Uma newsletter que exige um esforço temporal e imaginativo
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Uma newsletter que exige um esforço temporal e imaginativo

Enquanto eu escrevo essa newsletter é dia das crianças, então pensei que eu poderia contar com um pouco de esforço imaginativo e temporal dos meus leitores que estão recebendo a newsletter de setembro (viu?).

Bárbara Krauss
5 min
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Enquanto eu escrevo essa newsletter é dia das crianças, então pensei que eu poderia contar com um pouco de esforço imaginativo e temporal dos meus leitores que estão recebendo a newsletter de setembro (viu?).

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Na última edição que eu enviei disse que essa sairia em um dia específico, eu queria fazer  um texto sobre o 11 de setembro no Chile, bastante inspirada pelo curso a esse respeito que fiz com a minha amiga Tatiana Mascarenhas, digitalmente conhecida como @nacontracapa, e depois pelos filmes que assisti por indicação do curso como "Machuca", disponível na Netflix.

Acompanhamos as mudanças sociais e políticas em ebulição durante o governo de Salvador Allende seguidas de sua queda e assassinato (a execução foi militar, mas o apoio da classe média estava ali) pelo viés das crianças de uma escola privada que recebe alunos do sistema público. Há inclusive uma cena de reunião de pais na igreja que é fantástica por si só, resumindo em poucos minutos os pensamentos da sociedade em conflito na época.

Foi nessa leva que emendei "Tenho medo, Toureiro", disponível no Prime Vídeo, que indiquei também na newsletter passada. Trata-se da adaptação de uma novela de Pedro Lemebel, poeta e militante LGBTQIA+ não traduzido por aqui, em que uma travesti se apaixona por um militante que planeja um ataque à Pinochet.

Mas no meio disso tudo eu fiz aniversário, tomei minha segunda dose e mudei de casa. Foram esses os motivos práticos que eu elenquei como culpados pra atrasar a newsletter e me sentir no direito de pedir ajuda à imaginação de vocês, mas a verdade é sempre menos objetiva.

A verdade é que eu não tava satisfeita com a newsletter anterior que mandei pra vocês, não pelo conteúdo, mas pelo formato. Eu queria algo que conversasse mais, tenho refletido muito sobre a rigidez das comunicações durante essa pandemia e sempre me parece que o e-mail nos apresenta essa rigidez como inescapável.

Eaí eu me lembrei de newsletters que eu gosto muito de ler sempre que chegam, a da Isadora Attab e da Michelle Henriques, assim como uma que assinei recentemente chamada Livros e Lámen, da Gabi Barbosa. Basicamente elas escolhem um tema, um momento, um sentimento e discorrem sobre isso colocando várias diquinhas de conteúdo no caminho, como eu tô fazendo aqui. A única coisa que vai ser mantida é o TUDO OU NADA, porque é daquelas ideias bobas que a gente se orgulha de ter tido.

Essa é também uma newsletter de transição como tudo o que tá acontecendo comigo agora, 26 anos, hoje completamente imunizada (15 dias se passaram desde a segunda dose) e morando sozinha. E esses momentos de mudança exigem sempre uma repactuação com o outro pra que os relacionamentos continuem, então eu só posso desejar que vocês gostem dessa ideia, desse formato e continuem comigo, que ainda estejam me lendo inclusive.

Antes de partir pro tudo ou nada quero deixar um trechinho do prefácio de "A casa na Rua Mango", de Sandra Cisneros, não só porque ele fala sobre ter o seu espaço e o seu lugar pra produzir, mas também porque ele de alguma forma é esse relato, conversa sobre algo que a Virginia Woolf tinha dito muito tempo antes e de forma muito mais complexa em "Um teto todo meu". E é assim:

"Não um flat. Não um apartamento de fundos. Não a casa de um homem. Não a de um pai. Uma casa toda minha. Com a minha varanda e o meu travesseiro, minhas lindas petúnias roxas. Meus livros e minhas histórias. Meus dois sapatos esperando ao lado da cama. Ninguém para ameaçar com um pedaço de pau. As tralhas de ninguém para recolher.
Apenas uma casa silenciosa como a neve, um espaço para eu mesma ir, limpa como papel antes do poema."

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TUDO OU NADA

  • Filme | O baile das loucas, disponível no Prime Video: esse filme estreiou por aqui um dia antes do meu aniversário e foi uma indicação do Nicolas Chaline que apoia o projeto no Catarse também. Nele vemos o processo de patologização de hábitos e costumes de mulheres que desafiavam a passividade da reprodução social na França do século XIX. Patologização essa que conta com o aval médico de Jean-Martin Charcot, uma figura importante da história da psiquiatria por seus estudos de hipnose.
  • Série | Sex Education, disponível na Netflix: Ottis, filho de uma sexóloga, começa a cobrar por atendimentos na área de atuação da mãe no colégio. Uma série que apresenta o sexo como algo muito menos assustador do que a maioria dos aparatos ideológicos da sociedade gostaria. A terceira temporada segue com qualidade, mas o cheirinho que fica é que a quarta deve ser também a última.
  • Livro | Canto eu e a montanha dança, de Irene Solá. Um romance catalão que explora o folclore da região e desafia a visão antropocentrica do mundo, nele temos uma diversidade de narradores tais quais nuvens, cogumelos, corça, cachorro e placas tectônicas que apresentam uma camada escondida do macrocosmo na literatura.
  • Música | Por supuesto, de Marina Sena. Essa música é total aquela vibe tropical de flerte pra se arrumar pra ir pro bloquinho de carnaval, aquele que como brasileires estamos apenas sonhando com.
  • Perfil para seguir | Rafael Ottati, do @elrafa.lit, que além de um produtor de conteúdo muito completo e desfeito dos formatos mais quadradinhos pra falar dos livros voltou agora com seus cursos e leituras de ficção científica, Byung-Chul Han e mais.
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Fico por aqui, mas esse mês ainda vocês me leem de novo na caixinha de e-mails! Beijão, B.