Eta vida besta, meu Deus.
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Eta vida besta, meu Deus.

Grosso modo, a sociedade do cansaço seria aquela que no afã de ser livre, se auto aprisionou e nada mar a dentro no oceano do positivismo.

Monalisa
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GRETE STERN, SUEÑO 15, SEM TÍTULO, 1949
GRETE STERN, SUEÑO 15, SEM TÍTULO, 1949

Esbarrei no texto do filósofo Byung-Chul Han, sobre a Sociedade do Cansaço, no final de 2020 no ápice do trabalho remoto, quando já não existia, na minha vida distinção entre a hora do trabalho e a minha hora.

Eu vou tentar explicar, brevemente, o que ele tenta nos dizer ao selecionar, comparar e analisar teorias de filósofos e psicanalistas sobre o sujeito, sua constituição psíquica e os reflexos disso na sociedade do trabalho.

Grosso modo, a sociedade do cansaço seria aquela que no afã de ser livre se auto aprisionou e nada mar a dentro no oceano do positivismo.

Ainda tá meio sem sentido?

Vou para mais uma tentativa.

Saímos de um tempo em que a sociedade se configurava num cenário de sociedade disciplinar, teoria foucaultiana que o filósofo recupera para estruturar sua afirmação.

Ele vai dizer que a “sociedade disciplinar” como teorizava Foucault é o lugar da negatividade, onde haveria limites e proibições e portando, onde habitaria o “sujeito da obediência”.

Mas, a nossa sociedade não é mais essa, segundo ele. Agora habitamos “a sociedade do desempenho” e somos portanto rebatizados de “sujeitos de desempenho e produção”.

“O sujeito de desempenho projeta a si mesmo na linha do eu-ideal, enquanto que o sujeito da obediência se submete ao superego. Submissão e projeto são dois modelos de existência bem diferentes.”.

Nós idealizamos um EU e nos tornamos "livres" para reger nosso tempo e vontade na construção desse projeto de quem dizemos ser. E para isso podemos e fazemos tudo!

Ocorreu uma grande mudança de paradigma aqui.

E nós, nos lançamos afoitos nesse oceano, parafraseando Han. E a medida que fomos nos tornando senhores do nosso tempo, nos transformamos em nossos escravos.

Tornamo-nos multitarefas e nos privamos da capacidade de contemplação.

Encurtamos distâncias, mas 24 horas passou a ser pouco para as demandas do trabalho, e sete dias da semana insuficientes para conter a semana.

E os nossos pensamentos não desaceleram, e não sabemos mais, como diz o escritor desfrutar do tédio (ócio); não sabemos celebrar a festa da vida.

Ser como as janelas que olham na cidadezinha qualquer de Drummond...

Devagar... No mero estado de contemplação.

“Um homem vai devagar.

Um cachorro vai devagar.

Um burro vai devagar.

Devagar... as janelas olham.

Eta vida besta, meu Deus.”

Eta vida besta, meu Deus! Consumidos pelo trabalho, sem viver, acordar, dormir, trabalhar... Sobreviver...

“No mundo de hoje, tudo que é divino e festivo ficou obsoleto”. Fomos feitos para contemplar o belo e mergulhar na festa. Mas, só estamos sobrevivendo cansados.


Pra ler depois:

Sociedade do Cansaço - Byung-Chul Han

Cidadezinha Qualquer - De Alguma Poesia - Carlos Drummond de Andrade