capítulo três.
capítulo três. |
O "EU" AUTOCENTRADO. |
A mente está sempre querendo alimentar-se para pensar. Ela procura alimento para sua própria |
identidade, para seu sentido de ser. É assim que o ego se cria e se recria continuamente. |
Quando você pensa ou fala a respeito de si mesmo, quando diz "eu", está se referindo a "eu e a |
minha história". Está falando do ego com seus gostos e desgostos, medos e desejos, o ego que |
nunca se satisfaz por muito tempo. Essa é a noção que a sua mente tem de você, condicionada |
pelo passado e buscando encontrar sua plenitude no futuro. |
Você se dá conta de que esse ego é fugaz e passageiro como uma onda na superfície do mar? |
Quem percebe isso? Quem compreende que sua forma física e psicológica é passageira? E o Eu |
Sou. Esse é o "eu" mais profundo, que não tem nada a ver com o passado e o futuro. |
O que restará de todos os medos e desejos associados aos problemas de sua vida e que |
diariamente exigem o máximo de sua atenção? Restará apenas seu nome gravado na lápide da sua |
sepultura e as datas ligando seu nascimento à sua morte. |
Para o "eu" autocentrado - para o ego -, esse é um pensamento deprimente. Para o que você é |
essencialmente, é libertador. |
Quando cada pensamento absorve toda a sua atenção, isso mostra que você se identifica com a |
voz que está dentro da sua cabeça. O pensamento se confunde então com o sentido do "eu". Esse |
é o "eu" criado pela mente, o que chamamos de "ego". Esse ego construído pela mente se sente |
totalmente incompleto e precário. Por isso o medo e o desejo são as emoções e forças |
dominantes e motivadoras desse ego. |
Quando você se dá conta de que existe uma voz na sua cabeça que pretende ser você e não para |
de falar, percebe que, de forma inconsciente, você vem se identificando com a corrente do |
pensamento. Quando percebe a existência dessa voz, você compreende que não é essa voz, mas a |
pessoa que a percebe. |
Ter liberdade é saber que você é a consciência por trás dessa voz. |
O ego está sempre buscando. Busca sem cessar isso ou aquilo para se sentir mais completo. Isso |
explica por que ele se preocupa compulsivamente com o futuro. |
Ao perceber que está "vivendo para o momento seguinte", você descobre que começou a |
abandonar o padrão da mente autocentra-da. Torna-se então possível escolher concentrar toda a |
sua atenção no momento presente. |
Ao concentrar toda a atenção no momento presente, uma inteligência muito superior à da mente |
autocentrada entra em sua vida. |
Ao viver através do ego, você faz do momento presente apenas um meio para atingir um fim. Você |
vive em função do futuro, mas, quando atinge seus objetivos, eles não o satisfazem - ou não o |
satisfazem por muito tempo. |
Quando você dá mais atenção ao que está fazendo do que ao resultado que quer alcançar com a |
sua ação, rompe o velho condicionamento autocentrado. Sua ação presente se torna não só muito |
mais eficaz como infinitamente mais satisfatória e gratificante. |
Quase todo ego tem um pouco do que poderíamos chamar de "identidade da vítima". Muitas |
pessoas se veem de tal forma como vítimas que essa imagem se torna o ponto central de seu ego. |
O ressentimento e a mágoa passam a ocupar uma parte essencial da visão que essas pessoas têm |
de si mesmas. |
Mesmo que suas mágoas sejam muito "justas", ao assumir a identidade da vítima, você cria uma |
prisão cujas grades são feitas de formas de pensar. Veja o que está fazendo com você mesmo, ou |
melhor: o que a sua mente está fazendo com você. Sinta a ligação emocional que você tem com |
sua história de vítima e perceba sua compulsão de pensar ou falar a respeito. Testemunhe o seu |
estado interior. Você não precisa fazer mais nada além disso. Ao perceber isso, a transformação e |
a liberdade virão. |
Reclamar e reagir são as formas preferidas da mente para fortalecer o ego. Para muitas pessoas, |
grande parte da atividade mental e emocional consiste em reclamar e reagir contra isso ou aquilo. |
Procuram fazer com que os outros ou as coisas estejam "errados" e só elas estejam "certas". |
Estando "certas", elas se sentem superiores e, assim, fortalecem o seu ego. No entanto, essas |
pessoas estão apenas fortalecendo a ilusão do ego. |
Pare um pouco e pense: você tem esses padrões de comportamento? Consegue reconhecer a voz |
em sua mente que está sempre reclamando e apontando os outros como culpados? |
O "eu" autocentrado precisa do conflito para fortalecer sua identidade. Ao lutar contra algo ou |
alguém, ele demonstra para si mesmo que isto sou "eu" e aquilo não sou "eu". |
É comum que países, tribos e religiões procurem fortalecer sua sensação de identidade coletiva |
colocando-se em oposição aos seus inimigos. Quem seriam os "crentes" se não existissem os que |
não creem? |
Ao se relacionar com as pessoas, você é capaz de perceber em si mesmo sentimentos sutis de |
superioridade ou inferioridade em relação a elas? Quando isso acontece, é o ego que está se |
manifestando, porque ele precisa da comparação para se afirmar. |
A inveja é um subproduto do ego que se sente diminuído quando algo de bom acontece com |
alguém, quando alguém possui mais, sabe mais ou tem mais poder do que ele. A identidade do |
ego depende da comparação e se alimenta do mais. Ele se agarra a qualquer coisa. Quando nada |
disso funciona, as pessoas procuram fortalecer seu ego considerando-se mais injustamente |
tratadas pela vida, mais doentes ou mais infelizes do que os outros. |
Quais são as histórias que você cria para encontrar a sua própria identidade? |
O "eu" autocentrado tem também necessidade de se opor, resistir e excluir para manter a ideia de |
separação da qual depende sua sobrevivência. Assim, ele coloca "eu" contra "os outros" e "nós" |
contra "eles". |
O ego precisa estar em conflito com alguém ou com alguma coisa. Isso explica por que, apesar de |
você querer paz, alegria e amor, não consegue suportar a paz, a alegria e o amor por muito tempo. |
Você diz que quer ser feliz, mas está viciado em ser infeliz. |
A sua infelicidade não vem dos fatos da sua vida, mas do condicionamento da sua mente. |
Você se sente culpado por algo que fez - ou deixou de fazer - no passado? Uma coisa é certa: você |
agiu de acordo com o nível de consciência ou de inconsciência que tinha na época. Se estivesse |
mais alerta, mais consciente, teria agido de outra maneira. |
A culpa é outra forma que o ego tem para criar uma identidade. Para o ego não importa que essa |
identidade seja negativa ou positiva. O que você fez ou deixou de fazer foi uma manifestação de |
inconsciência, que é natural da condição humana. Mas o ego personifica a situação e diz "Eu fiz tal |
coisa" e assim cria uma imagem de si mesmo como "ruim, falho e insuficiente". |
A História mostra que os seres humanos cometeram inúmeros atos violentos, cruéis ou |
prejudiciais contra os outros e continuam a cometê-los. Será que todos os seres humanos devem |
ser condenados? Será que são todos culpados? Ou será que esses atos são apenas expressões de |
inconsciência, um estágio no processo de evolução do qual estamos nos libertando? |
As palavras de Cristo "Perdoai-os, Senhor, pois eles não sabem o que fazem" podem ser usadas em |
relação a você. |
Se você estabelece objetivos autocentrados na sua busca de libertação e de autovalorização, |
mesmo que os atinja, eles não irão satis-fazê-lo. |
Estabeleça objetivos, sabendo porém que o mais importante não é atingi-los. Quando alguma |
coisa inesperada acontece, fica demonstrado que o momento presente - o Agora - não é apenas |
um meio para atingir um fim: cada momento do processo é importante em si. Busque seu objetivo |
valorizando cada passo da caminhada. Só assim você não se deixará dominar pela consciência |
autocentrada. |
Disse o mestre budista, quando lhe pediram para explicar o sentido mais profundo do budismo: |
"Sem o ego, não há problema". |