O melhor em mim
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O melhor em mim

Risada solta, brincadeiras e como sempre, das nossas histórias emergem alguma reflexão...

Merielle Souza
5 min
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Risada solta, brincadeiras e como sempre - das nossas histórias tiramos alguma reflexão...

- Mas a Meri tem uma autoestima muito boa - uma delas destacou.

- Isso é verdade! Desde quando a gente se conhece que ela é assim - a outra afirmou.

- E é pra ser assim mesmo! Isso é bom, não é ruim não. - essa falou com firmeza.

Eu... ri, mas continuei calada.

Vi que esses comentários não provocavam um "conta como faz pra ser assim". Estavam apenas afirmando,  com a convicção de ser um bom exemplo, uma inspiração.

Mas dentro de mim...

Isso reverberou, me fez lembrar dos momentos que a autoestima se quer fazia parte do meu vocabulário.

Então voltei a ser aquela menina de 11 anos, que apesar de tão nova já desenvolvia um corpo de mulher.  

E como uma boa adolescente, fazia comparações.

Então...

Meus seios são muito volumosos, meu rosto tem marcas de espinha, meu cabelo é muito sem graça, minhas pernas são muito finas, não sei porque meu buchinho se destaca tanto - eu mal como. E esse bico? Pra quê esses dentes tão pra frente?

Não bastava me olhar no espelho, precisava de mais um espelho para conferir minhas insatisfações quanto a minha imagem.

Mas a menina criada pela avó, era querida e bem alinhada...

Sente-se erguida, caminhe direito, postura ereta e não esqueça: "Comporte-se!"

Assim, sempre elogiada. Mérito meu? Não. Mérito da mamãe, com certeza.

Quem sou se mostrava quando me soltava nas minhas aventuras. Voltava com as meias calças rasgadas e isso me rendia muitas broncas e reclamações da mamãe.

Valia a pena, era muito bom sentir a adrenalina das loucuras que me metia.

Apesar de ser tão tagarela, minhas incertezas e medos eram só meus, não compartilhava com ninguém, tinha o meu próprio lema: 'Se ninguém sabe, ninguém usa isso para me agredir. Por isso, até o lema era segredo. Impronunciável. Deixa só no pensamento. Nem o eco vai me trair.

Desconfiada? Insegura, isso sim.

... E quanto mais me cobrava, mais essa insegurança aumentava.

Recebia expressões de carinho, menções gratuitas sobre a boa impressão que tinham de mim, por isso comecei a deixar de ser tão autocrítica e passei a me olhar com mais tolerância.

Calma...

Do jeito que estou falando parece que nunca fui criticada. As críticas eram diárias, eu não era do tipo princesa, minha personalidade indomável, teimosa e impulsiva, provocavam algumas intrigas.

Ainda na adolescência...

Convivi com pessoas que tinham uma boa autoestima, como Benê - Imagina Benedita - uma serelepe, com seu estilo e personalidade -única e seus próprios passinhos para os rits do momento. 

- Benê, que dança é essa?

- Não sei! É assim que eu quero dançar. 

E tudo certo. Escutava a música e se soltava. 

Costumo dizer que cada pessoa que trouxe luz às minhas sombras foram como anjos, usados ​​para dissipar essas trevas.

Como uma senhora que conheci, em nossa conversa questionou porque eu queria fazer a redução das mamas...

- Elas são enormes. Queria me livrar dos sutiãs.

- Minha querida, tudo isso é modinha. Hoje a moda é ter 'peitinho', amanhã a mesma moda vai dizer pra ter 'peitão' e você já terá os seus.

Certíssima! Poucos anos depois, foi um 'coloca peito' danado. E eu... Já tinha os meus.

Num outro dia...

Estava almoçando com a minha família e alguns amigos...

Do nada, o garoto que estava na minha frente, filho da minha amiga, fala...

- Você tem os lábios muito bonitos. Eles são bem desenhados.

- Nossa! Não esperava por essa. Obrigada. - Respondi. Enquanto, por dentro, lembrava que a protuberância deles era um dos meus desconfortos.

-Você não tem noção do quanto possui uma boca bonita.

-Do jeito que você está falando, tenho mesmo não. 

E assim, seguiram-se outros episódios que me fizeram ter mais carinho comigo.

Ah! Tem um deles que não posso deixar de contar...

Numa manhã de domingo, fui com uma amiga ouvir a ministração de um pastor do Mato Grosso que estava aqui em Maceió.

Ela - negra. bonita e gordinha. Foi ao banheiro. Estranhei o tanto que demorou a voltar. Mas foquei na mensagem que estava sendo ministrada e esqueci dela.

Do nada, vem ela... passando em frente ao palco - era o único jeito de voltar para o seu lugar -  desfilando, segura, sentou-se ao meu lado, numa boa. 

Minha cara... Assustada!

Desde o início desse percurso, quando a vi com uma baita mancha molhada na roupa.

-O que foi que aconteceu contigo?

- O banheiro é muito pequeno e essa roupa que estou não ajuda - inventei de tirar a blusa pra me arrumar melhor, na agonia ela caiu no chão, pra completar o chão estava molhado.

- E você veio numa segurança tão grande que acho que ninguém mais viu.

- Só você que estava com esse olhar assustado.

- Não é pra menos.

-  Não mesmo. Tá perdoada.

- Como você conseguiu isso? Desfocar a atenção do povo da sua blusa toda molhada?

- Meri, eu não tinha como esconder. Só me restava essa opção - vestir a blusa com essa marca molhada. Daí pensei: vou sair de cabeça erguida e tranquila. 

-Funcionou! Quem olhou só viu você, o molhado da blusa se tornou insignificante.

-Isso mesmo. O foco sou eu, não a blusa. Preste atenção, não é sobre as pessoas, é sobre você.  

Tá aí uma pessoa que me ensinou muito sobre autoestima. Gorda, pobre, negra, carregada por uma história de vida difícil.

Hoje, não sei por onde ela anda... Mas imagino que caminhe com a cabeça erguida, esbanjando alegria e beleza por onde chega.

Mesmo que sua blusa caia, mesmo que sua roupa fique manchada por algumas lágrimas, ou algum preconceito besta tente ofendê-la.

Então...

Essa autoestima não esteve aqui sempre. Ela não chegou pela aparência. Mas conseguiu me convencer de que sou o bastante para caminharmos juntas.

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