Busque sua carta de alforria
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Busque sua carta de alforria

Frederick Douglass nasceu por volta de 1818 em Talbot County, Maryland, fruto de um estupro de um senhor de escravos com uma de suas amas. Foi afastado de sua mãe escrava e criado por sua avó materna. Aos 6 anos, iniciou com os trabalhos forç...

Danilo Reis
8 min
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Frederick Douglass nasceu por volta de 1818 em Talbot County, Maryland, fruto de um estupro de um senhor de escravos com uma de suas amas. Foi afastado de sua mãe escrava e criado por sua avó materna. Aos 6 anos, iniciou com os trabalhos forçados e passou a viver nas plantações de Wye House com outros escravos. Desde cedo, Douglass muito curioso, despertou o interesse na leitura e aprendeu o alfabeto com a esposa de seu senhor. Douglass foi extremamente castigado por sua ousadia e passou a sofrer punições como chicotadas, frio e fome. Quanto mais era proibido de ter acesso a este novo mundo, Douglass mais tinha interesse em conhecê-lo. O que de tão especial tinha nisso que ele não poderia ter acesso? Com sua constante inquietude pelo conhecimento, Frederick foi proibido de ler. Ele começou a estudar escondido, como autodidata. Ele observava como as crianças brancas liam e tentava imitá-las. Olhava os senhores e os capatazes escrevendo e fazia exatamente os mesmos rabiscos, para então, entender o que significava. Foi nesse momento que Douglass passou a entender o que significava as palavras escravidão e abolição. Em sua adolescência, Douglass passou a se desenvolver na leitura e ensinar outros escravos a ler e escrever usando uma bíblia. Ele organizou secretamente uma escola para ensinar outros escravos, os quais se reuniam secretamente. Seu senhor, ao descobrir a audácia do então escravo, o enviou para outro homem, Edward Covey, um fazendeiro conhecido por seu tratamento brutal, que passou a açoitar diariamente Douglass, deixando-o sem alimento por vários dias. Douglass reuniu novamente os escravos e organizou outra escola. Passou a organizar fugas com o objetivo de chegar à Pensilvânia, um dos estados livres. Porém, a cada tentativa mal sucedida, a retaliação era a pior possível. Frederick estava fraco, mas sua esperança em conhecer a tal desejada liberdade o fez tentar novamente. Até que, em 1838, sua vida começou a mudar.

Aos 20 anos de idade, Frederick Douglass, após tentar comprar sua liberdade sem sucesso, ganhou de um marinheiro negro e livre seus documentos, o que usou para falsificar sua identidade e conseguir embarcar rumo à Nova Iorque em um barco a vapor e chegando a um refúgio abolicionista organizado por David Ruggles. Enfim, teve seu primeiro contato com a liberdade. Foi seu contato com Ruggles que despertou Douglass para a defesa da liberdade. Douglass passou então a discursar em igrejas, contando como conseguiu fugir e destacando a importância da liberdade e do abolicionismo. Segundo ele, “o conhecimento é o caminho da escravidão para a liberdade”. A cada dia mais envolvido com o movimento abolicionista, Douglass lança sua autobiografia intitulada “A Narrativa da Vida de Frederick Douglass, um Escravo Americano”, que se tornou um best-seller em pouquíssimo tempo. Sua escrita e oratória eram extremamente envolventes e Douglass conseguia facilmente influenciar multidões com suas palavras. Quem assistia seus discursos ou lia seus textos, nunca imaginaria que este era um homem que se auto alfabetizou e que nunca teve nenhum tipo de educação formal. Douglass aprendeu tudo que sabia com a vida e com sua vontade de ser alguém melhor. Ele sabia que seu destino não era ser um escravo e que este não deveria ser o destino de ninguém. Em uma época em que muitos defendiam que negros deveriam ser escravizados porque eram intelectualmente incapazes e inferiores, Douglass se tornou o orador mais respeitado do país, convidado para palestrar por diversos estados. Frederick Douglass ficou tão conhecido que precisou fugir de seu país para que não o escravizassem novamente e só retornou quando uma campanha foi feita para pagar sua alforria. Frederick Douglass é considerado um dos maiores defensores da liberdade e diversas estátuas suas estão espalhadas por todo o território americano, inclusive no capitólio. Em um famoso discurso sobre o que os Estados Unidos deviam fazer em relação ao povo negro, Frederick Douglass disse: “Não façam nada! [...] Foram suas ações que nos causaram danos. [...] Se o negro não pode andar com as próprias pernas, deixe-o cair. [...] Tudo que eu peço, nos deem uma chance de andar com as nossas próprias pernas. Nos deixem em paz!”.

A história de vida de Frederick Douglass, extremamente resumida em dois parágrafos acima, é incrível. Mais incrível ainda é o fato de um homem que nasceu na pior condição em que um ser humano possa ter nascido, conseguir se tornar uma das figuras mais influentes de um país repleto de intelectuais com acesso às melhores universidade. Ao proferir a frase em que diz que o conhecimento é o caminho da escravidão a liberdade, Frederick vai além da escravidão que presenciamos em nossos livros de história. Ela se trata de todo o tipo de escravidão. Nossa cultura perpetuou o ensino sendo passado de pais para filhos, de professores para alunos, do mais velho para o mais novo. Sempre visualizamos a passagem de conhecimento como algum tipo de herança que, necessariamente deverá ser passada de uma a outra pessoa. E isso é verdade, para que o conhecimento se prolifere, ele precisa ser passado por uma pessoa que detenha este conhecimento e esteja disponível para passá-lo e outra pessoa que não detenha deste conhecimento e tenha interesse em absorvê-lo. Isso é o princípio básico para que este conhecimento seja disseminado. A grande questão é que nos limitamos a pouquíssimas fontes de conhecimento. O problema não está no processo, mas na pouca incidência deste processo em nossas vidas, principalmente quando este vem de outras fontes. Ficamos presos ao ensino vindo de professores nas escolas e universidades, do conhecimento vindo de nossos pais, avós, parente, amigos e de um ou outro líder ou ídolo. No final, resumimos nosso conhecimento a algumas dezenas de pessoas desde nossa infância ao início da fase adulta. Pioramos ainda nossas fontes, quando desta dezena que influencia nossa absorção de conhecimento, a grande parte tem o mesmo viés educacional, político, econômico e de temas em geral. Quando aprendemos com muitas pessoas que falam a mesma coisa, muito dificilmente nos desafiaremos a procurar novos assuntos. Imagine se Frederick Douglass aprendesse a ler com seus senhores de escravos e capatazes? Ele seria condicionado a entender que sua posição de vida era a escravidão e que deveria seguir por este caminho. Porém, o acesso ao conhecimento diverso e a assuntos que fugiam de sua atual posição, transformaram-no em algo totalmente diferente do que podia se imaginar naquela época. Frederick usou o autodesenvolvimento da maneira mais perfeita possível e conseguiu inverter a ordem natural do mundo em que vivia.

Hoje, muito diferente de Douglass (para a nossa sorte), temos um acesso infindável ao conhecimento. Desde o surgimento da internet, temos acesso a uma gama de informações com uma facilidade incrível. Para a nossa sorte também, pelo menos em nosso país, os casos de escravidão são extremamente raros, ou pelo menos achamos que são. A pior escravidão que podemos ter é a escravidão do conhecimento. É buscamos nos informar das fontes que reproduzem exatamente o que queremos ouvir. É buscar temas que já temos conhecimento ou assuntos que concordamos e que nos deixam presos à bola de neve do viés da confirmação. Acreditamos que nossa retórica será fortalecida por estudarmos argumentos que concordamos, sem deixar espaço para conhecer outros pontos de vista de forma imparcial. Em paralelo a isso, achamos que nosso conhecimento adquirido em nossas escolas, universidades e cursos são a verdade universal e suficientes para nos formar como excelentes profissionais. Entramos no mundo do conformismo e paramos de nos desenvolver. Nos tornamos um Frederick Douglass que aprendeu a capinar, mas não aprendeu a ler. Aprendemos o que nos foi indicado e nos contentamos com isso. Buscamos justificativas para mantermos nesse nosso estado estagnado de conhecimento e não tentamos ir atrás de novas fontes. Permanecemos presos ao que nos foi ensinado e temos a falsa sensação que já temos o suficiente. Hoje, num mundo tecnológico que avançar numa velocidade incrível, um mero diploma se torna mais um pedaço de papel. No momento em que estamos aqui estagnados, existe milhares de chineses, norte-americanos, japoneses e até brasileiros devorando milhões de conteúdos que irão ampliar a sua zona de conhecimento e percepção da realidade. Estão escalonando em nível máximo a liberdade de suas mentes, enquanto estamos aqui esperando quem será o próximo campeão do BBB. Em um mundo em movimento como o atual, quem não está decolando, não está parado, está em queda livre. Não se contente com o pouco conhecimento que você já tem, nem com o ponto de vista em que você está preso. Se coloque a prova e vá atrás do novo. Ao invés de um mero diploma, busque sua carta de alforria.

Uma semana MEGA produtiva a todos! Vamos pra cima!