Dia 77 (31 de outubro) - O Transtorno Dismórfico do Brasil
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Dia 77 (31 de outubro) - O Transtorno Dismórfico do Brasil

De acordo com o Brazilian Journal of Psychiatry, o Transtorno Dismórfico Corporal é uma variação do Transtorno Obsessivo Compulsivo, o famoso TOC. Em bom português, o Transtorno Dismórfico Corporal (TDC) é um transtorno mental que se caracter...

Diogo Machado
6 min
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De acordo com o Brazilian Journal of Psychiatry, o Transtorno Dismórfico Corporal é uma variação do Transtorno Obsessivo Compulsivo, o famoso TOC. Em bom português, o Transtorno Dismórfico Corporal (TDC) é um transtorno mental que se caracteriza por afetar a percepção que o paciente tem da própria imagem corporal, levando-o a ter preocupações irracionais sobre defeitos em alguma parte de seu corpo (por exemplo: nariz torto, olhos desalinhados, imperfeições na pele etc).

Preocupado com a percepção lunática de alguns brasileiros e com a distorcida veiculação dos fatos ocorridos nos últimos dias pela imprensa nacional, hoje falarei sobre isso.

Gostaria muito de estar aqui falando a respeito do alívio que tem sido, para muitos brasileiros, a vitória de Lula sobre esse lunático. Poderia estar analisando o discurso da vitória do petista (ainda farei isso)... Infelizmente, entretanto, falo aqui dessa sociopatia que estamos presenciando desde o domingo à noite.

Antes de qualquer coisa, é preciso ressaltar que a vitória de Lula foi gigante!

Apesar das sucessivas tentativas de destruição de seu eu político, o candidato petista ressurgiu para alcançar mais uma vitória e, literalmente, salvar a democracia brasileira. O feito é realmente histórico! 

No dia seguinte à derrota de Jair Bolsonaro, o Real registrou forte valorização frente ao dólar e a bolsa de valores apresentou alta. Isso representa, na prática, a confiança dos investidores internacionais no país, pois entrará um governo que respeita contratos e toma decisões racionais. Acabarão as crises políticas provocadas por entrevistas sensacionalistas no cercadinho do Planalto.

Alguns dirão a vocês: ahhh, mas as ações da Petrobras e do BB caíram!

A queda dessas ações ocorreu simplesmente porque especuladores, que haviam comprado à espera de uma possível privatização, retiraram seus investimentos para especular em outras opções. Não é um movimento estruturante.

Lula foi parabenizado, logo após o resultado oficial, pelos mais importantes parceiros estratégicos do Brasil. O presidente da Argentina, Alberto Fernández, não só foi o primeiro a felicitar o Presidente eleito, mas também veio ao Brasil no dia de ontem para reafirmar a centralidade do Brasil para a integração regional e de seu presidente eleito, como centro gravitacional político de liderança para a América Latina. Joe Biden, Emmanuel Macron, Xi Jinping e muitos outros chefes de Estado rapidamente parabenizaram Lula.

É sintomático, também, que dois chefes de Estado de países que vivem uma guerra de escala sem precedentes no século XXI, Rússia e Ucrânia, se apressaram para ressaltar a importância do Brasil para sua política externa.

A imprensa internacional também reconheceu o feito histórico do petista. Os principais jornais do mundo evidenciaram a vitória de Lula como ponto de retomada do protagonismo brasileiro para o principal desafio global de nosso tempo: as mudanças climáticas. Sabe-se, lá fora, que sem o Brasil e o controle efetivo do desmatamento de nossos biomas, especialmente da Amazônia, os esforços de redução de emissão de gases de efeito estufa serão infrutíferos. Já estamos vivenciando um revés devido à guerra na Ucrânia. Sem o efetivo esforço do Brasil, o caminho seria ainda mais tortuoso.

Ativistas do mundo todo, como as bandas de rock Pearl Jam e Rage Against the Machine e o ator Leonardo DiCaprio, também celebraram a vitória do petista.

No Brasil, entretanto, parece haver uma percepção errônea dessa vitória. Em primeiro lugar, boa parte daqueles que votaram em Lula não tem dimensão do papel que cumpriram para o futuro do Brasil. A história, evidentemente, necessita de distância temporal para esclarecer isso de forma metodológica, embora tenhamos evidências suficientemente fortes de que a escalada autoritária estava em curso. Nossa imprensa, para variar, não consegue se posicionar de forma coerente e ainda trata a vitória do petista como algo trivial.

Não, não foi nada trivial. Lula venceu a Lava Jato e sua tentativa esdrúxula de o destruir politicamente, condenando-o sem provas, com o apoio da própria imprensa e da mesma parcela da sociedade que, hoje, votou em Bolsonaro e está pedindo um GOLPE DE ESTADO. 

A verdade é que essa vitória do petista veio com quatro anos de atraso, como bem afirmou Reinaldo Azevedo no domingo à noite. Quando foi injustamente condenado pelo TRF-4 e preso, no fatídico 7 de abril de 2018, Lula liderava todas as pesquisas de intenção de voto para a presidência, com folga. Cumpriu a injusta pena e, ainda que pudesse sair condicionalmente, não aceitou se submeter à humilhação de uma tornozeleira.

Ao contrário do que afirma, de modo simplista e desonesto, o covarde Ciro Gomes, Lula é sim inocente. Mais do que ser absolvido pela justiça, Lula teve seus processos invalidados por vícios de origem gravíssimos, como a suspeição do Juiz que o julgou.

Em 2022, o candidato do PT (que não é comunista) venceu o presidente em exercício com mais de 60 milhões de votos, um recorde histórico. Foi a primeira derrota de um presidente brasileiro buscando a reeleição desde a redemocratização, o que simboliza o veto da maioria da sociedade à necropolítica bolsonarista. Lula venceu a máquina pública a serviço de seu oponente. Irei sempre ressaltar, caro leitor, a inconstitucionalidade e imoralidade da PEC dos precatórios, do limite da cobrança de ICMS dos combustíveis e da PEC dos auxílios. Foram bilhões gastos de forma irresponsável e abjeta, sem contar nos outros bilhões desprendidos com o orçamento secreto.

Não é por acaso, pois, que grandes jornais do mundo, como o Al Jazeera, qualificaram o petista como uma fênix (ser mitológico que ressurge das próprias cinzas). A força política de Lula é, sim, uma lenda!

Para além da imprensa, parte do eleitorado bolsonarista segue no delírio coletivo criado por Jair Bolsonaro e seus asseclas. Caminhoneiros e donos de transportadoras, impulsionados pelo inconstitucional auxílio-caminhoneiro dado pelo atual presidente, bloquearam o tráfego em rodovias federais de diversos estados da nação. Circula nas redes um vídeo no qual uma suposta liderança afirma que o movimento continuará até o feriado, quando “o povo irá em peso para as ruas”.

É simbólico que esse feriado seja o dia dos finados. 

Haverá desordem? Possivelmente. Nosso atual presidente permanece calado, covarde, no Palácio do Planalto.

Sorte a nossa é que, diferentemente do caótico sistema eleitoral norte-americano, que deu ampla margem para a retórica golpista de Donald Trump, em 2020, nossa Justiça Eleitoral realizou, novamente, uma eleição impecável e uma apuração célere, que impossibilitou qualquer tentativa de contestação. Ainda assim, não podemos deixar impunes as ações que a PRF promoveu no domingo e vem promovendo até o momento.

Fato é que, seja pela subestimação deste momento político que vivemos, seja pela tentativa de ruptura golpista da direita reacionária, o Brasil está acometido de um Transtorno Dismórfico. Não estamos sendo capazes de, como sociedade, compreender nós mesmos. Precisamos de tratamento, terapia talvez.

É preciso olhar um pouco para fora, dialogar com quem tem olhado o problema de cima, de lado, de baixo. O ângulo agora pouco importa. Uma segunda opinião pode ser extremamente saudável…