Ucranizar o Brasil?
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Ucranizar o Brasil?

Nas manifestações de Brasília que ocorrem hoje, 7 de setembro de 2021, mais uma vez nos deparamos com a bandeira do partido ucraniano de extrema-direita Pravy Sektor. Essa bandeira aparece em todas as movimentações favoráveis a Jair Bolsonaro...

Francine Oliveira
4 min
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A extrema-direita brasileira tem uma obsessão com a Ucrânia.
A extrema-direita brasileira tem uma obsessão com a Ucrânia.

Nas manifestações de Brasília que ocorrem hoje, 7 de setembro de 2021, mais uma vez nos deparamos com a bandeira do partido ucraniano de extrema-direita Pravy Sektor. Essa bandeira aparece em todas as movimentações favoráveis a Jair Bolsonaro e ganhou certa notoriedade em 2020.

Na tarde de 30 de maio do ano passado, durante manifestações pró-Bolsonaro, essa bandeira apareceu pendurada em um trio elétrico e, posteriormente, nas costas de um indivíduo que andava pela Avenida Paulista.

À época,  em entrevista à emissora CNN Brasil, o embaixador da Ucrânia, Rostyslav Tronenko, alegou que a bandeira não tinha ligação com o partido Pravy Sektor, dizendo se tratar de fake news. Isso porque havia também, nos protestos, uma bandeira azul e amarela representando as cores da Ucrânia. 

No entanto, aquela trazendo as cores vermelho e preto está, sim, intimamente ligada à extrema-direita ultranacionalista no país. E vale mencionar que, no passado, a polícia brasileira chegou a investigar uma associação entre neonazistas brasileiros e guerrilheiros ucranianos.

Em páginas conservadoras e militaristas, encontramos textos que defendem a ideia de "ucranizar" simplesmente como "acabar com o comunismo" e lutar contra a militância socialista, para que ela não chegue ao poder. 

De fato, o passado ucraniano, marcado pela dominação da União Soviética, deixou marcas no país e vem sendo, até hoje, usado pela extrema-direita nacionalista para justificar suas ações.

Em 2015, o parlamento da Ucrânia aprovou uma lei equiparando o comunismo ao nazismo, condenando regimes totalitários e proibindo a existência de partidos comunistas. Além disso, reconheceram os membros do Exército Insurgente da Ucrânia (cuja bandeira é vermelho e preta) e outros grupos que lutaram contra os soviéticos no passado.

Essa lei vem na esteira de um projeto chamado de "descomunização da Ucrânia", que se iniciou com a dissolução da União Soviética, em 1991, envolvendo a derrubada de monumentos comunistas e a mudança de nomes de ruas. Em 2013, com uma onda de manifestações nacionalistas iniciadas na noite de 21 de novembro, o sentimento anticomunista abriu caminho para o tal Pravy Sektor.

Ucrânia e a extrema-direita

O chamado Pravy Sektor (ou "Setor Direito") surgiu como uma aliança entre grupos ultranacionalistas em novembro de 2013 e alguns de seus membros participaram dos protestos em Kiev contra o presidente Viktor Yanukovych, que havia sido eleito em 2010. A onda de protestos ficou conhecida como "Euromaidan".

O governo de Yanukovych era pró-Rússia, com alguns de seus membros sendo suspeitos de corrupção, e causou indignação entre parte da população ucraniana por decidir não assinar um acordo de cooperação com a União Europeia. A recusa do presidente em assinar o acordo se deu após ameaça, por parte do governo russo, de imposição de sanções à Ucrânia. Isso levou à intensificação dessa polarização que já assola o país há décadas.

De forma simplificada, a disputa na Ucrânia se deu entre aqueles que eram favoráveis à Rússia (concentrados na região leste do país, onde o idioma majoritário ainda é o russo) e aqueles que defendiam o estreitamento de laços com a União Europeia (em sua maioria, de Kiev e da região oeste).

Os partidos que se opunham ao governo de Yanukovych tomaram parte nos protestos em Kiev. Entre eles, destacaram-se o movimento Udar, liderado por Vitor Klitschko; o partido Svoboda, comandado por Oleh Tyahnybok; e o partido Bratstvo. Estes dois últimos são de extrema-direita. 

Apesar de sua presença nos protestos da "Euromaidan", o Pravy Sektor apenas se formalizou como partido em 22 de março de 2014. Eles ganharam visibilidade após confrontos violentos com a polícia, em Kiev, em 19 de janeiro. Dmytro Yarosh, à época líder da organização ao lado de Andriy Tarasenko, comandou os atos.

Yarosh se diz admirador e seguidor de Stepan Bandera, um líder nacionalista que lutou, nas décadas de 1930 e 40, contra a Polônia e a dominação soviética sendo, durante a Segunda Guerra Mundial, aliado nazista. A ideologia do Pravy Sektor se baseia no ultranacionalismo e a Rússia os acusa de envolvimento em ataques contra os separatistas pró-Moscou no leste ucraniano.

Em 2014, Dmytro Yarosh foi eleito para uma cadeira no parlamento ucraniano pelo partido Setor Direito. Ele está associado ao comando de nacionalistas e paramilitares que defendem a tradição do Exército Insurgente Ucraniano (que, na Segunda Guerra, lutou em aliança com nazistas) e que lutam ativamente na guerra civil separatista de Donbass, no leste da Ucrânia, ao lado do partido Svoboda e do Batalhão de Azov (este último se tornou um regimento da guarda ucraniana e é acusado de diversos crimes de guerra na região, incluindo execuções e desaparecimentos, estupros e perseguição a minorias sociais).

O Pravy Sektor se diz contrário à dominação russa e ao imperialismo do Ocidente, além de defender políticas armamentistas.