Na hora de investir se preocupe em ganhar menos, daí você poderá ganhar mais
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Na hora de investir se preocupe em ganhar menos, daí você poderá ganhar mais

Qual o segredo para conseguir suportar as oscilações do mercado pelo tempo necessário para que o seu investimento possa dar frutos?

Danilo
9 min
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Photo by Isaac Smith on Unsplash
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O que vou contar aqui é algo que talvez você já saiba. Porém, a pergunta é: você coloca isso em prática ou é iludido pelo seu próprio cérebro como a esmagadora maioria das pessoas?

Você provavelmente já fez planos para sua vida ou carreira em algum momento. Coisas do tipo “terminar a graduação em quatro anos”, “finalizar um mestrado em seis anos”, “comprar uma casa e ter filhos em dez anos”, “se aposentar aos quarenta”...

Conta pra mim, as coisas saíram como planejado, dentro do prazo idealizado? Caso a resposta seja sim, parabéns, além de um excelente planejador, você é um excelente executor.

Bom, comigo não rolou. Toda hora preciso recalcular os prazos. Não me entenda mal, não sou preguiçoso. A maior parte dos objetivos ainda é realizado, mas não no tempo projetado inicialmente. A realidade se impõe como uma tirana e ri de mim o tempo inteiro.

Tá bom, esses projetos envolvem muito tempo, então a margem de erro é aceitável, não é? Pois bem, vamos falar de algo mais simples, mais rápido e “preciso”.

Diz aí, você já fez uma reforma? Projetou o prazo e os custos com perfeição antecipadamente, pensando minuciosamente em todos os detalhes? Deu certo?

Agora, veja, não seria mais razoável (essa é uma palavra poderosa, geralmente negligenciada) fazer projeções do tipo “vou terminar a graduação entre quatro e seis anos”, “vou me aposentar entre 50 e 55 anos”, “a reforma vai durar entre dois e cinco meses e vai custar de R$ 10 mil a R$ 17 mil”?

Muito mais, né? O problema, no entanto, é que o nosso cérebro gosta de certezas, por mais que saibamos quão raras elas sejam.

Estava assistindo uma série outro dia e ouvi um personagem dizer para o outro: “poucas coisas são absolutas nesta vida, meu filho”. Bingo! O mundo é um caos, e a história, apesar de bastante útil para o aprendizado de lições e regras genéricas, é um péssimo mapa para o futuro, pois “coisas que nunca aconteceram antes acontecem o tempo todo”.

Mas isso não quer dizer que você não deva realizar planos, pelo contrário. O futuro é uma bagunça, não há como negar, mas é uma “bagunça organizada”, pois apesar de ser impossível de prevê-lo é bastante factível estimá-lo, desde que suas projeções sejam razoáveis e flexíveis.

A única forma de tirar proveito disso é trocar racionalidade (se quiser chamar de “certezas” ou “fórmulas infalíveis”, fique à vontade) por razoabilidade. Em outras palavras, você precisa trabalhar com diversos cenários possíveis para as suas projeções e utilizar expectativas versáteis, ou melhor, adaptáveis.

Mas isso não é suficiente, pois como mencionei, o futuro pode ser traiçoeiro. Então, você precisa ter uma carta na manga, um plano B, ou melhor, um plano para quando todos os planos falharem ou simplesmente não tiver planos. Você precisa ter uma margem de segurança, ou para imprevistos, ou de manobra, ou seja lá qual for o nome que prefira — você precisa ter opções.

“Na verdade, a parte mais importante de um plano é ter um plano para quando o plano não estiver saindo de acordo com o plano”

E se tem uma área da vida onde é imperativo ser razoável e ter opções, pode ter certeza de que se trata da sua relação com o dinheiro. Quando o assunto é finanças, imprevistos e eventos inesperados são regra e não exceção. Trata-se de um jogo lento, repleto de nuances, no qual a vitória depende fundamentalmente de três fatores: se manter “vivo”, colocar as probabilidades a seu favor e usar o tempo como seu aliado.    

Comecemos pelo básico. Muitas pessoas não possuem uma reserva de emergência, seja porque gastam tudo ou mais do que ganham, seja porque acreditam que não é necessário, ou simplesmente porque estão desempregadas e/ou não possuem rendimentos. Por questões óbvias, vamos nos concentrar nos dois primeiros casos.

Quantos eventos imprevisíveis nos acometem diariamente? Doenças, mortes, demissões, falências, um carro quebrado, um banheiro entupido... Como controlar isso? Como saber quando acontecerá? Impossível. Só o que nos resta é estarmos preparados, ter uma margem de segurança.

Mas a probabilidade de eventos inesperados não está só no lado negativo e esta é uma faceta — infelizmente — incompreendida do risco. Uma oportunidade de emprego que exige um curso imediato, um desconto imperdível para antecipar as mensalidades da escola, uma queda de 20% na bolsa de valores, o terreno dos seus sonhos, cujas parcelas cabem no seu orçamento, mas exige uma entrada... Mais uma vez, é preciso estar preparado, ter uma margem de segurança.

Quando se trata de investimentos, então, nem se fala. Não há como saber quando a próxima crise vai acontecer nem quanto tempo vai durar, não dá para saber qual a próxima ação que irá “bombar” e muito menos quando, mas dá para saber que, em um horizonte de tempo razoável, tudo isso vai acontecer e quem tiver condições de se manter no jogo, provavelmente, vai se dar bem.

Quando se depara com uma oportunidade de investimento que considera excelente boa parte das pessoas tem uma predisposição a apostar todas as fichas. “Ora, se estou convencido de que vou me dar bem, por que não me jogar de cabeça”?

Pensando nos maravilhosos ganhos projetados, investir apenas parte da sua grana, diversificar e deixar dinheiro em caixa para margem de manobra pode parecer burrice, ou até mesmo covardia.

O próprio Buffett, afirmou, certa feita: “a diversificação é uma proteção contra a ignorância; faz pouquíssimo sentido para quem sabe o que está fazendo”. Mas eu enxergo três problemas com essa afirmação: o primeiro é que não somos Warren Buffett, o segundo é que ele tem um portfólio bastante diversificado atualmente, e o terceiro — e mais importante — é que, de fato, raramente sabemos o que estamos fazendo.

Mas o ponto que não podemos esquecer quando estivermos diante de uma “grande oportunidade de investimento” é que seus “rendimentos maravilhosos” são prováveis e não garantidos. Além disso, “o quando” é um fator absolutamente imprevisível. Mas você só precisa se preocupar com ele se estiver com pressa e apertado, sem margem de manobra.

Vejamos um exemplo prático. A então Magazine Luiza, hoje Magalu, abriu seu capital na bolsa (fez um IPO) no final de abril de 2011. Em 23/07/2021, suas ações haviam se valorizado cerca de 4.800%. Isso quer dizer que R$ 1.000,00 investidos nesta ação valeriam R$ 48.000,00 hoje. Fantástico, não?

Agora, vamos imaginar um investidor que tinha um patrimônio de R$ 25 mil em abril de 2011, quando a Magalu abriu o capital. Vamos considerar também que ele tinha “certeza” de que as ações iriam “explodir”. Bom, se ele investiu tudo na ação e segurou todos esses anos, seu patrimônio se transformou em R$ 1.200.000,00. Ele estava certo e se deu bem, maravilha.

Mas vamos relembrar um pouco da história. Quando a Magazine abriu o capital, era “apenas” uma grande rede de lojas de móveis e eletrodomésticos, muito longe de ser o marketplace e o gigante online cheio de tentáculos que a Magalu começou a se tornar nos últimos 5 anos.

Ou seja, a ação não subiu de forma meteórica, longe disso. No final de 2011, apenas oito meses depois do IPO, as ações haviam caído 40,38%. O que aconteceria com a convicção do nosso amigo que colocou todo o seu dinheiro na ação?

Mas vamos supor que ele manteve a convicção e foi perseverante. Pois então, no final de 2015 as ações haviam caído 85,40%. Como esse investidor se sentiu? Será que ele conseguia dormir tranquilo?

E se além de aplicar todo o dinheiro que tinha ele ainda tivesse tomado um empréstimo para aumentar a sua aposta, isto é, e se tivesse alavancado o investimento? Qual o tamanho do desespero? Quanta força de vontade e autocontrole seriam necessários para se manter firme pelo tempo necessário para colher os frutos do investimento?

Agora imagine se ele não tivesse suportado a pressão psicológica de ver as ações na lona e tivesse vendido a sua posição. Qual o tamanho do arrependimento que teria, alguns anos depois, ao ver as ações subirem até o céu?  

Entretanto, se ele não tivesse “ido com tudo”, e tivesse deixado uma margem de segurança, provavelmente a história seria outra.

Vamos imaginar que, apesar de estar muito convicto, ele decidiu aplicar apenas R$ 10 mil. Quando a ação “derreteu”, ele provavelmente ficou frustrado, mas como tinha guardado R$ 15 mil, suas noites de sono eram um pouco menos conturbadas, o que poderia contribuir para ele manter a ação apesar da queda violenta. Se ele fez isso, o investimento dele se transformou em R$ 480 mil. Nada mal, hein?

Se só tivesse investido R$ 5 mil, ele teria mais estômago ainda para suportar o baque, pois sua margem para imprevistos seria maior ainda, e ele teria hoje R$ 240.000,00.

Mas não é só isso. Se ele tivesse mantido uma boa margem de manobra, o que ele poderia ter feito quando as ações estavam a preço de banana? Isso mesmo, ele poderia ter comprado mais e multiplicado o seu rendimento muitas e muitas vezes.

Entendeu a importância de estar preparado? De ter dinheiro à disposição, tanto para segurar os perrengues quanto para aproveitar as oportunidades?

Como quase tudo na vida, investir tem um preço, e esse preço se chama volatilidade. Se você quer ter rendimentos melhores, precisa aceitar o fato de que os ativos vão subir e cair o tempo inteiro — as vezes com muita intensidade.

Para ter sucesso, é preciso ter “estômago” para segurar o seu investimento pelo tempo necessário para que amadureça. Mas é muito difícil ver o seu dinheiro “derretendo”, ainda que temporariamente. Ser racional é mais fácil no papel do que na prática.

É aí que entra a margem para imprevistos. Ela funciona como uma espécie de lactobacilo, que vai ajudar o seu estômago — que, a propósito, é o órgão mais importante do investidor — a permanecer forte, para suportar as constantes indigestões causadas pela volatilidade.

É claro que se o negócio der certo e você tiver apostado todas as fichas, o seu retorno será muito maior. Mas só dá para saber disso depois que a coisa ocorre; depois que acontece tudo é óbvio. No momento em que você investe não há certeza, apenas probabilidades.

O presente é apenas um dos milhares de cenários futuros que poderiam ter acontecido partindo de um cenário anterior, isto é, do passado. Não há como controlar isso. Aceite, que dói menos.

Você pode não saber qual o próximo ativo que vai disparar, mas você sabe com certeza que algum irá disparar. O que fazer então? Diversificar e espalhar as suas apostas, colocar as probabilidades ao seu favor. E claro, deixar o tempo fazer o seu papel.

Mas para isso, você precisa se esforçar para controlar o desejo quase irresistível de “ganhar todo o dinheiro da mesa”, de apostar todas as fichas. Se preocupe apenas em permanecer no jogo, em resistir aos momentos difíceis e se manter sereno para aumentar a aposta quando os demais jogadores estiverem desesperados. Tenha sempre cartas na manga; tenha sempre opções e, claro, boas noites de sono.

Lembre-se que o ativo mais valioso do mundo — depois da vida, é claro — é o tempo. Se você compreender isso, entenderá a real função do dinheiro.

Dinheiro = tempo = opções = liberdade.

Como eu disse, é muito simples entender isso, colocar em prática, no entanto, são outros quinhentos. Se conseguir, é meio caminho andado — ou seria todo caminho andado?