Manter uma democracia em pleno funcionamento é custoso. Não se pode imaginar que todos os impostos pagos serão revertidos em benefícios tangíveis para nosso bem-estar. É claro que devemos cobrar esses benefícios - saúde, educação e segurança ...
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Manter uma democracia em pleno funcionamento é custoso. Não se pode imaginar que todos os impostos pagos serão revertidos em benefícios tangíveis para nosso bem-estar. É claro que devemos cobrar esses benefícios - saúde, educação e segurança pública. Mas é também importante termos a consciência de que o próprio sistema democrático representativo requer financiamento. | ||
Meses atrás, vi muitas pessoas reclamarem do absurdo de se “sustentar partidos políticos e campanhas eleitorais com nosso dinheiro”. Ora, com qual dinheiro iríamos divulgar nossas ideias e projetos de país? Esperaríamos benfeitores bilionários com as mais puras intenções financiarem todo o sistema? | ||
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mantém um portal extremamente transparente, com informações a respeito de partidos, candidatos e prestação de contas financeiras. É muito gratificante constatar a evolução e a qualidade da Justiça Eleitoral brasileira, sobretudo se olharmos “para cima” e vermos a bagunça que é uma eleição nos Estados Unidos. | ||
Nas eleições de 2022, o ex-secretário de desestatização do governo Bolsonaro, Salim Mattar, é apontado pelo TSE como o maior doador individual, com R$2.775.000,00, cuja maior parte é destinada ao Partido Novo. Faz sentido, pois o partido é o grande defensor da “magia do Estado mínimo e da desestatização de todas as empresas públicas”. | ||
Em 2015, o STF proibiu a doação de empresas para campanhas eleitorais. A decisão do STF não proíbe que pessoas físicas doem dinheiro às campanhas. Pela lei, cada indivíduo pode contribuir com até 10% de seu rendimento no ano anterior ao pleito. | ||
A medida diminuiu, em parte, o problema do desequilíbrio do financiamento das campanhas eleitorais, pois havia muito poder econômico em posse das empresas, direcionado a candidatos e partidos específicos. É de se imaginar, pois, uma certa relação de poder entre doador e beneficiário, que reduz a igualdade imaginada entre os cidadãos. | ||
Nesse contexto, vale a pena entender o Fundo Eleitoral (criado em 2017 para equilibrar as contas com o fim do financiamento empresarial às campanhas) e o Fundo Partidário (de 1995). De acordo com o TSE, além de poderem ser usados para financiar campanhas eleitorais, os valores do Fundo Partidário são utilizados para custear atividades rotineiras das legendas, como o pagamento de água, luz, aluguel e passagens aéreas, entre outros. | ||
Há, evidentemente, despesas permitidas (como impressão de material de campanha) e despesas proibidas (como pagamento de cachê a artistas) com recursos dos fundos públicos. A maior controvérsia, no entanto, é uma mudança estabelecida em 2019 que autoriza gastos de recursos dos fundos com impulsionamento nas redes sociais. Não há limite para esse tipo de gasto, apenas uma menção a “respeito à moderação de gastos”. | ||
Já sabemos que isso pode dar problema. Mas o que mais me incomoda não são as possibilidades de desvios ou mal uso das verbas com campanha eleitoral. Esses problemas acontecem e requerem fiscalização e penalização. O que me deixa mais constrangido é a sociedade questionar os fundos públicos, como o fazem os adeptos do Partido Novo (que devolve para o tesouro toda a verba recebida do Fundo Eleitoral e do Fundo Partidário). | ||
O que querem essas pessoas? Que nossa democracia seja composta apenas por representantes ricos, capazes de se financiarem, ou por aqueles que são apadrinhados, como é o caso dos membros desse partido? | ||
Verdade é que toda democracia custa dinheiro. É preciso reconhecer que, apesar das decepções com desvios de verba e com os famosos caixas 2, financiar campanhas e manter partidos políticos custa uma boa grana, que deve ser garantida minimamente a todo partido legalmente registrado. | ||
Do contrário, voltaríamos aos tempos em que deputados e senadores nem salários recebiam. Éramos representados por sujeitos abastados, com agendas pessoais e projetos de vida que usavam do prestígio do cargo para sua projeção. |