O real limite do Eros
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O real limite do Eros

Sobre eros, o amor romântico e sua deturpação ocasionada pela modernidade.

Kauê
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Todo amor humano, em sua condição mais elevada, tem a tendência de reivindicar uma autoridade divina para si, e sua voz tende a soar como se fosse a própria vontade de Deus. [...] Poderíamos dar aos nossos amores humanos uma aliança incondicional do tipo que devemos somente a Deus. Então, nossos amores se tornariam deuses e, por consequência, demônios.

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C. S. Lewis sempre é uma excelência em referência, além de ser, de longe, o meu escritor favorito. O planejamento inicial era de uma reflexão a respeito da obra. Entretanto, decidi escrever algo intimamente mais pessoal.

Storge, philia, eros e ágape: quatro, dos sete, amores da filosofia grega. Amor fraterno, amizade, romântico e incondicional, respectivamente. Todos igualmente fundamentais. Em uma perspectiva mais filosófica, o amor corrompe-se quando decide brincar de Deus. Aprofundar-me-ei no Eros.

No decorrer dos anos, os valores morais foram distorcidos e invertidos. O certo tornou-se errado e vice-versa. Por ser católico, tenho uma séria desconfiança do Eros. Caso seja mal utilizado, tratar-se-á de um pecado. Esta semana, estive questionando-me se estou interpretando seu significado ao pé da letra. Cheguei ao meu limite e eis o resultado.

Educação, valores éticos, bagagem cultural, religiosidade, maturidade e responsabilidade são algumas das qualidades frequentemente ausentes. Afirmo de maneira eloquente: evolua, transcenda, reze e não escolha qualquer pessoa para um relacionamento mas aquela que te acrescente e complemente. Seja seletivo. Dê-se o devido valor.

Hedonismo e libertinagem não são Eros, é a depravação da própria alma. Lewis define-o brilhantemente em algumas passagens: “Desejo sexual sem Eros quer isso, a coisa em si; o Eros quer a pessoa Amada. […] Por outro lado, o Eros faz um homem realmente desejar, não uma mulher, mas uma mulher em particular. De uma maneira misteriosa, mais indiscutível, o amante deseja a mulher Amada, ela mesma, não o prazer que ela pode dar. […] Sem o Eros, o desejo sexual, como qualquer outro desejo, é um fato sobre nós mesmos. Dentro do Eros é muito mais sobre a pessoa Amada.” Se mal interpretado, o Eros aproxima-nos de animais. A maneira como enxergamos e usufruímos deste amor transforma-nos em humanos ou emerge-nos nas paixões lascivas, pelo comportamento animalesco e primitivo. Behaviorismo, correto?

A idealização do romantismo também é de fato perigosa. Um dos casos mais icônicos da filosofia é o “amor platônico”, o qual a pessoa amada é colocada em um patamar inatingível. Em diversas mídias e veículos da cultura pop, esse conceito é aplicado de maneira desordenada, visceral ou exagerada. Filmes superficiais para um público juvenil idiotizado ou algo mais adulto mas com um conteúdo igualmente questionável. Músicas sobre amor e paixão que abordam somente Vênus, o erotismo propriamente dito, sem nenhum significado mais profundo ou que desafie o senso comum. Por outro lado, também há belíssimas músicas e poesias incrivelmente alegóricas e de difícil interpretação, possuindo um caráter místico e quase esotérico. O equilíbrio é, infelizmente, uma exceção.

Ressalto a característica mais importante é a moralidade. Valores cristãos preservados. Cultura, interesses comuns e uma infinidade de assuntos e experiências para serem vivenciados e compartilhados juntos. Em relação a integridade, valores devem ser devidamente respeitados.

Existe um paradoxo de mentalidade puritana e dominante. Para conseguir um amor, é necessário que apresentemos uma postura imperante e permitir que o instinto faça o que é de sua competência. Concomitantemente, caso não haja controle de nossos impulsos, acabamos por supervalorizar o Eros como se fosse o Ágape. Se esta conta estiver errada, o resultado será sempre uma inequação.

Confesso que me controlei. Controlei-me até demais. Durante este intervalo, neguei minha natureza quase completamente, talvez a ponto de inibir uma fração da minha essência. Difícil é admitir que o Eros torna uma relação única, ainda que com algumas ressalvas. Acredito que a paixão seja uma deturpação do Eros. Se o amor fosse exato e determinístico, seria extremamente fácil de compreendê-lo. E qual seria graça nisso?

O emocional é insistente enquanto o racional é, na maioria das vezes, amargo. O que houve não foi exatamente uma tentativa pois não foi um amor real. Entretanto, tal limite hipotético é muito próximo a realidade, com uma margem de erro irrisória. Devido a esta contenção, pareceu um sentimento como se fosse algo errado.

Diante de uma perspectiva pitagórica, considero como real. Posso ter deixado de ser eu por um tempo. Moralmente foi o correto a ser feito, mas sob a ótica mais materialista, foi completamente antinatural.

Em minha visão, este é o segredo para a relação não tornar-se monótona e, assim, evitando aquela sensação de continuá-la por conforto. Os objetivos, direitos e deveres devem ser conciliados mutualmente. O companheirismo decidirá se a relação prosperará ou não.

Devo admitir que não sei por quanto tempo manteria este comportamento mais puro. Sou falho e passível de e(r)ros. Entretanto, jamais hei de entregar-me aos pecados e aos desejos mundanos. Ainda acredito no amor e assim permanecerei até o final.