Das maiores alturas ao abismo mais profundo.
Das maiores alturas ao abismo mais profundo. |
Ninguém está imune aos ciclos de equilíbrio e mudança. Qualquer que seja |
o tamanho da nossa família, o número de amigos que temos, a quantidade |
de livros que escrevemos ou o sucesso que alcançamos, todos temos um |
“gatilho” que provoca mudanças em nossa vida. Curiosamente, o dispositivo |
que desencadeia o processo parece ser diferente para cada pessoa. Embora |
possamos acreditar que organizamos a nossa vida cuidadosamente como |
algo que podemos regular e controlar, cada experiência e cada |
relacionamento nos exercita e prepara o tempo todo para algo que pode estar |
além do nosso controle. |
Desse modo, aproximamo-nos cada vez mais do momento em que teremos |
a oportunidade de demonstrar o domínio sobre as nossas traições, as quebras |
de confiança e as questões mais delicadas. Entretanto, só depois de usar a |
última ferramenta espiritual de modo apropriado a criar o equilíbrio é que |
emitimos o sinal de que estamos preparados. É o nosso equilíbrio que diz, |
“Ei, estou pronto. Pode vir!” Agora estamos prontos para demonstrar ao |
universo o que aprendemos. |
Até aprendermos com a experiência, consciente ou inconscientemente, as |
nossas provações podem ser tão sutis que nem mesmo as reconhecemos |
como provações! Só quando compreendemos o que as traições e as |
promessas quebradas do passado nos mostraram é que ganhamos a sabedoria |
e as capacidades que nos permitem corrigir os padrões e avançar na vida. |
O pioneiro professor budista Lama Surya Das (Awakening the Buddha |
Within, Letting Go of the Person You Used to Be) descreve como podem |
ser intensos os momentos de sofrimento e tristeza na nossa vida. Ele diz: |
“Toda vida contém alegria e tristeza. Gostaríamos de ficar com a alegria e |
esquecer a tristeza, mas é uma habilidade espiritual muito maior usar tudo o |
que encontramos na vida como grão para o moinho do despertar”. Às vezes |
o “grão” da vida chega até nós do modo mais inesperado! |
Durante a explosão tecnológica no início dos anos 1990, Gerald (nome |
fictício) era engenheiro no Vale do Silício, Califórnia. Ele tinha duas jovens |
e lindas filhas, e estava casado com uma mulher igualmente bela havia |
aproximadamente 15 anos. Quando o conheci, sua empresa acabara de |
conceder-lhe um prêmio pelo quinto ano de exercício profissional na tarefa |
de identificar e reparar defeitos de um tipo especializado de software. Sua |
posição o tornara um bem valioso para a empresa, e a necessidade da sua |
especialidade exigia muito mais do que o habitual expediente diário de |
trabalho das 8 às 17 horas. |
Para atender à demanda das suas habilidades, Gerald começou a trabalhar |
até tarde todas as noites e nos fins de semana, e a viajar com seu software |
para feiras e exposições comerciais em outras cidades. Logo ele estava |
passando mais tempo com os colegas do que com a família. Eu podia ver a |
angústia em seus olhos ao descrever como seus familiares estavam ficando |
distantes. À noite, ao chegar em casa, sua mulher e filhas já estavam |
dormindo, e de manhã ele já estava na empresa antes que elas acordassem. |
Em pouco tempo ele começou a se sentir como um estranho em seu próprio |
lar. Sabia mais a respeito das famílias dos que trabalhavam com ele do que |
a respeito da sua própria. |
Foi quando a vida de Gerald sofreu uma reviravolta dramática. Ele me |
procurou para uma sessão de aconselhamento quando eu estava escrevendo |
um livro sobre os “espelhos” dos relacionamentos e sua atuação em nossa |
vida. Mais de 2.200 anos atrás, os autores dos Manuscritos do Mar Morto |
identificaram sete padrões específicos que podemos esperar em nossas |
interações com outras pessoas. À medida que a história de Gerald se |
desenvolvia, ficava evidente que ele estava descrevendo um desses padrões, |
que é o reflexo da vida do nosso maior medo, em geral conhecido como “A |
Noite Escura da Alma”. |
Entre os engenheiros da empresa havia uma programadora brilhante, mais |
ou menos da idade dele. Ele fora designado como parceiro dessa mulher para |
executar tarefas que às vezes duravam dias e os obrigavam a viajar para |
cidades de todo o país. Em pouco tempo, ele teve a impressão de conhecer |
melhor essa mulher do que a própria esposa. Nesse ponto da história, |
imaginei como tudo acabaria. O que eu não sabia era por que Gerald estava |
tão perturbado e o que estava para acontecer com ele. |
Sem demora, ele acreditou que estava apaixonado por sua colega de trabalho |
e tomou a decisão de abandonar a esposa e as filhas para começar uma vida |
nova com ela. Essa decisão parecia fazer sentido na época, pois eles tinham |
muita coisa em comum. Em poucas semanas, porém, sua nova parceira foi |
transferida para um projeto em Los Angeles. Em razão de alguns pequenos |
favores, e por caminhos um tanto tortuosos, Gerald conseguiu uma |
transferência para o mesmo escritório. |
Imediatamente as coisas começaram a dar errado, e Gerald achou que mais |
perdera do que ganhara. Amigos de anos, dele e da sua esposa, de repente |
começaram a distanciar-se e esquivar-se. Seus colegas achavam que ele |
estava um tanto “fora do juízo” por abandonar a posição e os projetos a que |
tanto se dedicara. Seus próprios pais estavam irritados por ele ter |
desestruturado a família. Embora sofrendo, Gerald racionalizou que esse era |
simplesmente o preço da mudança. Ele estava pronto para uma nova vida. O |
que mais podia pedir? |
É nesse ponto que entram o espelho do equilíbrio e a Noite Escura da Alma. |
No exato momento em que tudo parecia encaixar-se, Gerald descobriu que |
tudo estava na verdade desmoronando! Em poucas semanas, seu novo amor |
anunciou que a relação deles não era o que ela esperava. Ela rompeu |
repentinamente e pediu que ele fosse embora. Num estalar de dedos, ele |
estava por sua própria conta, sozinho e arrasado. “Depois de tudo o que fiz |
por ela, como ela pôde?”, lamentava. Ele abandonara a esposa, as filhas, os |
amigos e o emprego. Em resumo, havia deixado tudo o que amava. |
Quase em seguida ele começou a render menos no trabalho. Depois de várias |
advertências e uma avaliação de desempenho sofrível, seu departamento |
finalmente o dispensou. À medida que a história de Gerald prosseguia, ficou |
claro o que acontecera realmente: sua vida fora das maiores alturas, com |
todas as perspectivas de um novo relacionamento, de um novo emprego e de |
um rendimento maior, para os abismos mais profundos, enquanto todos |
esses sonhos se dissipavam. Na noite em que Gerald me procurou, ele fazia |
uma única pergunta: “O que aconteceu?” Como coisas que pareciam tão |
boas acabaram tão caóticas? |
A Noite Escura da Alma: reconhecendo o |
gatilho |
Quando o conheci, Gerald havia perdido tudo o que amava. O porquê disso |
é a chave desta história. Em vez de soltar as coisas que amava porque se |
sentia completo e estava avançando, ele fez suas escolhas apenas quando |
acreditou que havia algo melhor para ocupar o lugar delas. Em outras |
palavras, ele não se arriscou. Por causa do medo de não encontrar nada |
melhor, ele manteve fisicamente seu casamento durante muito tempo depois |
de deixar a família emocionalmente. Há uma diferença sutil, porém |
significativa, entre deixar o nosso emprego, amigos e romances porque |
estamos completos e ficar com eles por medo de que não haja mais nada |
para nós. |
Todos os tipos de relacionamento podem apresentar uma tendência para |
apegar-se ao estado atual das coisas até que algo melhor apareça. Esse apego |
pode vir da inconsciência do que estamos fazendo ou pode existir porque |
temos medo de virar a mesa e encarar a incerteza de não saber o que vem a |
seguir. Embora possa muito bem representar um padrão que define aquilo |
de que estamos inconscientes, não obstante é um padrão. Quer se trate de |
um emprego, de um romance ou do nosso estilo de vida, podemos |
surpreender-nos num padrão em que não somos felizes realmente, embora |
nunca tenhamos comunicado isso honestamente às pessoas da nossa vida. |
Assim, mesmo quando o mundo acredita que a nossa vida transcorre |
normalmente, interiormente podemos estar bradando por mudanças e |
sentindo-nos frustrados por não saber como comunicar essa necessidade às |
pessoas que nos são próximas. |
Esse é um padrão que produz negatividade. Os nossos sentimentos |
verdadeiros muitas vezes disfarçam-se como tensão, hostilidade ou às vezes |
apenas como a nossa ausência na relação. Todos os dias cumprimos as |
nossas obrigações profissionais ou compartilhamos a nossa vida e a nossa |
casa com outra pessoa, mas estamos emocionalmente distantes e em outro |
mundo. Quer o problema seja com o chefe, com alguém que amamos ou com |
nós mesmos, nós racionalizamos, transigimos e esperamos. Então, certo dia |
— bum! — acontece. Aparentemente surgindo do nada, as coisas mesmas |
que esperávamos e pelas quais ansiávamos aparecem de repente. Quando |
isso acontece, podemos atirar-nos a elas como se não houvesse amanhã. |
No caso de Gerald, quando ele se mudou para outra cidade com o seu novo |
relacionamento, deixou para trás um vazio não resolvido em que o seu |
mundo entrou em colapso. Agora, depois de perder tudo o que amava, ele |
estava sentado à minha frente com lágrimas em profusão rolando em suas |
faces. “Como posso recuperar o meu emprego e a minha família? Diga-me |
o que devo fazer!” |
Ao passar-lhe a caixa de lenços de papel que reservava numa mesa próxima |
exatamente para momentos como esse, eu disse algo que pegou Gerald |
totalmente desprevenido: “Neste momento da sua vida não trate de recuperar |
o que você perdeu”, comecei, “embora possa acontecer precisamente isso. |
O que você criou para si mesmo vai muito além do emprego e da família. |
Você despertou uma força dentro de você que pode tornar-se o seu aliado |
mais poderoso”. E continuei, “Quando tiver passado por essa experiência, |
você terá adquirido uma nova confiança que é inabalável. Você entrou num |
período da vida que os antigos conheciam e chamavam de Noite Escura da |
Alma”. |
Gerald enxugou os olhos e recostou-se na cadeira. “O que você quer dizer |
com isso, a ‘Noite Escura da Alma’?”, perguntou. “Como eu nunca ouvi |
falar nisso?” |
“A Noite Escura da Alma é um período na sua vida em que você é arrastado |
a uma situação que representa aquilo que, para você, são os seus piores |
medos”, respondi. “Um período como esse geralmente chega quando você |
menos espera, e normalmente sem avisar. O fato é”, continuei, “que você só |
pode ser levado a essa dinâmica quando o seu comando da vida sinaliza que |
você está pronto. Então, exatamente quando a vida parece perfeita, o |
equilíbrio que você alcançou é o sinal de que você está pronto para a |
mudança. O chamariz para criar a mudança será algo pelo qual você anseia |
na vida, algo a que você simplesmente não consegue resistir. De outro modo, |
você jamais daria o salto!” |
“Você quer dizer um chamariz como um novo relacionamento?”, perguntou |
Gerald. |
“Exatamente como um novo relacionamento”, repliquei. “Um |
relacionamento é o tipo de catalisador que promete que progrediremos na |
vida.” Continuando, expliquei que mesmo sabendo que somos perfeitamente |
capazes de sobreviver a quaisquer riscos que a vida coloque no nosso |
caminho, não é da nossa natureza acordar certa manhã e dizer, “Hmm... acho |
que hoje vou abandonar tudo o que prezo e amo para entrar na Noite Escura |
da Alma”. Tudo indica que não funcionamos dessa maneira. Como |
normalmente acontece, as grandes provações da nossa Noite Escura parecem |
advir quando menos as esperamos. |
Alguns anos atrás, encontrei um amigo que acabara de deixar a profissão, a |
família, os amigos e um relacionamento no seu estado natal e mudar-se para |
as regiões inóspitas do norte do Novo México. Perguntei-lhe por que havia |
deixado tudo para trás para fixar-se no isolamento do deserto. Ele começou |
dizendo que fora para as montanhas para encontrar o seu caminho espiritual. |
Logo em seguida, disse que não conseguira pôr-se a caminho porque as |
coisas não iam bem. Ele estava tendo problemas com os negócios, com a |
família e com os amigos que deixara para trás. Sua frustração era evidente. |
Eu aprendi que não existem acasos na vida e que cada obstáculo que |
enfrentamos faz parte de um padrão maior. Enquanto ouvia a história do meu |
amigo, o desejo do meu “cérebro de homem” de consertar as coisas da vida |
compeliu-me a oferecer a minha perspectiva. “Talvez este seja o seu |
caminho espiritual”, sugeri. “Talvez o modo de resolver cada problema seja |
o caminho que você veio procurar aqui.” |
Ele olhou para trás, pois estava se afastando, e disse simplesmente: “Hmm... |
talvez seja...” |
A possibilidade de que a vida nos traga exatamente o que precisamos, |
exatamente quando precisamos, faz todo sentido. Assim como não podemos |
encher uma xícara com água sem antes abrir a torneira, ter uma caixa de |
ferramentas emocional é o gatilho que dá o sinal para a torneira da vida nos |
trazer a mudança. Até liberarmos o fluxo, nada pode acontecer. O outro lado |
dessa dinâmica é que, quando nos encontramos numa Noite Escura da Alma, |
pode ser reconfortante saber que só podemos chegar a esse ponto na vida se |
nós mesmos acionarmos a chave. Conscientes disso ou não, estamos sempre |
preparados para qualquer coisa que a vida possa nos oferecer. |
Os nossos maiores medos |
O propósito da Noite Escura da Alma é levar-nos a sentir e curar os nossos |
maiores medos. O realmente interessante sobre a Noite Escura da Alma é |
que, pelo fato de os medos das pessoas serem diferentes, o que parece uma |
experiência assustadora para uma pessoa pode não ser grande coisa para |
outra. Por exemplo, Gerald admitiu que o seu maior medo era ficar sozinho. |
Na mesma noite, porém, eu havia conversado com uma mulher que me disse |
que “ficar sozinha” era a sua maior alegria. |
Não é raro que pessoas que temem ficar sós se tornem mestres em |
relacionamentos em que sentem os seus medos. Gerald, por exemplo, |
descreveu romances, amizades e empregos do seu passado que jamais teriam |
durado! Quando cada um terminava, ele acreditava que os relacionamentos |
haviam “fracassado”. Na realidade, os seus relacionamentos eram tão bemsucedidos que cada um deles lhe dava condições de ver que o seu maior |
medo de ficar sozinho passava. No entanto, como ele não se curara, ou nem |
mesmo reconhecera os padrões em sua vida antes, deparou-se com situações |
em que o seu medo se tornava cada vez menos sutil. Por fim, a vida o |
conduziu ao ponto em que o seu medo ficou tão evidente que ele precisou |
abordá-lo antes de poder continuar. |
Embora possamos passar por muitas Noites Escuras da Alma durante a nossa |
vida, a primeira é normalmente a mais penosa. Ela também é provavelmente |
o agente mais forte de mudança. Quando compreendemos por que sofremos |
tanto, a experiência começa a assumir um novo significado. Ao reconhecer |
os sinalizadores de uma Noite Escura, podemos dizer: “Aha! Eu conheço |
esse padrão! Sim senhor, é definitivamente uma Noite Escura da Alma. |
Agora, o que preciso dominar?” |
Conheço pessoas que se tornam tão fortalecidas depois que conseguem |
enfrentar as suas experiências da Noite Escura que quase desafiam o |
universo a lhes trazer a seguinte. Elas fazem isso simplesmente porque |
sabem que, se sobreviveram à primeira, podem sobreviver a qualquer coisa. |
Somente quando temos experiências assim sem compreender o que são ou |
por que passamos por elas é que ficamos presos durante anos, ou mesmo |
vidas, a um padrão que pode literalmente roubar-nos as coisas que mais |
prezamos, como a própria vida. |
É possível que sofrimentos não resolvidos possam encurtar ou mesmo pôr |
fim a uma vida? A resposta pode surpreendê-lo. |
Por que morremos? |
Você já se perguntou por que morremos? Além dos motivos óbvios como |
guerras, assassinatos, acidentes, desastres naturais e escolhas equivocadas |
de estilo de vida, qual é a causa real, natural, da morte dos seres humanos? |
Se somos, como sugerem as tradições espirituais, espíritos de Deus em |
corpos do pó da terra, e se, como acredita a ciência médica, as nossas células |
são capazes de curar e substituir a si mesmas inúmeras vezes, o que vem a |
ser realmente toda essa questão de “desgaste” do corpo? Por que as |
probabilidades de manter uma vida saudável, vigorosa e cheia de significado |
parecem voltar-se contra nós quando passamos daquela que é considerada a |
“meia-idade” e nos aproximamos da marca dos 100 anos? |
Tenho feito essa pergunta muitas vezes em seminários ao redor do mundo. |
Quando as razões listadas acima são aceitas, quase imediatamente as pessoas |
dizem que é a “velhice” que nos toma a vida. “Nós simplesmente |
envelhecemos e as coisas deixam de funcionar” é uma resposta típica que |
ouço. À primeira vista, pesquisas sobre as razões médicas da morte parecem |
corroborar essa ideia. |
Essa perspectiva pode ser resumida mais adequadamente pela primeira frase |
de um artigo da General Health Encyclopedia intitulado “Aging Changes in |
Organs, Tissues, and Cells”: “A maioria das pessoas percebe que os órgãos |
vitais começam a perder a função com a idade” [13]. Confesso que posso não |
estar entre essa maioria! Aliás, quanto mais pesquiso a constituição do nosso |
corpo e o seu funcionamento, mais me convenço de que há alguma outra |
coisa envolvida no envelhecimento — algo que não está sendo levado em |
consideração no nosso modelo médico atual. |
Mais adiante no mesmo artigo, outra afirmação abre a porta para essa |
possibilidade. O autor reconhece que as razões pelas quais o nosso corpo |
degenera à medida que envelhecemos não são inteiramente compreendidas. |
“Nenhuma teoria explica suficientemente todas as mudanças do processo de |
envelhecimento.” Em outras palavras, ainda não sabemos realmente com |
precisão por que deterioramos à medida que o tempo passa. Conquanto, com |
toda probabilidade, todos nós deixaremos este mundo em algum momento, |
é possível que estejamos superando a necessidade de envelhecer, sofrer e |
morrer pelas razões que as pessoas tradicionalmente aceitam? |
Somos milagres feitos para durar! |
Cientistas, profissionais da área médica e estudiosos concordam que o nosso |
corpo tem uma capacidade miraculosa de sustentar a vida. Dentre os |
estimados 50 trilhões ou mais de células que constituem a média dos seres |
humanos, a maioria delas tem comprovadamente a capacidade de |
autorregenerar-se e reproduzir-se muitas vezes num período de vida. Em |
outras palavras, estamos constantemente nos substituindo e reconstruindo de |
dentro para fora. |
Parece haver duas exceções ao fenômeno da reprodução celular. |
Curiosamente, essas são as células dos dois centros mais proximamente |
identificados com as qualidades espirituais que fazem de nós o que somos: |
as células do cérebro e as células do coração. Embora estudos tenham |
mostrado que as células desses órgãos podem ter a capacidade de se |
reproduzir, também parece que elas são tão resilientes que podem durar uma |
vida inteira sem precisar necessariamente se reproduzir. |
Por mais complexos que pareçamos externamente, os nossos órgãos, ossos |
e outros tecidos são em grande parte constituídos de apenas quatro |
elementos: hidrogênio, nitrogênio, oxigênio e carbono. Ironicamente, esses |
quatro elementos estão entre os materiais mais abundantes em todo o |
universo. Somos feitos literalmente da mesma matéria que compõe as |
estrelas e as galáxias. Obviamente, no que diz respeito aos componentes |
essenciais do nosso corpo, tudo indica que não há escassez de matéria prima. |
Então, do que morremos? |
Com exceção do mau uso de medicamentos e de diagnósticos equivocados, |
a maior ameaça à vida de pessoas com idade superior a 65 anos são as |
doenças cardíacas. Considero essa estatística fascinante devido à atividade |
incessante do nosso coração. A média de batimentos cardíacos diários é de |
aproximadamente 100.000, equivalente a 2.5 bilhões de vezes por ano, |
bombeando 6 litros de sangue ao longo de aproximadamente 20.000 |
quilômetros de artérias, vasos e capilares a cada 24 horas. O coração parece |
ser tão essencial para quem e o que nos tornamos na vida que é o primeiro |
órgão a formar-se no útero materno, antes mesmo do cérebro! |
Em termos de engenharia, quando o sucesso de todo um projeto depende de |
um único componente, essa peça do equipamento recebe o status de “crítica |
à missão”. No programa espacial, por exemplo, quando um veículo espacial |
descer em Marte e não houver ninguém por perto para consertar algo que se |
danificou, os engenheiros têm duas alternativas para assegurar o sucesso da |
missão: ou fabricam a peça do veículo da qual depende toda a missão — a |
peça crítica à missão — com tanta precisão que ela não possa falhar, ou |
constroem sistemas de segurança que possam assumir o controle caso |
ocorram defeitos. Às vezes eles chegam a adotar os dois procedimentos. |
Evidentemente, o órgão milagroso que leva o sangue da vida a cada célula |
do nosso corpo desenvolveu-se — por um projeto consciente ou por |
processos naturais — para ser a nossa peça de equipamento “crítica à |
missão” de maior durabilidade e mais capaz de se curar. Sempre que a perda |
de alguém que amamos é atribuída à “falha” desse órgão tão extraordinário, |
precisamos perguntar-nos o que aconteceu realmente a essa pessoa. Por que |
o primeiro órgão a se desenvolver no corpo de alguém, e um órgão que |
trabalha de modo tão impressionante durante tanto tempo, com células tão |
resistentes que não precisam sequer reproduzir-se, simplesmente para de |
funcionar depois de apenas algumas décadas? Isso não faz sentido, a menos |
que exista outro fator que não tenhamos levado em conta. |
A medicina moderna costuma atribuir as doenças cardíacas a um conjunto |
de fatores físicos e relacionados ao estilo de vida que variam desde o |
colesterol e a alimentação até toxinas do ambiente e stress. Conquanto esses |
fatores possam ser acurados num nível puramente químico, eles pouco |
contribuem para a análise da razão “por que” até mesmo existem. O que |
significa realmente “falha do coração”? |
Talvez não seja coincidência que todos os fatores do estilo de vida |
relacionados com a falência do coração também estejam ligados a uma força |
invisível que tradições espirituais antigas descrevem como a linguagem |
poderosa que fala ao próprio universo: a emoção humana. Existe alguma |
coisa que sentimos no decorrer da nossa vida que, para alguns de nós, pode |
levar à falência catastrófica do órgão mais importante do corpo? |
O sofrimento que mata |
A resposta à pergunta — o que põe fim à vida? — pode parecer |
surpreendente. Um corpo crescente de evidências, produzido por |
pesquisadores de vanguarda, sugere que a própria vida pode levar à falência |
do corpo! Especificamente, emoções negativas não resolvidas — nossas |
mágoas — têm o poder de criar as condições físicas que conhecemos como |
doenças cardiovasculares: tensão, inflamação, pressão alta e obstrução das |
artérias. Essa relação corpo-mente foi documentada recentemente num |
estudo decisivo realizado na Duke University sob a coordenação de James |
Blumenthal. |
[14] Ele identificou experiências prolongadas de medo, frustração, ansiedade |
e desilusão como exemplos de emoções negativas exacerbadas que são |
destrutivas para o coração e põem em risco a nossa vida. Cada uma delas faz |
parte de um guarda-chuva maior que identificamos comumente como |
“sofrimento”. |
Outros estudos dão suporte a essa relação. O terapeuta Tim Laurence, |
fundador do Hoffman Institute, na Inglaterra, descreve o impacto potencial |
do nosso fracasso para curar e perdoar o que ele chama de “velhas feridas e |
decepções”. |
“No mínimo”, diz Laurence, “ele o afasta da boa saúde”. [15] Ele comprova |
essa afirmação citando inúmeros estudos que mostram, como o de |
Blumenthal, que condições físicas de raiva e tensão podem levar a |
problemas que incluem pressão alta, dores de cabeça, imunidade baixa, |
problemas estomacais e, finalmente, ataques cardíacos. |
O estudo de Blumenthal mostrou que ensinar as pessoas a “moderar” sua |
resposta emocional às situações da vida pode impedir ataques cardíacos. É |
esse exatamente o ponto de cura do nosso sofrimento! As forças não físicas |
das coisas que nos fazem sofrer criam efeitos físicos que literalmente têm o |
poder de nos prejudicar — ou mesmo de levar-nos à morte. |
Obviamente, esse estudo, ao lado de outros, não está sugerindo que ter |
emoções negativas breves seja ruim ou doentio. Quando temos esses |
sentimentos, eles são indicadores — medidores pessoais — que nos dizem |
que aconteceu algo que pede nossa atenção e cura. Somente quando |
ignoramos essas emoções e elas persistem durante meses, anos ou toda uma |
vida sem solução, é que podem se tornar um problema. |
A resposta à pergunta “por que morremos?” poderia ser que, devido à dor |
dos desencantos da vida, nós nos lesamos a ponto de morrer? Comentando |
essa possibilidade, o estudo de Blumenthal sugere: “Quando as pessoas |
falam em morrer de tristeza, talvez elas estejam realmente dizendo que |
reações emocionais intensas à perda e à desilusão podem causar um ataque |
cardíaco fatal”. Na linguagem do seu tempo, as antigas tradições sugerem |
precisamente essa possibilidade. |