Oi, tudo bem?
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Oi, tudo bem?

Oi, tudo bem? O que eu faço com a sua mala?

Ana Gabriela Pacheco
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Oi, tudo bem? O que eu faço com a sua mala?

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Li há um tempo atrás que já afastamentos sem um adeus oficial são os mais desgastantes. Nunca houve um tchau, então a despedida fica entalada na garganta junto com todas as outras coisas pesando nas costas como um fardo e as mágoas no coração.

Falamos sobre tantas coisas, nos conhecemos por tanto tempo. Quem é você agora? Como está? Foi embora sem se despedir direito.


"Me sinto segurando a mala de alguém que falou que ia ao banheiro e nunca mais voltou"
O que eu faço com a sua mala? Eu me desfaço? Jogo no lixo há muito custo e muito sapo engolido? Eu faço uma doação? Pra quem precisa dessa bagagem, pra quem te quer na vida, pra quem vai te encontrar? 


Eu taco fogo e te esqueço como você me esqueceu quando foi ao banheiro sem se despedir?


O que eu faço com sua mala? Eu tiro o que tem dentro e avalio o que fica e o que vai? O que presta e o que é lixo? O que é memória nossa, o que é lembrança de viagem, o que roupa suja pra lavar?


O que eu faço com sua mala? Eu dou adeus e deixo ela na Rodoviária do Afastamento? 
Deixo no achados e perdidos do terminal Barra Funda? A barra tá pesada e sua mala também. Ela pesa e eu seguro com forças, com as duas mãos. E assim, fico impedida de segurar minha própria mala de mágoas e lembranças, pra segurar a sua que nunca se importou com suas coisas. Tão pouco se importava com o que era seu que pouco se importou comigo.


Que adeus foi esse? O adeus subjetivo no "Volto já", "Até amanhã" e "A gente se vê" que nunca voltou no amanhã, nem no dia seguinte e nem no seguinte a gente se viu.
Você passou a ser um desconhecido que me evita no terminal pra não ter que ajudar com a bagagem. Bagagem essa que é sua.


O que eu faço com a sua mala? Devo deixar discretamente ao lado de alguém? Devo colocar no bagageiro do ônibus quando for embora?


O que eu faço com a sua mala? Carrego comigo por onde for, me culpando por sua causa? Te arrasto pra cima e pra baixo, te levando nas costas. Você se tornou um peso, um fardo fadado a me esmagar. 


A sua mala parece maior, parece mais cheia, parece mais fria. Parece mais pesada, parece um chumbo, parece mais minha.


E eu penso em abrir, mas não quero porque ela é sua e abrir me faria lembrar de você. Mas eu abro. Abro e lembro de todas as vezes que fomos pesos um pro outro, que o que tínhamos na cabeça não saiu como planejado e o que éramos não deu certo. Nenhum plano de viagem sai como gostaríamos. Tem o dia, tem o clima, tem o hotel barato, dinheiro e rodoviária lotada no feriado.


A gente nunca se despediu dessa viagem direito. Disso que nós dois fomos. Do lugar que nós dois viemos. E você tomou um rumo diferente do meu e deixou a mala aqui.

Somos feitos de despedidas. Despedidas meia boca, pares de meia. Nécessaire necessária. Despedidas necessárias. Lavar a roupa suja esquecida. Esquecer de lavar antes de se despedir. Lembrancinhas pra grudar na geladeira. Não lembrar de ir.

Esvaziei tudo que tinha dentro, livrando peso das minhas costas, as mágoas do meu coração, liberando as minhas mãos pra novas bagagens e me despedindo de tudo que você me deixou segurando e esperando; um adeus. Sua mala tá dentro de uma caixa no armário de bagunças.

Ei, tudo bem?
O que você faz com a minha mala? 

                                                                                              Ana Gabriela Pacheco