O maior desafio da vida adulta.
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O maior desafio da vida adulta.

Ontem à tarde, enquanto viajava em possíveis temas para esta carta, eu me fiz uma pergunta: qual é o meu maior desafio? Ou melhor, qual o maior desafio da vida adulta?

Vinícius Borges
4 min
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Ontem à tarde, enquanto viajava em possíveis temas para esta carta, eu me fiz uma pergunta: qual é o meu maior desafio? Ou melhor, qual o maior desafio da vida adulta?

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Quando criança, afogado no próprio choro após uma briga com meus pais, lembro-me de regar meus pensamentos com uma dose de ansiedade: “não vejo a hora de crescer e ser adulto”.

Ali eu alimentava aquela utopia clichê que provavelmente você já teve um dia: um mundo maravilhoso onde você não precisaria dar justificativas a ninguém (cof, cof), teria liberdade para fazer o que quisesse (risos) e poderia comprar todos doces que tivessem na prateleira.

Só que nesse caminho, pisando em falso nas nuvens que infelizmente não são de algodão, percebi que a maturidade, por trás de todas vagas liberdades, traz consigo algumas amarras — e uma delas a que julgo ser nosso maior desafio: a permanência, a solidez.

A infância amplia nosso cérebro e apresenta um novo mundo, a adolescência estica nossos ossos e nos revela experiências intensas. Tudo é rápido, forte e inconsequente. Você desce cortando o vento em uma montanha-russa de eventos que nem precisam se conectar. As coisas só precisam acontecer.

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Num dia você aprende a escrever uma palavra, no outro você muda de escola, de cidade, se forma, se apaixona, se isso, se aquilo… faz, assiste, fala, escuta, pula, grita, fuma, briga, chora, beija. AAAHH!

O balão da euforia sobe alto, toca o céu, avança mais um pouco, incendeia, explode e… então você cai. Despenca no chão com um celta, boletos e alguns certificados no bolso. Bem-vindo à vida adulta.

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Aqui as mudanças de roteiro acontecem no mesmo cenário, geralmente com os mesmos personagens e mudando apenas os coadjuvantes.

Não é que a vida fique monótona, sem brilho e os desafios sumam, não é isso. É que você se torna mais resistente às surpresas comparado com a sua versão de 10 anos atrás.

Você dividirá a cama com a mesma pessoa até o fim da vida, repetirá as mesmas instruções no mesmo trabalho por 30 anos e, se tiver muita sorte, manterá os mesmos 5 amigos até o fim.

Você dará início a um projeto e precisará ficar longos meses — provavelmente anos — testando ideias e repetindo processos até que as coisas deem certo e digam que foi sorte.

Esse é nosso desafio, querido leitor, abraçar a previsibilidade e entender que agora, nossa missão é aperfeiçoar, e não inovar.

  • O  “bom dia” para a pessoa que você ama, hoje pode ser demonstrado de outra forma: que tal preparar um café da manhã de hotel pra ela?
  • Na viagem de final de ano você pode  para uma nova cidade ao invés de repetir o mesmo roteiro de sempre;
  • O que acha de testar um novo método de estudo para a prova que você se prepara há anos?

Perceba que todas mudanças e novidades ainda assim são feitas dentro de uma linha de compromisso?

Sorte de hoje: o sol não resolveu inovar e ir para outra galáxia abandonando seu compromisso por aqui.
Sorte de hoje: o sol não resolveu inovar e ir para outra galáxia abandonando seu compromisso por aqui.

Você não inova no seu relacionamento traindo sua esposa com uma garota de programa — pelo menos espero que você não faça isso — você inova dando um beijo mais demorado, fazendo um elogio inesperado ou simplesmente dizendo o que você já havia esquecido de dizer.

A vida do adulto consiste em inovar com responsabilidade, em entender que agora, depois de muito caminhar, também há muito a se perder.

O adulto assume riscos, compromissos e enfrenta a repetição.

Bebe o mesmo café pela manhã, repete o mesmo trabalho até dar certo e frequentemente escuta as mesmas músicas da sua banda favorita.

É isso que fazemos: entendemos que toda construção sólida exige repetição. Tijolos iguais precisam ser colocados lado a lado para construir um castelo, e isso não se faz da noite para o dia.

Quando apresentarem a você um banquete de novidades empacotado em corpos mais bonitos, dinheiro fácil e prazeres de quem só se vive uma vez, questione: 

Essa novidade é um aperfeiçoamento ou uma fuga do seu grando desafio: a permanência, a solidez?

Tenha uma ótima semana, querido leitor.

Um abraço,

Vinícius Borges.