Antes de qualquer coisa, o texto não se trata objetivamente do último lance do jogo entre Flamengo e Vasco da Gama, válido pelo Carioca. Trata-se, porém, de uma análise pessoal sobre um período de cegueira condicionada de parcela da geração a...
Antes de qualquer coisa, o texto não se trata, objetivamente, do último lance do jogo entre Flamengo e Vasco da Gama, válido pelo Carioca. Trata-se, porém, de uma reflexão mais profunda. Faço uma análise pessoal sobre o período de cegueira condicionada de parcela da geração atual. | ||
Vivemos em um período onde a prática dos verbos “questionar e debater” tornou-se ato de heroísmo. As redes sociais trouxeram, inegavelmente, inúmeros benefícios à sociedade, como agilidade, encurtamento de distâncias e democratização do acesso à informação. Contudo, o debate público se transformou, infelizmente, um ponto interditado na personificação de figuras detentoras da grande verdade. Essas são, na maior parte dos casos, personalidades seguidas virtualmente por milhares de pessoas. | ||
Seja na política, na economia, no futebol - ou em qualquer área da vida - o debate foi encurtado. A internet possibilitou que os influenciadores, dotados de um ar superior jamais visto, afirmassem o que é certo e o que é errado. E ponto final. Sem margem à discussão. | ||
A título de exemplo, usarei a partida do último domingo (6), entre Flamengo e Vasco, válido pelo Campeonato Carioca. No último lance do jogo, a bola parecia ter resvalado no braço do atleta João Gomes, da equipe rubro-negra, e consequentemente o pênalti deveria ter sido assinalado. O árbitro, porém, decidiu encerrar a partida e o VAR sequer foi chamado. Insufladas pelo término do clássico, as redes sociais serviram como um ringue de “arrobas” (@) munidas da verdade absoluta já certificada por iluminados-influenciadores. | ||
Por um lado, torcedores do Vasco afirmavam categoricamente - com base em uma imagem disponibilizada - que havia sido pênalti. No outro, torcedores do Flamengo publicaram outras imagens em que a bola teria batido no rosto do volante rubro-negro. O que era para ser uma discussão e um debate, tornou-se um palanque de verdades irredutíveis por parte de personalidades da internet. | ||
Duas pessoas influentes do novo mundo, o mundo contemporâneo e digital, afirmaram que "não era pênalti"e "quem não viu que pegou na cabeça estava cego". E ponto final. O debate estava interditado. Como fiéis seguidores de uma seita, os arrobas (@) acatavam a afirmação dos influenciadores e a discussão acabara. Tal qual um exército a cumprir ordens do chefe supremo. | ||
Imediatamente, ao perceber tamanha alienação, decidi me retrair. Incrédulo, percebi que o debate havia sido finalizado por uma suposta verdade absoluta. Uma cegueira condicionada. Quem ousasse questionar, estaria rebatendo um influenciador. Ora, quem ousaria? Afinal, os influenciadores de hoje ocupam o status de detentores da verdade suprema. | ||
A história apresenta, de aspectos completamente distintos e similares, o grave problema em não questionar. A falta de senso crítico é um fator preponderante para arruinar civilizações. Seja no futebol - ou na política - questione. Ainda que seja um ato de heroísmo, tendo em vista que a pressão social impede você de minimamente questionar, tenha coragem. | ||
Como apontou o filósofo francês Michel Foucault, "para ser verdade ela precisa ser livre. Ela não pode estar vinculada a uma institucionalização porque, desta forma, a verdade será manipulada." | ||
Isto posto, o texto torna-se uma mera forma de reflexão sobre os tempos (sombrios) atuais, onde a verdade foi definida por um grupo - hoje munido de interesses como todo ser-humano - detentor de números. Os milhares (ou milhões) de seguidores servem como escudo para uma imposição da verdade absoluta. E ponto final. | ||
Você que estiver lendo: não deixe de questionar. Não deixe de criticar. A liberdade irrestrita passa por sua iniciativa de se manter, pelo menos com o pensamento livre, de amarras sociais. | ||
------------------------------------------------------------------------ | ||
Gostou do texto? Você pode me seguir nas redes sociais (@farahjotape) e curtir minha página sobre futebol brasileiro no Instagram (@bola.cast) |