Renda x Patrimônio: rico é quem ganha muito?
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Renda x Patrimônio: rico é quem ganha muito?

Diferenças entre renda e patrimônio

Rogério Calsavara
8 min
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Rico é quem ganha muito?

Pode parecer um pergunta boba, afinal todo mundo sabe identificar uma pessoa rica quando vê uma, mas a pergunta é mais para refletir mesmo, porque muitas vezes pensamos que rico é quem ganha muito dinheiro e, na verdade, não é bem assim. Ou, pelo menos, não é tão direto assim.

E o que está por trás da confusão que algumas pessoas fazem, às vezes, do conceito de riqueza, é a diferença entre renda e patrimônio. Todo mundo tem alguma ideia da diferença, mas vamos deixar as coisas mais claras e, para isso, vou pegar a definição de um dicionário.

O que são Renda e Patrimônio

Renda: Quantia que se recebe regularmente como consequência de alugueis, investimentos, recebimentos.Patrimônio: Conjunto dos bens, direitos e obrigações de uma pessoa ou empresa.

Então o patrimônio, sendo bem direto, são os bens de uma pessoa, ou seja, tudo o que ela tem. Automóveis, casas, apartamentos, terrenos, lanchas, aviões e também o dinheiro, desde aquele que está na conta-corrente, até o que está em aplicações financeiras ou guardado em casa. Normalmente, além do dinheiro, a gente só considera as coisas de maior valor quando pensamos em patrimônio, tais como imóveis e veículos, mas, para ser mais exato, temos que contar realmente todos os bens da pessoa, até mesmo o sofá, a mesa, os celulares, os livros, enfim, tudo.

Já a renda não é tão direto assim. Normalmente, quando questionadas sobre a renda, as pessoas costumamapenas dizer um valor, tal como R$ 2.000 ou R$ 3.000, mas, para sermos estritamente corretos, talinformação não tem sentido. Uma renda, sempre deve ser expressa como um valor por um determinadoperíodo de tempo. Então o correto é R$ 2.000 por mês ou R$ 60.000 por ano, por exemplo.

E é importante salientar que não precisa ser recorrente, ou seja, aquele valor que você recebe em todos os períodos. Tudo o que você recebe dentro do período de tempo considerado faz parte da sua renda. Então, se você tem um emprego, com salário fixo de R$ 3.000, por exemplo, e eventualmente faz trabalhos para aumentar a renda, o que você ganhar nesses trabalhos conta na sua renda. Então em alguns meses a sua renda é maior, em outros menor, dependendo de quanto trabalho extra você conseguir. Ou seja, a renda é a soma de todos os valores que você receber naquele período, independente de ser valores que você recebe todo mês ou não. E se você ganhar na Mega-Sena um prêmio de R$ 100 milhões, naquele mês em que você recebeu o prêmio sua renda foi de R$ 100 milhões.

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O que é ser rico?

Então, agora que ficou bem claro a diferença entre renda e patrimônio, podemos voltar à pergunta do início: rico é quem ganha muito? NÃO!!! Rico é quem tem muito patrimônio e não quem recebe muita renda!

Claro que, dado que o patrimônio é o acúmulo de renda, para se ter muito patrimônio, deve-se ter muita renda, porém, essa é uma condição necessária, mas não o suficiente. De nada adianta você receber muita renda se gasta tudo. E, nesse caso, quando digo gastar estou considerando apenas os gastos com bens não duráveis e serviços. Isso porque o que você gasta com bens duráveis e imóveis não altera o seu patrimônio, já que os bens que você comprou valem o que você pagou por eles. Então o seu patrimônio continua o mesmo. Sim, eu sei que qualquer bem durável, assim que sai da loja ele não vale mais o valor pago, mas estou simplificando um pouco aqui. Então, se você gasta toda sua renda, ou parte dela, com bens duráveis e imóveis, você está acumulando patrimônio.

Por outro lado, se você gasta toda sua renda com alimentos, bebidas, viagens, festas, restaurantes, eventos, passeios, mensalidades de academia ou faculdade, enfim, com bens não duráveis e serviços, você não está acumulando nenhum patrimônio. Por isso, mesmo que você tenha uma renda altíssima, por exemplo, R$ 100.000 por mês, se você gastar tudo dessa forma, mesmo daqui a 10 anos, continuará sem patrimônio nenhum.

Renda: a medida fundamental da economia

Mas voltando aos dois conceitos, qual é mais importante? Pensando bem é muito subjetivo dizer que um ou outro é mais importante, então o melhor é perguntar qual é o mais usado? Aí não tem subjetividade nenhuma. A renda é muito mais usada do que o patrimônio. Quando se aluga uma casa, quando se solicita um empréstimo e ao se fazer um financiamento é a renda a informação pedida e não o patrimônio.

A informação mais importante de uma empresa não é seu tamanho ou o quanto fatura, mas de quanto é o seu lucro, ou seja, a renda que a empresa é capaz de gerar. De fato, podemos dizer que a renda é um dos principais objetos de estudo da ciência econômica. O PIB (Produto Interno Bruto), que frequentemente vemos mencionado nos noticiários nada mais é do que a renda do país em um ano. E aí podemos entender um pouco melhor o porque de tanta preocupação com esse número.

Se para as pessoas não é uma grande problema se sua renda não aumentar de um ano para outro (claro, considerando aqui que os preços não sobem), para um país isso é um grande problema. E para entender o porque é tão importante, basta lembrar que a população dos países crescem. Então, com mais gente, é preciso pelo menos um aumento de renda que possa atender a esse aumento da população. Além disso, é da natureza humana querer sempre mais conforto, mais qualidade de vida, mais bens, mais tudo, o que demanda mais renda.

Mas sendo bem direto, é praticamente um conceito, se o PIB de um país não cresce esse país está passando por uma crise econômica, por maior que seja o nível de renda desse país. Então, para a Ciência Econômica, a renda de um país deve crescer continuamente, ano após ano, e quanto maior o crescimento, melhor. E se não for assim temos um problema. Todo o estudo da Ciência Econômica é entender como ocorre esse crescimento, como torná-lo cada vez maior e o que fazer para evitar que não haja crescimento.

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Nesse texto quis abordar os conceitos de renda e patrimônio para salientar a importância da renda e esclarecer algumas confusões que ocorrem algumas vezes e que acabam por causar situações curiosas. Uma dessas situações que quero contar aqui ocorreu em janeiro de 2015 em um processo judicial que um empregado moveu contra o seu patrão. Esse empregado estava sem receber salário há 3 meses e entrou na justiça cobrando esses valores. Muito justo! E esse empregado pediu o benefício da justiça gratuita. Esse benefício é previsto em lei e é concedido para as pessoas que não tem renda para pagar as custas do processo. Para isso quem está pedindo tem que entregar uma Declaração de Pobreza, em que declara que não tem condições de pagar essas custas.

Segue abaixo a transcrição do que esse empregado escreveu na sua Declaração, apenas omitindo as informações pessoais.

“Eu, fulano de tal, brasileiro, casado, inscrito no CPF tal, domiciliado à rua tal, número x, na cidade y, declaro, sob as penas da lei e para que produza seus efeitos legais e jurídicos, atendendo ao disposto na lei n° 7.115 de 29.09.83, especialmente para obter os benefícios da gratuidade de justiça, pelo que dispõe a lei n° 1.060 de 5.2.50, que não disponho de rendimento suficiente para pagar as custas processuais sem prejuízo do sustento próprio e da minha família, visto que não venho recebendo salários, sendo, desta forma, considerado pobre, na acepção jurídica do termo”

Parece muito justo. Se ele não está recebendo o salário como poderia pagar as custas do processo? Mas o detalhe aqui é que esse empregado era um jogador de futebol. Era verdade que o clube dele nãoestava pagando os salários há 3 meses, ou seja, fazia 3 meses que ele não recebia nada, mas durante anos o clube pagou o salário dele normalmente, um salário de R$ 650 mil por mês. Está certo essa pessoa se dizer pobre pra justiça pedindo a gratuidade? Bom, como vimos, não dá pra saber só com essa informação. Se durante todo o tempo que ele recebeu esse salário ele gastou tudo com serviços e bens não duráveis, então ele não tem patrimônio nenhum e é pobre mesmo. Mas se ele acumulou patrimônio, com certeza ela tem condições de pagar as custas do processo, mesmo sem ter renda nenhuma no momento.

http://ge.globo.com/sp/santos-e-regiao/futebol/times/santos/noticia/2015/01/maior-salario-do-santos-damiao-se-declara-pobre-para-convencer-juiz.html

Enfim, só um caso curioso que ilustra essa pequena confusão entre renda e patrimônio.