Muito antes de decidir entender mais sobre o racismo e tudo o que permeia as relações sociais dos negros nos dias de hoje (o que, inevitavelmente, nos leva à época da escravidão e às centenas de anos que se seguiram à abolição), eu já dizia c...
Muito antes de decidir entender mais sobre o racismo e tudo o que permeia as relações sociais dos negros nos dias de hoje (o que, inevitavelmente, nos leva à época da escravidão e às centenas de anos que se seguiram à abolição), eu já dizia com frequência que o racismo que me incomodava era o não dito, o cochichado, aquele que a gente percebe em olhares e sussurros, normalmente seguidos de sorrisinhos amarelos. |
Aos poucos, fui vendo que o que me incomodava não era só eu que percebia. |
Me senti feliz por não estar completamente maluca, mas triste por abrir as portas que me levaram ao entendimento de que isso tem um nome. |
Pode ter vários, em verdade. Mas recentemente me deparei com esse, que talvez seja o que melhor expressa o comportamento social da atualidade: "racismo da cegueira de cor". |
Com ou sem nome, sigo acreditando que ele é pior que aquele racismo escancarado, falado, vomitado. Aquele que hoje quando vemos, nos sentimos (mesmo nós, não negros) ultrajados. Se o inimigo mostra a cara, conseguimos enfrentá-lo. Se ele está escondido, passamos ao papel de algozes quanto o apontamos ("racismo reverso", "mimimi"...). |
Mas vamos lá... do que exatamente estamos falando? |
"Imagina, eu não vejo diferença nenhuma! Pra mim todo mundo é igual!" |
Começa por aí. Todo mundo é igual na frase pronta, na legenda da foto. Mas não nas oportunidades. E é nesse ponto que temos o segundo efeito. Se somos todos iguais, as ações afirmativas não se justificam. Se elas não tem mais razão de ser e são suprimidas, voltamos a não mais inserir negros em lugares dos quais estiveram por séculos afastados. |
"Ah, mas eu não sou racista! Até tenho amigos negros! Estou só defendendo que todos tenham as mesmas chances! Se o negro é realmente bom, basta que ele se esforce e se saia bem! " |
Não é tão simples assim. |
Existem exceções? Se até para as Leis da Física elas são possíveis, quem dirá para relações humanas. Claro que sim! Mas o que estudos apontam é que no geral os negros seguiram marginalizados na sociedade após a famigerada abolição da escravidão. Seguiram sem oportunidades. Seguiram correndo pra tentar alcançar algo que era dia a dia afastado deles. |
E o discurso foi sendo aperfeiçoado até chegar no que temos hoje. |
"igualdade de oportunidades / somos todos iguais / não vejo cor / está tudo bem". |
Não. Não está. |
É preciso tirar essa venda, ver cor. Ver de verdade. Ver onde ela está e especialmente onde não está. Ver qual a nossa contribuição para a manutenção dessa realidade (isso também tem nome... chama SUPREMACIA BRANCA). |
É preciso sobretudo CORAGEM pra cortar da própria carne. Para admitir as vantagens que vem de brinde com uma pele branca. Para abrir mão delas. |
Não queremos tanto bater no peito e dizer que somos todos iguais? Pois que sejamos! |
É preciso parar de cochichar, de fazer piadinhas, de tentar fechar os olhos. |
O primeiro passo de uma longa jornada é o que a antecede. A decisão de trilhá-la. |
Abrir os olhos e acabar de vez com cegueira. |