Vocês se aliaram ao Demônio para derrotar o Diabo.
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Vocês se aliaram ao Demônio para derrotar o Diabo.

Vocês se aliaram ao Demônio para derrotar o Diabo

Jean Marcel Duarte
7 min
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Vocês se aliaram ao Demônio para derrotar o Diabo

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O fato de Lula ter sido eleito Presidente da República pela terceira vez, por incrível que pareça, não foi o pior elemento das eleições presidenciais de 2022. Para justificar o seu voto, milhões de pessoas, mesmo tendo outras opções de voto, preferiram “se aliar ao Demônio para derrotar o Diabo”, e este fato é um grande indício de que a nossa educação moral falhou.

É muito desagradável ler um texto acusatório, pois, ele rompe com a equidade intelectual que estamos habituados e hierarquizar a relação colocando o leitor na posição de réu. Entretanto, o desconforto que esse tipo de leitura causa é necessário para podermos refletir sobre o nosso comportamento e assim aperfeiçoá-lo. A análise de outras consciências formadas em outros microcosmos é necessária para reformarmos a nossa conduta.

Sabemos que declarar o seu voto em Bolsonaro ou Lula não pega bem, por isso, alguns escondem suas preferências (esse, pelo menos, tem vergonha na cara), enquanto outros tentam justificar o injustificável. Um pseudoargumento comumente utilizado é o, “mas os outros presidenciáveis não tinham chance de ganhar”. Após enunciada esta proposição, fica a pergunta: a probabilidade de um candidato vencer uma eleição é o fator mais importante na hora de decidir em quem devemos votar? A reposta é óbvia: não! Nem no futebol torcemos por um clube pela sua probabilidade de vencer um campeonato, torcemos porque aquele clube representa “algo de valor” para nós. Espera-se que exista uma afinidade moral entre o cidadão e o seu representante escolhido, afinal, não é uma decisão inteligente escolher um candidato que não representa os seus princípios e valores para ser o seu representante político, e você que escolheu um desses dois presidenciáveis é um cidadão inteligente, não é? Como quase ninguém quer se aliar moralmente ao Demônio, muitos tentam justificar o seu voto no Diabo através do tão falado “voto útil” ou também conhecido como “mal menor”. Esta “argumentação negativa” (escolho “X” como meu candidato, pois gosto menos de “Y”) é tudo o que a nossa democracia não precisa. Este argumento faz com que nivelemos a política por baixo e que com o passar das eleições a competência, o nível moral e intelectual dos candidatos diminua, chegando ao ponto de termos dois presidenciáveis imorais e incompetentes disputando a cadeira de Presidente da República no segundo turno das eleições. Consequentemente, nenhum destes argumentos é sólido o suficiente para justificar o voto em qualquer um dos, até então, candidatos.

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A falta de critérios claros e objetivos fez com que vocês que escolheram entre Lula e Bolsonaro compactuassem com o negacionismo cientifico; com o ataque a democracia e com o preconceito contra as minorias. E não interessa em qual candidato vocês votaram, pois todas essas imoralidades podem ser atribuídas aos dois lados: Lula, negou a ciência quando colocou o Estado como o principal promotor de desenvolvimento social e quando lutou para desarmar a sociedade civil; Bolsonaro, o fez quando foi contra as vacinas e quando desarmonizou as instituições democráticas. Bolsonaro, atacou a democracia quando criou uma tensão entre os três poderes e comprou parte do legislativo através do “Orçamento Secreto” e com a troca de cargos em seus ministérios por apoio político; Lula, o fez quando comprou o voto de alguns parlamentares (Mensalão) e com troca de votos por cargos em seus ministérios. Bolsonaro, fez várias declarações indigestas a respeito das minorias; mas, Lula também fez, ou esquecemos que ele disse que Pelotas é uma cidade exportadora de “veado”? Esquecemos também das “mulheres de grelo duro”? Dito isto, eu pergunto: com o que é o compromisso de vocês, caros eleitores de corruptos? Se fossem com as ideias de Justiça; Ética e Equidade, vocês não deveriam ter escolhido nenhum deles, pois eles já se demostraram ser o oposto de desses princípios. Vocês podem não ser “culpados”, mas são “responsáveis” por esta guerra política que está assolando o Brasil, pois o voto de vocês alimentou a dicotomia política e inflamou a discórdia. Se mesmo nessas circunstancias horríveis vocês não votaram nulo, o que podemos entender; que vocês defendem a corrupção moral, política e econômica perpetrada por Lula e Bolsonaro? Ou que vocês não têm repertório político suficiente para tomar a decisão certa neste momento? Ambas as opções têm a mesma origem; a crise moral em que vive a nossa sociedade, pois mesmo na segunda opção, onde o cidadão não detém do arcabouço intelectual que a opção exige, ele deveria saber que não devemos nos aliar ao autoritarismo, ao negacionismo e a corrupção, dito isto, fica claro que a crítica central deste texto não é política, é moral.

Votar nulo não é sinônimo isenção ou de indecisão, nem de covardia ou de inação. Votar nulo é uma ação positiva. É a afirmação de princípios e valores sólidos. É não se render ante a pressão popular para aceitar aquilo que é “aparentemente” certo. É a convicção de que não devemos colaborar com mal algum por menor que ele seja, pois o mal sempre será mal. Eles apelaram para o nosso emocional, pois sabiam que um julgamento racional, por mais simples que fosse, dissuadiria o cidadão não militante de votar neles.

A certeza é a maior inimiga de qualquer democracia! Lembremos o que aconteceu com o filósofo Sócrates (470 a.C.-399 a.C) na Atenas clássica. Sócrates recebeu uma profecia do oráculo de Delfos que dizia que ele, Sócrates, era o homem mais sábio do mundo. Para confirmar tal afirmação, Sócrates deveria visitar todos os que tinham fama de sábios; e assim ele o fez. Durante as visitas que Sócrates realizou aos poetas e aos artesãos de Atenas, ele constatou que eles realmente sabiam muito sobre suas artes, mas justamente por isto, também se julgavam sábios em outras artes que não as suas. Foi neste momento que ele percebeu que a profecia era verdadeira: Sócrates não sabia muitas coisas que aqueles sábios sabiam, mas ele sabia a coisa mais importante que existe para ser sabida; enquanto aqueles homens achavam saberem tudo, mesmo não sabendo, Sócrates sabia que não sabia... Parece que as coisas não mudaram muito dos tempos de Sócrates até os nossos.

É na humildade socrática que devemos basear o nosso voto. Essa humildade fará com que duvidemos inclusive de nossas próprias crenças, que procuremos a verdade independente do lado em que ela esteja. Este ceticismo metodológico fará com que sejamos honestos em nossa procura... como falta honestidade nas investigações políticas hoje em dia. O cidadão que sabe suas limitações intelectuais e morais tende a fazer escolhas mais acertadas que aquele que acha que sabe o que não sabe. As crenças mais profundas que temos compõem o nosso eu, por isto, quando elas são “atacadas” também nos sentimos atacados, e quando nos sentimos atacados, reagimos, por conseguinte, a posição cética é mais segura para a democracia. Somente a razão pode nos fazer enxergar que existem similares entre dois candidatos repugnantes e que os mesmos motivos que me fazem não votar em “X” também me faze não votar em “Y”; as emoções não têm este poder. Poderíamos ter mostrado força e determinação ao rejeitarmos o mal na sua integralidade. Poderíamos ter sinalizado para os próximos políticos o que aceitamos e o que não aceitamos (bom... isso fizemos, pois mostramos que o nosso nível de exigência intelectual e moral é baixíssimo). Poderíamos ter assumido o controle de nossa democracia, mas o Brasil decidiu escolher o seu “malvado favorito”, e por isso falhamos.