Coisas de Meri
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Vida em ciclos
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Vida em ciclos

Aprendi que somos feitos por vários ciclos. Alguns... precisamos passar sozinhos. Outros... alguns chegam para caminhar junto. Uns chegam e ficam, outros passam, outros saem e outros voltam a fazer parte. Uns... mesmo distantes serão presentes, outr

Merielle Souza
7 min
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Hora de encarar uma das coisas que eu mais temia... conversar sobre essa condição com minha família e com as pessoas que fazem parte da minha vida.

Celular toca, atendo... 

- Amiga, como você está? Fiquei sabendo hoje. Preciso te encontrar. Quero ver você! Não adianta falar que está bem. Mas a gente sabe que vai ficar tudo bem. Você já superou tanta coisa, viada. É só mais uma prova e você vai vencer. Nega, tu sabe que estamos juntas, não sabe? E já percebeu que não estou sabendo o que dizer, só sei que tudo vai passar e vai ficar tudo bem. Você vai ver!

Percebi que só então... Grazi teve coragem de contar para Bruna. Compreensível. Eu, nem consegui.

- Eu sei, amiga. Sabia o quanto iria impactar você, por isso não consegui te ligar. Falei pra Grazi porque pensei que ela encontraria uma boa hora para contar. E pela demora da sua resposta, percebi que ela estava querendo poupar você disso. Entendo. Estou bem. Vai dar tudo certo, sim. Já está dando.

- Você devia ter me contatado na mesma hora, Meriellen! - Ela me chama assim, quando quer chamar minha atenção.

- Devia não. Eu não estava em condições de fazer isso.

- Eu imagino, amiga. É de ficar sem chão. Mas Deus está junto, surpreendendo, cuidando, vai ser mais uma vitória pra gente comemorar, como sempre... agora, para de me enrolar, Meriellen! Eu quero ver você, olhar sua cara e ver como está. 

Bruna é como uma irmã. Nos conhecemos na Universidade. Aparentemente não víamos nada em comum, ao ponto de sermos se quer 'coleguinhas'. O desafio de trabalhar o dia inteiro e a noite conquistarmos a graduação em Análise de Sistemas nos fizeram unir forças, tanto para enfrentar o cansaço e os percalços dessa jornada, quanto o machismo e algumas provocações por sermos 'meninas na tecnologia'.

Nossa amizade se desenvolveu com cumplicidade e consciência sobre nossas personalidades e gostos distintos. Com confiança e lealdade.

Depois que colamos grau ficamos um bom período sem nos comunicarmos. Bruna seguiu sua nova vida - casada. Enquanto eu - começava a ter dúvidas sobre continuar casada.

Casei quando tinha dezoito anos, fui mãe aos dezenove. Quando comecei a universidade, meu filho - Isaque - estava com 11 anos.

-Mãinha, você precisa mesmo ir para a faculdade?

-Preciso sim, amor.

- Não seria melhor ficar o resto do dia juntos?

-Seria sim, amor. Como eu gostaria. Mas preciso seguir essa etapa da minha vida. Parei quando você estava menor, mas hoje, já está grandinho, vai entender a importância disso e vai se inspirar a lutar por isso também. Vê só... Vai passar rapidinho.

E assim, enquanto meu coração apertava por abrir mão de bons momentos a mais com o meu filho, me fortalecia em ser exemplo disso pra ele.

Sempre que Bruna me encontrava com Isaque, se impressionava e destacava:

- Tem certeza que é teu filho? Vocês parecem irmãos.

Depois de uns cinco anos sem contato com Bruna, nos reencontramos. Bastou cinco horas, uma garrafa de vinho seco e duas cervejas, pra "Atualizações realizadas com sucesso!"

Compartilhamos sobre nossos divórcios, rimos das resenhas que vivemos na universidade, dos desacertos que enfrentamos e comemoramos por estar juntas novamente.

Há um ano desse reencontro... e tínhamos uma a outra para ajudar a superar nossas últimas adversidades e nos fortalecer diante dos novos desafios.

Agora... ela e Grazi - estão comigo. Amo!

Se Bruna queria fazer a prova do "olho no olho" para garantir como eu estava, imagina mamãe - minha avó materna que me criou.

Que repete destemidamente:

-Contem-me tudo! Não me escondam nada! Eu aguento. Sou forte!

O hábito que muitos têm de poupar uma senhorinha por seus 85 anos não funciona com a Dona Rita.

Quando a vejo receber uma má notícia... Vejo seus olhos baixarem, seus ombros desabarem, a mão segurar a testa... mas num respirar profundo parece resgatar a fé em seu peito, então ela apenas repete:

-Ainda mais essa, meu Deus.

E aí, segue com perguntas, tira dúvidas, reflete, preocupa-se. Mas... se fortaleça ao lembrar que já passou por tanta coisa nessa vida, mas está aqui, conosco. Nossa pequenininha, tão teimosa, tão viva.

Já na casa da mamãe, com alguns tios e primos, pude responder sobre como tudo estava se conduzindo e como estava me sentindo.

Muito bom receber todo zelo, carinho e força que persistia mesmo com as testas franzidas pela preocupação comigo.

No olhar do meu tio eu via a indagação:

- Por que isso contigo, Meri? Logo com você?

Ousei em responder:

-Estamos todos sujeitos a isso e outras coisas más... estamos nesse mundo. Enfrentaremos aflições, medo, dificuldades... o bom é que estamos juntos,  tenho vocês comigo.

-Estamos sim.

-Não vou morrer agora.

Continuamos rindo e brincando... deixando as preocupações embaixo dos risos, desbancamos os medos e posicionamos a fé. Sentimos o "haja o que houver" não teríamos dúvidas de que Deus estaria conosco... cuidando.

Recebi todo carinho, força e amor de mãinha, do meu padrasto, dos meus irmãos e do meu pai.

Sabemos que não há quilômetros que distanciem o amor, tive todo zelo e carinho mesmo daqueles  que não estavam tão perto.

Exceto...

- Meri, estou a caminho. Vou passar uns dias contigo.

-OK.

Quando peguei a louca no aeroporto...

- Vim passar o tempo que for preciso - cuidando de você!

-Amiga, está tudo fluindo bem.

-Meri, Meri... te conheço! Quero garantir que você vai se priorizar e fazer tudo o que precisa ser feito.

-Sih, está tudo sendo feito.

-Tudo bem. Estou aqui só pra garantir.

Conheci Simone um ano antes desse cenário começar. Sua família decidiu morar um ano aqui em Maceió, e como Mamis brinca: Vieram só pra me encontrar. Para minha felicidade, que ganhei a mãe de Simone de presente, agora a Mamis também é minha. Suas mensagens diárias fortaleciam e alegravam meus dias, como até hoje o faz.

Então...

Simone ficou um mês morando comigo e Isaque. Aprendemos muito juntas, discutimos, rimos e descobrimos que ser irmãs é o ouro da amizade.

Quando sozinha, chorava muito - de felicidade. Me alegrava em sentir o quanto valeu a pena acreditar em cada pessoa que estava comigo.

-Agora é hora de você ser cuidada. - Simone repetia.

Lembro que na adolescência tentei me isolar, me esquivar de socializar e interagir com muita gente. Não queria me ferir com amizades, vi outras pessoas próximas a mim sofrerem com isso. Queria me proteger.

Me desarmei quando percebi que não conseguia fugir disso e o quanto o propósito era maior  que eu .

Compreendi que partilhar o que aprendia, acreditava e vivia, me ajudava a construir melhor a minha jornada.

Cada pessoa que conhecia, cada situação inusitada que encarava, cada história de vida, tanta gente incrível. Mesmo que outras sejam 'difíceis'... nessa vida somos aprendizes. 

Aprendi que somos feitos por vários ciclos.

Alguns... precisamos passar sozinhos. Outros... alguns chegam pra caminhar juntos.

Uns chegam e ficam, outros passam, outros saem e outros voltam a fazer parte.

Uns... mesmo distantes serão presentes. Outros serão presentes quando quiserem e o poderem ser.

O que importa é sabermos quem somos - um para o outro.

Sem a obrigação de 'ter que fazer algo', sem o forçar a 'estar junto', sem pressão para o 'dar'... Cada um livre para ser e fazer de acordo com o que sente em seu próprio coração.

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