A antiga chave
A antiga chave |
Embora o ato de abençoar pareça conflitar diretamente com as crenças de |
algumas tradições, ele também está em estreita sintonia com os |
ensinamentos dos grandes mestres espirituais do passado. Eu o apresento |
aqui porque descobri pessoalmente que ele guarda a chave das curas mais |
profundas, para o maior número de pessoas, no período de tempo mais curto. |
Os textos espirituais ocidentais que preservavam grande parte da sabedoria |
da bênção foram editados ou, em alguns casos, totalmente suprimidos. |
Atualmente, precisamos rebuscar antigas técnicas preservadas nos livros |
bíblicos “perdidos” que foram descobertos na metade do século XX. |
Curiosamente, uma das melhores descrições do poder do não julgamento |
está num dos mais controversos: o Evangelho de Tomé, que faz parte da |
Biblioteca de Nag Hammadi. |
O ponto crucial dessa parte dos Evangelhos é um registro do que Jesus dizia |
aos que ele conheceu durante sua vida. É aqui que encontramos o relato de |
uma conversa que ele teve com os discípulos a respeito dos segredos da vida, |
da morte e da imortalidade. |
Respondendo a uma pergunta sobre o que podemos esperar como destino |
final, Jesus começa oferecendo chaves para o que ele chama de “árvores” da |
nossa existência, atributos de vida que são constantes e permanentes. “Quem |
as conhecer [as árvores] não provará a morte”, [19] ele diz. Uma dessas |
chaves é a capacidade de precaver-nos contra o julgamento. |
Na elegância familiar que frequentemente encontramos na verdadeira |
sabedoria, Jesus descreve o estado de consciência neutra dizendo aos seus |
discípulos o que devem fazer para entrar no lugar de imortalidade que ele |
chama “reino”. |
Jesus diz: “Quando transformardes dois em um, e fizerdes o interior como o |
exterior, e o exterior como o interior, e o de cima igual ao de baixo, e quando |
fizerdes do masculino e do feminino uma só coisa... então entrareis no |
reino”. [20] Compreendemos imediatamente o que ele está dizendo. |
Só quando podemos ver além das diferenças que julgamos — isto é, quando |
eliminamos as polaridades que produziram a separação das coisas no |
passado — é que podemos criar para nós mesmos o estado de ser em que |
“não provaremos a morte”. Quando podemos ir além do certo e do errado, |
do bem e do mal que a vida nos mostra, encontramos a nossa maior força |
para nos tornar mais do que as coisas que nos fizeram sofrer. Embora a |
mente saiba que essas coisas podem existir num nível, é o sentimento em |
nosso coração que fala ao Campo da Mente de Deus... e cria. |
Como mestre e curador, Jesus nos mostra assim como podemos transcender |
os nossos sofrimentos por meio da sabedoria do nosso coração. Apesar de |
outros ensinamentos sugerirem técnicas semelhantes, as descritas por Jesus |
talvez sejam as mais claras e concisas. Isso talvez se deva, em parte, às lições |
que ele assimilou durante o seu aprendizado com outras tradições espirituais. |
Embora Tomé nos ofereça a essência dos ensinamentos de Jesus, as |
traduções modernas do seu evangelho nos deixam um pouco com a sensação |
de estarmos lendo no Reader’s Digest uma versão condensada de ideias que |
poderiam ser muito mais expandidas! |
Ofereço a seguir uma explicação mais desenvolvida do processo de bênção |
de Jesus, elaborada a partir de uma compilação dos seus ensinamentos e das |
pregações de outros mestres espirituais. |
As instruções |
As traduções ocidentais da Bíblia empregam simplesmente o termo |
“bendizer” ou “abençoar”, sem dizer como fazer isso ou por que a prática é |
eficaz. Talvez as referências mais conhecidas nesse contexto sejam as |
passagens em que Jesus descreve aos seus discípulos as qualidades |
espirituais que lhes serão mais proveitosas neste mundo e no outro. |
“Bendizei os que vos amaldiçoam, orai por aqueles que vos difamam.” [21] |
Por mais estranhas que essas palavras possam parecer no mundo atual em |
que é fácil confundir justiça com “revide”, só posso imaginar como era |
espantoso esse modo de pensar 2.000 anos atrás! |
Nas traduções editadas, vemos esse tema repetindo-se em graus diversos ao |
longo dos ensinamentos de Jesus. Na carta aos romanos, por exemplo, as |
instruções referentes à reação que devemos ter ao sermos hostilizados |
deixam poucas dúvidas quanto à intenção da mensagem. “Abençoai os que |
vos perseguem; abençoai e não amaldiçoeis.” [22] |
Embora muitos ensinamentos de Jesus relacionados com a bênção fossem |
oferecidos para lidar com afrontas pessoais, físicas ou verbais, a ideia de |
abençoar também se estende à angústia que sentimos por saber que outras |
pessoas estão sendo ultrajadas. |
Quando alguma coisa dolorosa nos atinge, a dor emocional pode manifestarse em três lugares. Embora um ou outro desses lugares sejam mais fáceis de |
identificar, nos três a bênção produz efeitos de grande eficácia. Esse é o |
poder da bênção: ela nos leva muito além da velha armadilha de julgar certo |
ou errado o que aconteceu. |
Talvez você se pergunte, “Por que eu abençoaria justamente as coisas que |
me fazem sofrer?” Essa é uma boa pergunta; eu a fiz para mim mesmo anos |
atrás quando descobri o poder da bênção. A resposta é clara e até |
enganosamente simples. Temos duas escolhas relacionadas com o modo de |
lidar com os sofrimentos da vida: podemos mascará-los e enterrá-los, |
deixando que aos poucos nos roubem as coisas que amamos até finalmente |
nos destruir, ou podemos aceitar a cura que vem com a aceitação das agruras |
da vida, vivendo saudáveis e revigorados. Pessoalmente, acredito que essa é |
a intenção da afirmação que encontramos no Evangelho de Tomé: “Se |
fizerdes nascer o que está dentro de vós, ele vos salvará. Se não o fizerdes, |
ele vos destruirá”. |
O desafio, bem como a recompensa, resultantes da aplicação desse princípio |
em nossa vida podem resumir-se nas palavras de São Francisco. Ele diz a |
respeito da própria existência, “Foi fácil amar a Deus em tudo o que era belo. |
As lições de um conhecimento mais profundo, porém, ensinaram-me a |
acolher Deus em todas as coisas”. Isto é, tanto as experiências desagradáveis |
quanto as prazerosas. A escolha é nossa. Se escolhemos a cura, o caminho é |
a bênção. |
Quando tomamos a decisão de abençoar, deparamo-nos com três aspectos |
ou grupos de pessoas em cada situação que pedem para ser abençoadas. |
Embora sempre possa haver exceções, de modo geral devemos abençoar os |
que sofrem, a causa do sofrimento e os que testemunham e são esquecidos. |
Descrevo cada grupo brevemente: |
Abençoar os que sofrem: Os primeiros a quem devemos dirigir a nossa |
bênção são evidentemente os que sofrem. Em alguns casos, como nas |
tragédias do 11 de setembro e de Beslan, a distância entre nós e os que estão |
sofrendo de forma atroz pode ser enorme. Em outros, como uma promessa |
quebrada ou a traição da confiança de uma pessoa amada, o sofrimento pode |
estar em nosso próprio quintal, pois somos nós que estamos sofrendo. De |
qualquer modo, essa talvez seja a parte mais fácil do processo da bênção: |
abençoar aqueles que são o objeto do sofrimento. |
Abençoar o que causa o sofrimento: Para muitas pessoas, essa é a parte mais |
difícil. Para outras, entretanto, abençoar as pessoas ou as coisas que fazem |
sofrer, que nos causam dor e tiram de nós o que mais amamos, é uma atitude |
tão em sintonia com as tradições em que fomos educados que parece quase |
uma segunda natureza. |
É nesse ponto que o poder da bênção se torna muito real. Quando o |
encontramos dentro de nós mesmos para abençoar as pessoas e as coisas que |
nos ferem, nós nos renovamos. É preciso ser uma pessoa forte para elevarse acima do certo e errado dos acontecimentos e dizer: “Hoje, sou mais do |
que o sofrimento do meu passado”. |
Conheço pessoas que me dizem: “Farei essa ‘coisa de bênção’ só uma vez, |
quando não houver ninguém por perto, porque meus amigos jamais |
entenderiam esse modo de pensar. E se eu não gostar do que acontecer, |
voltarei a sentir o ódio e a inveja que me foram úteis no passado”. |
Eu respondo: “Ótimo! Uma vez é tudo o que é preciso!” Sinto-me confiante |
em minha resposta por um único motivo. No momento — no instante — em |
que abrimos a porta para uma possibilidade maior de bênção em nossa vida, |
mudamos internamente. Há uma transformação. Nessa mudança, não |
podemos voltar atrás... e por que iríamos querer isso? Por que escolheríamos |
alimentar sentimentos que nos fazem sofrer ao longo do tempo se podemos |
nutrir os que nos curam? |
Quer tente uma vez e volte atrás — ou não — você deve levar em |
consideração todos os aspectos da experiência para que a bênção seja eficaz, |
inclusive a bênção de pessoas, lugares e coisas pelos quais você sente |
aversão e o enfurecem. |
Abençoar os que testemunham o sofrimento: Essa é a parte da bênção mais |
fácil de negligenciar. Além da relação entre os que sofrem e os que causam |
o sofrimento, há os que observam e procuram compreender o que veem. |
Somos nós! Nós que não somos atingidos precisamos reconciliar o |
assassinato de civis e de crianças inocentes em tempos de guerra, a |
brutalidade contra as mulheres em muitas sociedades e as consequências de |
relacionamentos fracassados e de lares desfeitos. |
Embora seja fácil esquecer-nos de nós mesmos diante do sofrimento alheio, |
é também a nossa reação — os sentimentos que perduram — que forma a |
mensagem que enviamos para a Mente de Deus depois de uma tragédia. |
Finalmente, é o modo como sentimos individual ou coletivamente que |
preenche o vazio na consciência depois de uma tragédia, em qualquer escala, |
desde a familiar até a global. Abençoe-nos em nosso testemunhar! |
Modelo de bênção |
A chave para receber o presente da bênção é que ela deve ser dada. |
Primeiro, encontre um lugar reservado onde ninguém possa ouvi-lo. Em |
seguida, simplesmente diga em voz alta o que segue: |
• “Eu abençoo ____________.” |
[Diga o(s) nome(s) dos que estão sofrendo ou que sofreram.] |
• “Eu abençoo ____________.” |
[Diga o(s) nome(s) de quem ou do que causou o sofrimento. Seja o mais |
específico possível.] |
• “Eu abençoo a mim mesmo como testemunha.” |