Poucas coisas me irritam tanto quanto o tal "nossa, como você é boa!" quando eu falo de adoção.
Poucas coisas me irritam tanto quanto o tal "nossa, como você é boa!" quando eu falo de adoção. |
Há muitos anos li uma entrevista com a Astrid Fontenelle a respeito da adoção de seu filho e a resposta dela foi uma das melhores que já vi. Em resumo, ela disse que queria ser mãe e a adoção era a forma disso acontecer. Por isso ela se decidiu, se habilitou e se tornou mãe. |
Não existe beatificação e nem magia. Adoção é para os fortes. Precisa querer, e não é pouco. |
Eu poderia vir aqui dizer que todo esse papo de burocracia é construção da mídia, mas estaria mentindo. A burocracia existe sim. E o processo é demorado mesmo. Por esse e outros motivos eu sempre digo que adoção, muito mais que amor, exige vontade. |
O fato de ser burocrático não é de todo ruim. Vamos inverter um pouco o cenário pelo qual normalmente enxergamos o processo como um todo. |
Estamos acostumados a falar do lugar dos pais. Aqueles que normalmente (nem todos seguem esse fluxo!) passaram alguns anos tentando uma gestação natural, outros tantos em tratamentos de fertilização e acabaram amadurecendo a ideia da adoção. |
Por mais sofrido que sejam o processo e a espera, estamos aqui falando de adultos. Adultos em situação de normalidade. Com casa, família, emprego, laços afetivos. Enquanto eles esperam, estão seguindo a vida. |
Não quero com isso minimizar a angústia. Ela existe e, em maior ou menor grau, vai acompanhar os pretendentes à adoção pelo caminho. |
No entanto, a adoção não pode ser vista unicamente por esse prisma. O foco é outro. Partimos do lugar da criança ou adolescente. Na adoção, não buscamos filhos para pais, e sim pais para filhos. |
Estamos falando de crianças e adolescentes que de alguma forma tiveram seus direitos básicos violados e sofreram algum tipo de violência e/ou abandono. Essa foi a razão pela qual foram levados à tutela do Estado e, após avaliadas as condições da família de origem, decidiu-se pela colocação em família adotiva. |
O que precisamos dentro desse cenário? De um ambiente seguro para essas crianças. De um lugar preparado para recebê-las e acolher a realidade de cada uma. Precisamos de pais preparados. Precisamos evitar que elas voltem a sofrer violência e abandono (e aqui me refiro a todo tipo de violência e abandono). |
Por isso um processo cheio de cuidados. |
É o suficiente? 100% garantido? Não. Nunca vai ser. Mas não podemos nos escorar nessa fala para deixar de lado todo o cuidado pensado para garantir o melhor destino possível para essas crianças e adolescentes. |
E a fala que segue todo esse papo é inevitavelmente a mesma "mas demora muito..." sempre acompanhada de um exemplo próprio ou de algum conhecido que esperou ou ainda espera por muitos anos. |
Sim... a espera para os adultos é angustiante. Já imaginou a das crianças e adolescentes, que também esperam por meses, anos e alguns a vida inteira sem sucesso para terem uma família? |
É preciso vontade para começar, vontade para seguir e muita vontade para mergulhar nas reflexões que uma maternidade/paternidade adotiva trazem. |