Com o tempo, fui percebendo o quanto normalizamos situações que vivemos apenas como coadjuvantes.
Com o tempo, fui percebendo o quanto normalizamos situações que vivemos apenas como coadjuvantes. |
É fácil falar que a criança ou adolescente que veio pela adoção é filho como qualquer outro e ponto final. Nem digo que está errado. Filho é filho e, juridicamente, não se faz mesmo qualquer distinção entre os filhos levando em conta a origem da filiação. Nem mesmo a certidão de nascimento traz anotações referentes à adoção. Os dados dos pais e avós, além do nome, são alterados e é cancelada a certidão anterior. |
Mas não é cancelada a história. Essa fica. Essa nunca vai ser apagada. Faz parte do quebra-cabeça da vida daquela criança, que um dia vai crescer e merece ter conhecimento de tudo quanto for possível a seu respeito. |
O discurso de "deixe o passado para trás pois agora começamos uma nova vida" não cabe aqui. O passado precisa ser olhado, respeitado e acolhido com muito respeito. |
Tratar o filho (ou sobrinho, neto, primo... qualquer que seja o papel ocupado por essa pessoa na família) "como se fosse de sangue" não apaga o fato de que não é, de que ele tem outra história, de que ele chegou pela adoção e de que isso não só pode como deve ser falado. |
Não que precisemos prestar contas das nossas escolhas e decisões, nem tampouco usar crachás todo o tempo. Mas falar. Falar abertamente. Permitir que não só a criança/adolescente se aproprie da sua história, mas darmos também esse passo. |
Ter espaço aberto de fala, de troca. Empoderar pode parecer um termo vazio, já que tem sido utilizado sem moderação mas, sim, estamos falando de empoderamento. |
A partir do momento que temos essa conversa, essa troca, essa transparência, as coisas ficam mais leves, a vida fica mais leve, e encarar comentários e perguntas muitas vezes desconfortáveis não é mais um fardo, mas sim, de novo, espaço de esclarecimento, de quebra de tabus e preconceitos. |
Normalizamos a adoção e o pertencimento à família. Normalizamos muitas outras questões, mas cada papo a seu tempo, para que possamos deglutir um a um. |