Os efeitos da pandemia na temporada europeia 20/21 e os horizontes que estão por vir. Está tudo de cabeça para baixo.
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Os efeitos da pandemia na temporada europeia 20/21 e os horizontes que estão por vir. Está tudo de cabeça para baixo.

A primeira temporada europeia realizada integralmente durante uma pandemia foi finalizada no último fim de semana. Mesmo depois de um tempo de adaptação ao novo cenário, que chegou com tudo na metade da temporada passada, os clubes, as federa...

André Moraes
7 min
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A primeira temporada europeia realizada integralmente durante uma pandemia foi finalizada no último fim de semana. Mesmo depois de um tempo de adaptação ao novo cenário, que chegou com tudo na metade da temporada passada, os clubes, as federações e os torcedores sentiram o impacto. É inegável. Se até médicos, epidemiologistas e outros especialistas da área da saúde, que passam uma vida inteira pesquisando sobre micro organismos, ficaram rodeados de incertezas, a sociedade, de forma geral, não passaria impune. Estamos diante da fragilidade do capital. Quando algo novo e tão feroz surge, sabe-se lá de onde, pedaços de papel com tinta não valerão para amenizar a situação, seja no processo de salvar vidas, seja na disputa esportiva. E, por conseguinte, as falhas são expostas. Falhas humanas no convívio com o todo, falhas dos governantes nas políticas públicas e falhas de organização dos clubes. O "normal" foi observado apenas na Inglaterra e na Alemanha, que contam com os times detentores dos projetos mais sólidos e mais qualificados quanto às comissões técnicas. As equipes antes hegemônicas e que não foram campeãs na esfera nacional provavelmente passarão por um processo de reformulação de elenco. 

A começar pelos impactos gerais, a crise afetou primeiro o bolso. Estima-se que as instituições reduziram em 25% a arrecadação média. Os programas de sócio torcedor perderam muitos assinantes, a fonte de bilheteria simplesmente deixou de existir e as cotas de TV reduziram consideravelmente de valor. Com isso, o poder de contratação caiu, muitas instituições não conseguiram manter a folha salarial cheia e foram obrigadas a negociar nomes importantes, fora os casos de times menores que fecharam as portas. O surto do vírus foi também mais uma causa de desfalques, em algumas ocasiões tirando times inteiros durante contaminação geral, em outros tirando apenas um ou outro jogador que poderia fazer a diferença em momentos chave, como ocorreu com Verrati nas quartas de final da Liga dos Campeões. Ademais, houve relatos de jogadores que, mesmo depois de um longo período livre do vírus, sofriam consequências como perda de boa parte da capacidade pulmonar. Éverton Ribeiro, do Flamengo, foi um dos que se encaixou em tal cenário. Por último, e nada menos importante, a ausência de público. Na hora do "onze contra onze", esse é o fator que faz mais diferença, para o bem e para o mal. A pressão do torcedor é mais poderosa do que imaginamos, capaz de garantir vitórias, derrubar técnicos, fabricar ídolos, potencializar rivalidades e acentuar crises. Nunca teremos a noção exata do impacto dessa carência durante, aproximadamente, um ano e meio de bola rolando. Acreditem se quiser, o mundo do futebol poderia estar totalmente diferente caso a torcida estivesse presente em físico, não apenas em coração e mente.

Já que o futebol francês foi citado, tentemos responder ao grande questionamento: Como o Paris Saint Germain não foi campeão francês? Por mais que a Europa quase inteira esteja permeada por disparidades, na França, tal aspecto é ainda mais evidente. Traduzindo: o time de Paris não tinha direito de ficar em segundo. A obrigação é ser campeão ainda no primeiro turno. O declínio da equipe, no entanto, começou na temporada passada. O problema de elenco parece ser crônico. O ataque é um leão. A zaga e as laterais, um gatinho muito fofo. Porém, a gênese da questão está no trabalho anterior. Tomas Tuchel, que está se saindo muito bem no Chelsea, não fazia um bom trabalho na equipe francesa. A Champions League 20/21, integralmente atípica, enganou muita gente. O time estava apontando sérios problemas, mas, apoiado nos jogos únicos e aos trancos e barrancos, chegou à primeira final da competição de sua história. Não estava tudo bem, mas o time era finalista. Afinal, quem vai ser o doido que demitirá o técnico logo após isso? Dito e feito, não o fizeram. A nova temporada começou, o time não engrenou e a ideia mágica veio. O comando técnico foi trocado enquanto o trem estava em andamento. Existem trabalhos de meio de temporada que são bem sucedidos, mas não são a regra. Normalmente, eles dão largada 500 metros depois daqueles que começaram no início. Mauricio Pochettino é um grande treinador. Com alguns ajustes pontuais no elenco e com o tempo devido, é bem provável que evolua o PSG e coloque a equipe em proeminência continental. Isso, caso ele permaneça. No dia de produção desse texto, surgiram algumas especulações para atrapalhar a vida do autor.

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Na Península Ibérica, mais especificamente na Espanha, as coisas andaram diferentes. Como foi analisado aqui no Portal, a "Era Real - Barça", a níveis mundiais, acabou. Agora, nenhum dos dois ser campeão nacional é algo diferente. O último título do Atlético de Madrid havia sido no ano de 2013, quando Simeone estava fervendo, no auge da sua melhor fase. Depois de 6 anos, não é mais a mesma coisa. O Cholo não tem mais o mesmo vigor, assim como seu time. O estilo reativo dá mostras de falta de repertório e atualização. Diante disso, a realidade é dura. As falhas da dupla de gigantes, no que se refere à responsabilidade pelo título colchonero, foram mais significativas do que os méritos da equipe campeã. O Barcelona atravessa um dos momentos mais duros, em questões financeiras, da sua história recente. Reflexos da péssima gestão anterior e da dita cuja que é o tema da coluna presente, a pandemia. O elenco é recheado de peças desgastadas - a exemplo de Pique e Sergi Roberto - e insuficientes - Lenglet, Braithwait, Dest -. Por outro lado, os horizontes da gestão Laporta são animadores. Conseguiu fazer contratações eficientes à custo baixo, além de contar com muitos jovens promissores. Ronald Koeman começou mal, sem a definição exata do estilo que queria imprimir, mas, com o tempo, evoluiu. Faltaram constância e espiríto vencedor, sobretudo na reta final da La Liga, mas aposto na continuidade do trabalho. No Real Madrid, sinais de revolução. A saída de Zidane, Sergio Ramos e Marcelo, as más atuações de Varane e a passagem pífia de Hazard são indícios de mudança em uma equipe que foi tão vencedora a ponto de expelir seu prazo de validade. Erros de leitura tática em momentos cruciais, como no jogo de volta das semis contra o Chelsea, problemas relacionais internos, entre jogadores e jogadores e técnico, o pragmatismo exacerbado, que não dava espaço à imprevisibilidade em campo, e a sensação de "já deu" foram fatores que impediram o merengues de levantar uma taça sequer, fato que não ocorria desde 2009.

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Na Itália, lugar de tantos times gigantes, é difícil falar em zebras. A Velha Senhora, tão hegemônica na história recente, cometeu muitos erros desde o início. O principal deles, sem dúvida, foi a efetivação de Pirlo na equipe principal. No patamar de competitividade e investimento que a instituição atingiu, não havia espaços para testes. Ainda em formação tática, o ex-craque, ao que parece, foi escolhido "no susto", após a demissão de Sarri. Um time que investiu na contratação de um principais jogadores da história, com uma decepção recente na Champions League e com a missão de todo ano de defender a supremacia na Serie A, deveria investir em técnicos que estão em outra prateleira. Definitavemente, contando com o cenário que estava se desenhando, a incógnita não deveria ter vez. Andrea Pirlo ainda não havia nem mesmo completado sua formação como técnico profissional quando lhe foi confiada a missão. Por outra vertente, o grandíssimo Antonio Comte, que deve fazer uma visitinha a Madrid logo menos, demonstrou mais uma vez ser um dos melhores treineiros do mundo na atualidade. Apesar da queda precoce na principal competição de clubes do mundo, o time de Lukaku, Lautaro e Perisic fez lembrar a Inter de tempos remotos, que cavava seu lugar sempre nas cabeças. Olha ela aí de novo: a pandemia. Depois dessa temporada promissora, Antônio bateu asas e voou. Foi, no mínimo, surpreendente. Para fechar o balanço financeiro do ano, a Inter de Milão terá que vender jogadores do time titular e o nível de competitividade exigido pelo italiano não combina com essas transações. 

Entre trancos e barrancos, com mais surpresas do que resultados esperados, os campeonatos nacionais no Velho Continente chegaram ao fim, faltando apenas a finalíssima entre Chelsea e Manchester City. O futuro promete trazer ventos melhores. Times com a parte tática mais apurada, como Nagelsmann no Bayern, Comte no Real Madrid e Allegri na Juve, seres humanos voltando a embelezar os estádios e, consequentemente, receitas voltando a aumentar. 

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