11 de setembro e a selfie
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11 de setembro e a selfie

A falta de noção dos que tiram selfies com caras e bocas num local que milhares de pessoas foram mortas em Nova Iorque

Eduardo Barão09/12/2021
3 min
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" A ignorância é uma espécie de benção. Se você não sabe, não existe dor." a frase de autoria do eterno Beatle, John Lennon, sempre vem a minha cabeça quando vou ao World Trade Center, na parte sul da ilha aqui em Nova Iorque.

Nos últimos dias, fui ao local onde estavam as Torres Gêmeas várias vezes preparando reportagens que foram ao ar na Band por ocasião da data dos 20 anos dos ataques terroristas que mudaram o mundo. Entrevistei parentes e amigos das vítimas, sobreviventes, autoridades e até o arquiteto que projetou todo o novo complexo que, com êxito, integrou a área melhor à cidade do que os edfícios originais.

One World Trade Center no dia 11 de setembro de 2021
One World Trade Center no dia 11 de setembro de 2021

Todas as vezes que passo na área sinto um clima pesado, é um lugar que evito ir ao máximo. Quando algum amigo pede para fazer "turismo" na região, eu levo, mas fico distante. Nova Iorque tem incontáveis atrações, talvez seja a cidade com mais espaços "turistáveis" no mundo, ao lado de Paris. Museus, restaurantes, Central Park, lojas, estátua da Liberdade, estádios e ginásios. Mas tem muita gente que acha "legal" ir ao local onde 2606 pessoas foram mortas no fatídico 11 de setembro de 2001.

Respeito, mas na minha memória ainda seguem claras as imagens da dor e do desespero daquelas pessoas que estavam simplesmente trabalhando no quente  verão daqui. Estavam seguindo a rotina de um outro novo dia, sem saber que seria o último da vida delas. Admiro quem tem forças para entrar no memorial e no museu e ver de perto todo o acervo reminscente do horror daquele dia em que terroristas da Al-Quaeda, comandados por Osama bin Laden, destruíram sonhos e futuros com aviões sequestrados. Carteiras, restos de documentos, objetos pessoais e até as estruturas da base que sobraram dos prédios originais estão expostos.

Nas entrevistas ouvi de todos que o exercício de manter a tragédia viva na memória é a melhor forma de fazer com que ela nunca mais se repita. Ao longo desses 20 anos, cerimônias foram repetidas em todos os dias 11 de setembro. Momento de enorme emoção, dor, choro que deixa o mais frio e insensível ser humano abalado.

Por isso, não me conformo de ver repetidas vezes cenas ao lado do Ground Zero que me soam como uma verdadeira afronta a memória das vítimas, parentes, amigos e até do bom senso. Turistas de diferentes nacionalidades fazendo selfies, caras e bocas, beijinhos e sorrisos, brincando, dançando para Tik Tok ou qualquer outra espécie de lembrança que será postada numa rede social da vida.  É a maior falta de noção e desprezo com o próximo.Se

Selfie com ou sem biquinho?
Selfie com ou sem biquinho?

Claro, ninguém precisa sentir a mesma emoção ou dor das vítimas ou sobreviventes quando estão no WTC. Nem mesmo achar o espaço pesadíssimo, como eu acho, quando tenho de fazer reportagem na área. Sei também que alguns turistas nem vivos estavam no dia dos ataques. Mas ao visitar o espaço das Torres Gêmeas, o memorial do Holocausto em Berlin, o campo de concentração de Auschwitz ou o Museu do Apartheid em Joanesburgo, é esperado ter o mínimo de noção. Nenhuma ignorância ou desconhecimento podem ser usados para justificar tamanho desprezo com a história.

Não sou tão velho, ainda. Não tenho nada contra selfie, Tik Tok, bicos de pato nas fotos. Admito que não sei fazer pose e não fico bem nem de perfil. Mas de uma coisa tenho certeza; nesses lugares, ninguém, nem a pessoa mais fotogênica do mundo, sai bem na foto.

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