Crítica - "Somos Tão Jovens"
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Crítica - "Somos Tão Jovens"

Não sei se fantástico definiria "Somos Tão Jovens". Não sei se inventaram uma palavra a altura do filme.

FÁBIO LINS
6 min
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Não sei se fantástico definiria "Somos Tão Jovens". Não sei se inventaram uma palavra a altura do filme.

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Uma adaptação à vida de Renato Russo, o maior Roqueiro brasileiro de todos os tempos, não seria fácil. A responsabilidade é imensa. A chance de errar é grande. A chance de serem criticados pelos fãs perfeccionistas da Legião era maior ainda. Porém, ao final de quase duas horas de filme eu digo: "Eles conseguiram".

Não porque eu seja "suspeito para falar" por ser muito fã de Renato Russo, pelo contrário. Exatamente por ser fã, tenho a obrigação de avaliar o filme minuciosamente, para que não venham denegrir a imagem de Renato. "Ah, é um filme da Legião e os fãs amarão." De forma alguma. Amaremos se os produtores fizerem jus à Renato Russo, Aborto Elétrico e a Legião Urbana. Eles fizeram, sem mega-produção cinematográfica, mas com estrutura de extrema qualidade, como pedia a antiga Brasília .

Primeiramente o filme é um presente aos fãs. É certo que quem não é fã de Renato Russo não irá conseguir captar os sentimentos que os fãs que seguem veementemente a história de Renato captaram. Mas acredito que considerarão um ótimo filme. Incrível como em cada segundo, em cada palavra, em cada imagem, assimilamos algo à história da Legião Urbana e às letras das canções, paralela à vida de Renato Russo. As palavras no filme não foram jogadas ao vento, foram jogadas para dentro de nossos corações, justificando as letras que cantamos durante anos. Todo detalhe foi importante, nostálgico, mágico.

Foi como se juntassem todas as informações que absorvemos durante anos por diversos meios e colocassem em ordem cronológica, do início do Aborto Elétrico ao início da Legião. O filme nos contou a vida de Renato Russo nesse meio tempo, defeitos e virtudes, com os principais acontecimentos de sua vida. Claro que poderiam ter contado ainda mais histórias, mas seria um filme de cinco horas, talvez. Eu até não importaria. Poderia ser um filme até com mais de dez horas de duração. Claro e óbvio que o que eles tinham em mãos eram duas horas e fizeram um excepcional trabalho. Valeu cada minuto.

Nesse contexto, testemunho a reação do público ao fim do filme. Ninguém queria sair do cinema. Todos queriam mais e mais e mais. "Acabou? Já?" Várias reações desse tipo. Todos sofrem até hoje com a perda precoce do ícone. Todos queriam estar ali, dentro do filme, vivendo ao lado de Renato, ser um de seus amigos. Todos os fãs pagariam qualquer preço para viver em Brasília naquela época, no início do cenário punk, presenciando ou até participando desse movimento. Uma salva de palmas intensa ao fim do filme, com a única frustração de não poder ver mais detalhadamente o pós filme. Quem sabe um "Somos Tão Jovens 2"? Cabe, tranquilamente. Torçamos para que seja um sucesso de bilheteria.

Voltando ao filme, vivemos ali o nascimento de muitos dos clássicos da Legião Urbana e do Capital Inicial, a partir do Aborto Elétrico, a partir de Renato Russo. Ele foi um cara que não conseguia aceitar as coisas do jeito que estavam, politicamente, socialmente,... Ele tinha que fazer alguma coisa, mesmo sendo uma agulha no palheiro. Muitas vezes Renato arrumou problemas com familiares e amigos, devido seu jeito explosivo de tentar resolver as coisas, mas sempre soube se arrepender de seus erros e de dar valor e amor às pessoas que lhe fizeram bem.

Ele acabou conseguindo: em meio suas letras, em meios seus conselhos ou críticas contra a ditadura, política, governo. Renato disseminou palavras em suas canções que fazem sentido no mundo atual. "Que País é Esse" é uma das provas viva disso. Se sua presença na terra mudou alguma coisa, talvez nem faça diferença para o mundo, mas fez diferença para ele e para os fãs, ajudando muitos a criarem caráter e a formar homens e mulheres de bem. Ele sempre dizia que se você quiser mudar o mundo, deveria começar a mudar a si mesmo. Renato deve ter ido em paz, satisfeito com seu papel na sociedade. É o que importa. Fez a sua parte muito bem e o filme mostrou isso de forma direta e indireta.

Renato abordava a sua vida nas canções, motivado por amor, paz e revolta. Seu cotidiano era sua fonte de inspiração, entrelaçado à situação política-social mundial. Dentro disso, acabou errando em diversos pontos, como usar seus amigos sem permissão (claro) para ajudar em algumas poucas composições. Esse foi um erro que Renato se arrependeu amargamente e sofreu na pele. Contudo, conseguiu o perdão, provando arrependimento, provando que o que fizera, nunca mais seria feito. Então surgia "Ainda é Cedo".

Música pelo qual tornou-se a base do filme. Um filme sobre o amor. Amor entre Renato e Aninha. Uma amizade profunda. Renato não se contentava em perder sua amizade. Ele estava errado, ele queria o perdão, mas Aninha não aceitava da boca pra fora, nem através de gravações em fita K7. Em um dos momentos mais emocionantes do filme, vem a música, a prova, consequentemente o perdão de Aninha, culminando no nascimento de uma dos maiores clássicos da Legião Urbana.

Não consegui achar um defeito técnico no filme. Quanto ao elenco, fiquei maravilhado e surpreso. Sempre achei que Wagner Moura se encaixaria melhor no papel de Renato Russo, por sua identificação com a banda, mas após assistir o filme, retiro o que dizia. Thiago Mendonça encorporou Renato de uma forma incrível. Logo nos primeiros minutos já ficamos maravilhados com seus trejeitos, seu timbre de voz, sua dança, tudo. O ator foi espetacular. Não poderia ser diferente, pois, o ator sofreu anos estudando o personagem, teve que aprender a tocar instrumentos e entre outros. Um trabalho maravilhoso.

Tal como de todo elenco principal: não conhecia o trabalho de Laila Zaid. Seu trabalho também foi magnífico e a atriz sempre será lembrada por mim como a eterna Aninha. Interessante acompanharmos a inserção pausada de personagens que conhecemos no mundo do Rock, incrivelmente com os mesmos trejeitos, como: Fê Lemos (Bruno Torres), Flávio Lemos (Daniel Passi), Dinho (Ibsem Perucci)... Sem contar que o Edu Moraes praticamente engoliu o Herbert Vianna.

Enfim, saí do cinema (por último, no fim de todos os créditos) muito satisfeito. Vivi minha adolescência correndo atrás de todo e qualquer tipo de material áudio-visual da Legião Urbana e era muito, extremamente difícil de encontrar. Esse lado melhorou muito após a morte do Renato, mas faltava um filme de qualidade como "Somos Tão Jovens" para selar a história de Renato. Contudo, o filme ainda dá margem para continuação. Seria excepcional se produzissem uma trilogia, finalizando na morte de Renato Russo. É um sonho, mas vivemos de sonhos.

"Nunca deixe que lhe digam que não vale a pena acreditar nos sonhos que se têm ou que os seus planos nunca vão dar certo ou que você nunca vais ser alguém..."

Renato Russo