A coalizão liderada pelo primeiro-ministro Naftali Bennett sofreu uma derrota significativa no Knesset, o parlamento israelense, ao não conseguir renovar uma legislação considerada fundamental a qualquer governo. Derrotado por 58 votos contrá...
A coalizão liderada pelo primeiro-ministro Naftali Bennett sofreu uma derrota significativa no Knesset, o parlamento israelense, ao não conseguir renovar uma legislação considerada fundamental a qualquer governo. Derrotado por 58 votos contrários (e apenas 52 a favor), a coalizão não conseguiu aprovar a manutenção da extensão das leis criminais e civis de Israel aos israelenses que vivem nos assentamentos judaicos na Cisjordânia, território reivindicado pelos palestinos para a constituição de seu estado. | ||
A situação é complexa e tem a ver como uma série de questões fundamentais a Israel e também aos palestinos. Como já escrevi algumas vezes, a linha a separar política interna da externa em Israel é muito tênue. Muitas vezes, inexistente. | ||
O governo Bennett precisou colocar em votação a renovação de uma lei que, desde 1967, é tratada como "medida de emergência" e, por isso, é votada a cada cinco anos. Importante lembrar que após a chamada Guerra dos Seis Dias, em 1967, Israel conquistou dois territórios que mudariam a política regional, internacional e interna de Israel: conquistou a Faixa de Gaza dos egípicios; e também a Cisjordânia - chamada por parte dos judeus de Judeia e Samária -, da Jordânia. | ||
Em 2005, Israel retirou todos os assentamentos judaicos da Faixa de Gaza, entregando o território à Autoridade Palestina (AP) - que, dois anos mais tarde, como resultado de um conflito interno palestino, acabaria expulsa de lá, dando ao grupo terrorista Hamas o controle integral do enclave, configuração que se mantém até os dias de hoje. | ||
A Cisjordânia vive situação distinta. Israel ainda administra a maior parte do território onde vivem cerca de 500 mil judeus em meio a 2,4 milhões de palestinos. A divisão detalhada entre Israel e AP ainda segue as determinações estabelecidas pelos Acordos de Oslo (1993/94) assinados entre israelenses e palestinos, e o impasse permanece até que haja novas rodadas de negociações em busca de um acordo final - está, portanto, longe de acontecer. | ||
O fato é que, sob o ponto de vista jurídico, a situação também é complexa. Na medida em que Israel não anexará o território (compromisso assumido com as monarquias do Golfo Pérsico e que levou ao estabelecimento de relações diplomáticas entre Israel e esses países no que se convencionou chamar de Acordos de Abrãao), os judeus que vivem na Cisjordânia têm acesso, por exemplo, a seguro de saúde israelense e pagam impostos a Israel graças à renovação automática da Lei de Regulação da Judeia e Samaria; a lei que foi reprovada pelo parlamento. | ||
É provável que nova votação aconteça e que a situação retorne ao status quo, mas a intenção da oposição - liderada pelo ex-primeiro-ministro Benjamin Netanyahu - era a de demonstrar a incapacidade do atual governo de continuar a administrar o país. Curiosamente, este bloco de oposição apoia ideológicamente os assentamentos judaicos na Cisjordânia. | ||
Ou seja, Netanyahu e seus aliados articularam uma votação ideologicamente desalinhada a seus interesses apenas como forma de expôr o governo. Governo este formado em boa medida por grupos que ideologicamente são contrários aos assentamentos na Cisjordânia, casos do partido Ra'am (a representação política do Movimento Islâmico em Israel) e dos partidos de esquerda Meretz e Avodá (este último a representação política do movimento trabalhista no país). Este é o retrato de um momento em que a atual coalizão se mostra bastante enfraquecida. É também um exemplo prático das complexidades e dos mecanismos do sistema parlamentarista. | ||
A sociedade israelense tem se mostrado profundamente dividida em suas escolhas eleitorais; em 23 de março de 2021, os israelenses foram às urnas pela quarta vez num período de dois anos. Até aquele momento, quatro eleições não haviam resultado na formação de governos minimamente estáveis. Caso de fato a atual coalizão liderada por Naftali Bennett não consiga se sustentar, o atual governo terá fracassado em seu projeto mais fundamental: unir por pelo menos um mandato os opositores a Netanyahu em nome do pragmatismo. O governo Bennett tomou posse em junho do ano passado. |