, dava para ver uma das bandeiras dos manifestantes pedindo a ditadura do proletário. Ouch!

Repetiram que os manifestantes usavam faixas lembrando que supremo é o povo e pedindo a saída de ministros supremos, “o que é inconstitucional”. Fake News, claro! É absolutamente legítimo e constitucional pedir impeachment de ministro do STF! Mas essa foi a narrativa o tempo todo. 

A esquerda marcou ato pro mesmo dia. Big mistake! Fica impossível não ver a diferença de público - quantidade e qualidade. Famílias inteiras de verde e amarelo defendendo a Pátria e a Constituição de um lado, e do outro uma fração dessa multidão, uma meia dúzia de gatos pingados militantes com o vermelho.

A GloboNews passou a tarde toda querendo escolher a pauta certa em nome do povo, falando da economia (sendo que antes dizia que a economia poderia ficar para depois, quando somente Bolsonaro alertava para sua importância). Aí vai a multidão e grita "liberdade" durante a fala do presidente. Esses jornalistas, pelo visto, não sabem o que é isso...

Narrativa: fascistas perigosos e armados podem dar um golpe. Realidade: multidão pacífica de famílias inteiras com verde e amarelo cobrando respeito à Constituição e pedindo liberdade. Mas nada disso importa, pelo visto. Os jornalistas tinham as manchetes prontas, e não há mais qualquer compromisso com a verdade: o intuito é derrubar Bolsonaro, ponto.

O jurista Fabricio Rebelo comentou: "O ponto positivo da total desconexão da realidade na cobertura da mídia tradicional sobre as manifestações deste 07/set foi deixar ainda mais fácil para o espectador comum perceber que ali não há pudor algum em mentir. Os olhos veem uma coisa e ela diz outra, oposta".

O maior derrotado nas manifestações foi o jornalismo, mais do que o Xerife. Ficou evidente demais até para um cego desatento que hibernava em Marte o jogo sujo dessa imprensa militante, que declarou guerra ao governo, seja por ideologia, seja por abstinência de verba pública. Essa postura da grande imprensa acelera seu inevitável declínio rumo à irrelevância.

A revolução dos caminhoneiros

Edmund Burke, o "pai do conservadorismo", faz alertas em suas Reflexões sobre a Revolução em França que reproduzo aqui:

Não ignoro nem os erros, nem os defeitos do governo que foi deposto na França e nem a minha natureza nem a política me levam a fazer um inventário daquilo que é um objeto natural e justo de censura. [...] Será verdadeiro, entretanto, que o governo da França estava em uma situação que não era possível fazer-se nenhuma reforma, a tal ponto que se tornou necessário destruir imediatamente todo o edifício e fazer tábua rasa do passado, pondo no seu lugar uma construção teórica nunca antes experimentada? [...] Não se curaria o mal se fosse decidido que não haveria mais nem monarcas, nem ministros de Estado, nem sacerdotes, nem intérpretes da lei, nem oficiais-generais, nem assembléias gerais. Os nomes podem ser mudados, mas a essência ficará sob uma forma ou outra. Não importa em que mãos ela esteja ou sob qual forma ela é denominada, mas haverá sempre na sociedade uma certa proporção de autoridade. Os homens sábios aplicarão seus remédios aos vícios e não aos nomes, às causas permanentes do mal e não aos organismos efêmeros por meios dos quais elas agem ou às formas passageiras que adotam. [...] Se chegam à conclusão de que os velhos governos estão falidos, usados e sem recursos e que não têm mais vigor para desempenhar seus desígnios, eles procuram aqueles que têm mais energia, e essa energia não virá de recursos novos, mas do desprezo pela justiça. As revoluções são favoráveis aos confiscos, e é impossível saber sob que nomes odiosos os próximos confiscos serão autorizados.

O Brasil caminha rapidamente para um ponto de ruptura cujo resultado é imprevisível. O sistema está podre, o povo está revoltado. Quando o povo decide peitar o sistema, isso é sempre um enorme perigo, e quem está na liderança de movimentos assim assume grande risco. O sistema é bruto, companheiro. Do ponto de vista tático, é legítimo debater e discordar dos métodos ou do timing, mesmo considerando a causa justa. Os meios importam. Por isso Ayn Rand usou em A Revolta de Atlas o personagem do pirata escandinavo, quem John Galt condenava pelos métodos, ainda que simpático ao fim.

Não tenho dúvidas de que muitos caminhoneiros que pretendem paralisar o país são patriotas com as melhores intenções e querem evitar um destino venezuelano para o Brasil. Mas, além de questionar os métodos, perdoem-me por achar que também há muitos incomodados com a conjuntura, ponto. Inflação batendo 10% e combustível com alta de 30% no ano! O desespero bate à porta de quem tem pouco mais a perder. Eu não sabia quem era Zé Trovão até "ontem", e não tenho o perfil para adotar salvadores da Pátria. Sou cético.

Dito isso, claro que tenho simpatia pela revolta disseminada, pois ela é a de todo brasileiro trabalhador e decente. E ninguém sabe ao certo como reverter o quadro, eis o problema. O sistema dobrou a aposta. A mídia podre debocha do povo. O STF segue com prisões arbitrárias e postura política de partido de oposição. Os "liberais" passam pano para isso tudo e se aliam ao PT para derrotar o "bolsopetismo". E coisas como essa são um soco no estômago de cada patriota: o suposto financiador do mega assalto de Araçatuba, preso ontem, já foi solto, enquanto Daniel Silveira e Roberto Jefferson ainda estão presos. Esse é o retrato do Brasil de hoje, e não há como achar normal tanto absurdo.

Em essência, portanto, voltamos à pergunta básica feita por Burke: Será verdadeiro, entretanto, que o governo da França estava em uma situação que não era possível fazer-se nenhuma reforma, a tal ponto que se tornou necessário destruir imediatamente todo o edifício e fazer tábua rasa do passado, pondo no seu lugar uma construção teórica nunca antes experimentada? Se a premissa adotada for a de que não há mais qualquer condição de reforma, então o tribalismo será inevitável e uma guerra será o resultado inexorável.

Não vejo os patriotas em geral e os caminhoneiros em particular pregando utopias, mas ninguém sabe o que aconteceria ao se "implodir o sistema". Por ter dúvidas e receios já sou acusado de "liberal frouxo" por alguns. É do jogo. O clima está muito tenso mesmo, e cada vez há menos espaço para dúvidas, nuanças ou cinza. A coisa vai afunilando para uma bifurcação, para uma convulsão social, quiçá guerra civil, o que ninguém deseja.

Tenho repetido sempre: o povo é uma união de indivíduos autônomos, não de autômatos. Não tem essa de gado e robô. Isso é narrativa fajuta. Ninguém controla o tal povo. E eis o perigo! É por isso que venho alertando faz tempo para não esticarem mais a corda, mas o establishment declarou guerra a essa parte da população, não aceita a simples existência da direita na política, e prepara um golpe às claras, que contou com a soltura e elegibilidade de Lula.

Após mudança de tom de Bolsonaro, os caminhoneiros foram esvaziando a greve, e há a expectativa de mais tranquilidade agora. Mas que fique claro: o povo continua revoltado com muita coisa, e no povo ninguém manda.

Bola no campo do STF

A nota divulgada pelo presidente Bolsonaro nesta quinta gerou enorme celeuma no país. Do lado dos patriotas que foram às ruas no dia 7 para um lindo espetáculo cívico pedindo liberdade, e que estão indignados com os arbítrios supremos, houve um misto de decepção e revolta inicial. Do lado dos autoritários de esquerda, a reação inicial foi atacar Bolsonaro, chamado de frouxo, tigre de papel, rato.

Minha própria reação foi exacerbada: enxerguei fraqueza no tom excessivamente conciliatório, sugerido por Temer, e cheguei a constatar que era o fim na luta contra o arbítrio do sistema. Nos grupos de bastidores da direita, o sentimento era de frustração e revolta, além de certo desespero: "eles venceram". Mas nada como um dia após o outro...

Refletindo com mais calma sob vários ângulos, fica mais claro que jornalistas experientes como Augusto Nunes têm um ponto: Bolsonaro pode ter feito uma jogada inteligente. E cá entre nós: a esquerda já saiu da euforia acerca da "covardia" do presidente para a preocupação e até revolta com o "papelão" de Temer na possível pacificação da República. E quando a esquerda não gosta muito de algo, eu já passo a gostar mais!

Falam num acordo costurado por Temer, Ciro Nogueira e Artur Lira, que traga mais harmonia aos poderes. O inquérito ilegal das Fake News, por exemplo, seria transferido para a PGR, seu caminho legal. Entre outros pontos de recuos mútuos. Não vamos esquecer que o principal fator de revolta do lado patriótico é o ativismo de Moraes, que foi indicado ao STF pelo Temer.

Se fui precipitado e injusto em minha reação inicial - e torço muito por isso - volto atrás e assumo o erro sem problema. Nunca tive compromisso com erro. Sigo desconfiado de acordo com esse sistema, mas não sou revolucionário, e sim um liberal com viés conservador. Se houver recuo do lado de lá também, então o Brasil ganha. E meu compromisso é e sempre foi com o povo brasileiro.

A situação colocada pela greve dos caminhoneiros agravou bastante o quadro. Cheguei a criticar os métodos na véspera, alegando que poderia prejudicar o povo, os mais pobres. Tem uma turma do "vai ou racha", do "tudo ou nada", que quer ver o circo pegar fogo pois acha que o seu lado leva a melhor na guerra: esquerdistas que apostam na queda de Bolsonaro e bolsonaristas que apostam numa ruptura revolucionária de direita. Esse nunca foi meu perfil, e tentei em diversos momentos alertar para o perigo de levarem o país nessa direção. Ninguém quer uma convulsão social, uma guerra civil.

O que Bolsonaro fez foi acenar para a pacificação, e resta saber o custo dela. Paz na escravidão não serve, e se o arbítrio continuar, haverá caos certamente. Mas há uma possibilidade de mudança de postura. Afinal, Bolsonaro colocou a bola no campo do STF, demonstrou capacidade de ceder, rechaçando a narrativa midiática de que é um golpista. Ele nunca quis fechar o STF, e sim fazê-lo retornar ao seu campo, dentro das quatro linhas da Constituição.

Ninguém sabe ao certo se isso vai mesmo acontecer. Mas se os ministros mais ativistas insistirem em suas ações e falas, ficará mais escancarado ao mundo todo quem de fato acena para o golpismo. Espera-se que o tal acordo tenha sido feito de uma posição de força do presidente, com base na multidão que ele arrastou para as ruas no feriado da Independência. Os veículos de comunicação que agem como partido de oposição ficaram perdidos e sem discurso. Queriam o Bolsonaro "golpista", da ruptura.

Se houver um recuo de ambos os lados, o Brasil ganha. O sistema é forte demais, poderoso, ainda que podre. Antes da nota do presidente, gravei o podcast da Gazeta e comentei exatamente isso: ninguém pode menosprezar a resiliência dos "monstros do pântano", que estão aí desde sempre, passando por confisco do Collor, FHC, PT. São sobreviventes num ambiente hostil, controlam o jogo, são os tais donos do poder. Não se peita o sistema impunemente, e o Brasil não vai virar a Suíça num mandato de direita.

É absolutamente compreensível a angústia dos patriotas, a decepção com os recuos do presidente. Muitos foram nas ruas acreditando numa bala de prata, numa intervenção divina - ou ao menos militar. Mas uma ruptura tem enorme custo e é bem arriscada, pode lançar o país no caos e o resultado final é incerto. Poucas revoluções acabaram bem na história. Por isso o conservador é mais prudente, cauteloso, paciente. As mudanças podem vir de dentro do sistema, sem sua implosão? Ou seu estágio de putrefação já é avançado demais para isso?

Eis a dúvida. Mas quero crer na possibilidade de reformas graduais, sem mergulhar o país numa guerra civil. Se há ainda essa chance, então Bolsonaro pode ter acertado. Cabe agora ao STF devolver a bola com suavidade, ciente do risco de dar uma bicuda nela.

Se o Xerife dobrar a aposta, ele não estará confrontando apenas o presidente e milhões de brasileiros, mas Temer, Lira e Ciro Nogueira, ou seja, o establishment. Seria um tiro no pé. O caminho para seu impeachment estaria aberto. Ele tem todos os incentivos pra cumprir sua parte. Oremos!