Resumo:
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Resumo: | ||
Georg Wilhelm Friedrich Hegel, filosofo alemão, nascido em vinte e sete de agosto de 1770, em Stuttgart, Alemanha; Karl Marx, filosofo alemão, nascido em cinco de maio de 1818, em Trier, Alemanha e Antônio Francesco Gramsci, filosofo italiano, nascido em Ales, Itália, em 1891. É a partir de conceitos como Sociedade Civil, Estado e Hegemonia, presentes, de formas diferentes, nas obras desses três intelectuais que instigo um debate franco e aberto de democratizar a teoria e pensar uma forma de utilizar, não só esses autores, bem como os seus conceitos, nas aulas de história da educação básica. Há muito se pensa e discute, não apenas na academia, mas também em reuniões pedagogias, nas diretorias de ensino, nas escolas de educação básica e até em organizações sociais sem fins lucrativos, currículos e materiais para deixar as aulas, não apenas de História, mas de diferentes matérias, mais lúdicas e interessantes para os alunos. Se gasta milhões nas confecções de livros didáticos e paradidáticos com diversas metodologias diferentes, seja jogos virtuais, mapas mentais, uso do celular, Youtube e/ou seminários. Um entrave importante nesse processo é que uma parte do conteúdo dessas metodologias que se pretendem diferentes, ainda partem de uma educação tradicional euro-centrista e cada vez mais superficial, sem aprofundar as questões acerca das transformações sociais, políticas, econômicas e culturais da sociedade brasileira. Assim, o que propomos com esse artigo, mais do que uma tentativa metodológica, é pesar uma abordagem contra hegemônica, mas ainda universal, não apenas no Ensino de História, bem como em todas as matérias da educação básica. | ||
Palavras-chave: Educação Básica; História; Ensino | ||
por um ensino de história teórico na educação básica | ||
Apresentação | ||
O texto aqui apresentado é um conjunto de hipóteses formuladas com base na minha percepção acerca do ensino de história na Educação Básica gerado pela minha curta experiência, até aqui, como professor de história do estado de São Paulo. De forma simples, quero expô-las, pois acredito que mesmo sob ataques de políticas neoliberais articuladas pelo governo federal e estadual que acontecem desde 2017 na educação e de Ongs que interferem de forma orgânica nas políticas públicas estatais e se apoderaram do discurso de uma melhor gestão do dinheiro público para a educação, como a Fundação Lemann, Todos pela Educação e a Fundação Airton Senna, é possível pensar uma educação teórica e libertadora para os alunos e alunas das periferias, onde cada vez mais o sistema escolar é excludente. | ||
Atuo como professor no município de Santo André, localizada no ABC paulista, localidade que faz parte da região metropolitana da cidade de São Paulo, e das 87 escolas estaduais, espalhadas em 174, 840 km², eu atuei em 9. Todas elas com especificardes regionais únicas que deveriam ser observadas com profundidade para evitar a evasão escolar e crias um ambiente melhor para a aprendizagem das crianças. | ||
A lei de número 9.394 de vinte de dezembro de 1996, sancionada pelo presidente da república, Fernando Henrique Cardoso, criou as diretrizes e bases da educação nacional, a LDB. Essa lei foi um marco na educação brasileira, pois regulamentou o ensino público e privado, básico e superior no país, e quem, em um primeiro momento, pelo menos no papel, garantiu o acesso à educação pública para todos os brasileiros. | ||
Infelizmente, em se tratando de educação básica no Brasil, nem sempre o que está escrito na lei, “I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; ” é reproduzido no âmbito das escolas públicas. Em um país desigual, LGBTQ+fóbico, racista e machista, a escola, enquanto uma instituição fidedigna do universo da sociedade a qual ela está inserida, reproduz essa lógica, por mais que uma parte da comunidade escolar resista e se dedique a questionar os paradigmas dominantes dessa sociedade. | ||
Mesmo que no artigo 3, inciso II, a LDB diga que deve haver a “liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber” ele é genérico e pouco claro. No mesmo documento, alguns artigos adiante, determina-se que “Os Estados incumbir-se-ão de: [...], inciso III, “elaborar e executar políticas e planos educacionais, em consonância com as diretrizes e planos nacionais de educação, integrando e coordenando as suas ações e as dos seus Municípios; Dessa forma, ao passo que a lei garante a liberdade de cátedra para o professor, ela a delimita, pois permiti aos estados a produção de um currículo único, não levando em consideração as especificidades e desigualdades sociais, políticas e econômicas de cada região, estado, cidade ou escola. | ||
Em 2008, sob supervisão da secretaria de educação do estado, Maria Helena Guimarães Castro, no governo de José Serra, foi implementado no estado de São Paulo, o programa São Paulo faz escola. Esse programa teve o intuito de padronizar os currículos de todas as escolas do estado em um único material didático, as apostilas do Ensino Fundamental e Ensino Médio, o São Paulo faz escola, mesmo antes da implementação da BNCC e do Novo Ensino Médio, já inviabilizava um projeto pedagógico escolar autônomo e com base na realidade das escolas. | ||
Os caderninhos, como são chamados popularmente as apostilas, enviadas para todos os alunos da rede estadual, são materiais de apoio didáticos para todas as matérias desde o primeiro ano do Ensino Fundamental até o terceiro ano do Ensino Médio. São entregues para os alunos quatro apostilas por ano de cada matéria, artes, educação física, inglês, português, matemática, geografia, história, ciências, física, biologia, sociologia, filosofia e química. A intenção dessa padronização, segundo a secretaria de educação, é que o aluno possa acompanhar a matéria caso ele troque de escola no decorrer do ano letivo. Aqui não vamos dedicar uma análise acerca da questão, mas é preciso investigar a quem interessa ou interessou a impressão, anualmente, de uma quantidade milionária desse material didático. Tendo em vista que, segundo o senso de 2014, são 3,5 milhões de alunos que frequentavam as aulas no estado. | ||
Em 2018, foi eleito o governador João Dória e ele nomeou para secretário da educação o advogado chileno Rossielli Soares. Rossielli, como secretário da educação básica do governo de Michel Temer foi um dos articuladores do projeto do novo ensino médio. Em 2019, já como secretário, reorganizou o currículo paulista, adequando-o para as normas do novo ensino médio, aumentando a carga horário dos professores dentro das escolas e diminuindo ainda mais as poucas horas de estudos que os mesmos possuíam. O período matutino e vespertino que antes eram de seis aulas de cinquenta minutos passaram a ter as aulas de quarenta e cinco minutos, as atpcs que eram feitas em contra turno e tinham o máximo de cinco aulas de cinquenta minutos, passaram a ser realizadas no período (matutino, vespertino ou noturno) que o professor atua e a ser composta de 7 aulas de quarenta e cinco minutos, para aqueles que possuem carga horaria de quarenta horas semanais. O que aumento ainda mais o tempo do professor na escola, pois antes o professor ficava trinta e sete horas na escola e tinha três horas livres para fazer outras coisas, agora ele passa as quarenta horas na escola. Essa modificação implica diretamente em uma sobre carga de trabalho e uma perca significativa de estudos e preparação de aulas de qualidade. | ||
Rossielli não é professor de carreira e não possui formação em nenhuma licenciatura, sua escolha como ministro e como secretário da educação, não é pela sua atuação pedagógica ou experiência de ensino, mas sim porque ele é um dos principais organizadores das políticas empresariais na educação. A sua nomeação segue uma longa tradição de homens brancos universitários, com pouca ou nenhuma experiência de sala de aula para ocuparem cargos de confiança nos escalões mais altos onde se montam as políticas educacionais. | ||
Esse tipo de escolha é intencional e quase nunca são feitas para melhorar a vida dos profissionais de educação ou dos alunos, essa escolha faz parte de uma estratégia, política, econômica e social para sucatear as escolas públicas e impedir a ascensão social das classes subalternas. Quem pensa as políticas públicas de educação nunca precisou da educação pública, mas mais que isso, o secretario atual da educação paulista, faz parte da classe dominante, que não só quer passar para a iniciativa privada o controle administrativo das escolas, bem como pensa a escola como um lugar de contensão social e domesticação para a servidão. | ||
A escola é um campo de batalha | ||
O professor Paulo Freire já nos alertava que “seria uma atitude ingênua esperar que as classes dominantes desenvolvessem uma forma de educação que proporcionasse às classes dominadas perceber as injustiças sociais de maneira crítica”[1], mas menos que isso, as escolas paulistas, em sua maioria, se tornaram depósitos de crianças. | ||
Entendo que hoje, a estrutura de poder do Estado de São Paulo está ocupada por indivíduos que querem, não apenas garantir, bem como aumentar as desigualdades sociais, preservando os privilégios das classes mais altas, as custas das classes subalternas e a escola é um dos pilares para garantir essa desigualdade. Se uma educação libertadora poderia incitar as classes subalternas à entenderem suas condições sociais desiguais e superar os grilhões que os predem, uma educação repressiva e sem qualidade, evita que os mais pobres, não só não compreendam as desigualdades do mundo, como não conseguem acendam social e economicamente a partir de uma educação universitária e empregos seguros. | ||
Os indivíduos que possuem apenas o básico, ler e escrever, tornam-se mão de obra barata e subserviente. Para garantir essas desigualdades, portanto, é preciso que as classes dominantes pensem uma política educacional que seja hegemônica. | ||
Edmundo Dias descreve que a hegemonia não é apenas “obtenção de um domínio ideológico”[2], mas a junção da “capacidade de construção de uma visão de mundo (Weltanschauung) e a realização da Hegemonia”[3], ou seja, para ele a obtenção da hegemonia não está apenas no campo ideológico, mas na competência da classe “fundamental” “elaborar sua visão de mundo própria, autônoma”[4] e que as outras classes tomem para si essa visão de mundo. A garantia de se obter a hegemonia é uma excessiva articulação de “políticas” de convencimento a serem feitas. | ||
A capacidade que uma classe fundamental (subalterna ou dominante) tenha de construir sua hegemonia decorre de sua possibilidade de elaborar sua visão de mundo própria, autônoma. Esse processo de “construção de hegemonia”, que decorre no cotidiano antagônico das classes, decorre da capacidade de elaborar sua visão de mundo autônoma e da centralidade das classes. Essa centralidade, tomada como “síntese de múltiplas determinações”, e não como um a priori lógico, como um “efeito da estrutura”, é determinante no exercício da hegemonia. Diferenciar-se, comportarem-se como visão de mundo ás demais classes, afirmar-se como projeto para si e para a sociedade ser direção das classes subalternas e dominadas na construção de uma nova forma civilizatória. Para tal é fundamental, ter a capacidade de estruturar o campo de lutas a partir do qual poderá determinar suas frentes de intervenção e articular suas alianças.[5] | ||
A escola é uma instituição que transmiti a visão da classe dominante, pois quem elabora os currículos são indivíduos que estão no poder político, social e econômico do estado. Eventualmente pode haver uma ou outra resistência de professores dentro das escolas, porém a estrutura não permite que se pense uma escola além daquela que quem está no controle do estado quer. | ||
Dória, assim como seus antecessores, propositalmente, não investiu na formação acadêmica dos professores, os poucos professores mestres e doutores da rede, em sua maioria, buscam essa formação por fora. Os profissionais da educação não são valorizados economicamente e, por consequência socialmente, nós estamos sem reajuste salarial há oito anos. Além da piora da qualidade do trabalho, não há melhorias nas infraestruturas físicas e tecnológicas das escolas, o abandono material dessas instituições colabora com a visão que a sociedade possui, não só das escolas públicas, mas de tudo o que é público, de que essas instituições não funcionam, não garantem a aprendizagem dos alunos e, quando comparadas com as escolas privadas, as julgam inferiores, abrindo assim cada vez mais a ideia de privatizar as escolas públicas. | ||
Assim as escolas possuem dois objetivos para a classe hegemônica, o de controle social, a partir de uma educação para a servidão e o segundo, de uma fonte de arrecadação de dinheiro em uma eventual privatização administrativa dessas escolas. | ||
Um dos conceitos que Gramsci aponta como fundamental para se constituir a hegemonia é o conceito de Partido. A noção de partido para Gramsci não se restringe ao partido eleitoral, mas sim que partido é um organismo que organiza e que reúne em sua estrutura um conjunto de ideias, uma Ong, por exemplo, pode ser um partido. É o partido que a partir das ideias dos intelectuais orgânicos que elabora uma determinada visão de mundo. Eles que realizam a “tarefa de desconstrução/construção, deve mobilizar as vontades. Organizá-las, dar-lhes homogeneidade e sentido”[6]. | ||
Portanto, para constituir hegemonia, a classe fundamental necessita de convencer as demais classes a adotarem sua visão de mundo, desse modo elas se utilizam desses “Partidos” e “Intelectuais Orgânicos” para disseminar essa visão. | ||
Na nota número 1, dos Cadernos do Cárcere, Gramsci, (Caderno 12. Volume 2 Edição Brasileira), faz uma discussão acerca do que ele entende como intelectuais, classificando-os em diversas categorias, como eles são constituídos entre as diversas frações de classe e partidos. | ||
1) todo grupo social, nascendo no terreno da produção econômica, cria para si, ao mesmo tempo, organicamente, uma ou mais camadas de intelectuais que lhe dão homogeneidade e consciência da própria função, não apenas no campo econômico, mas também no social e político[7]. | ||
Os níveis desses intelectuais são variados “o empresário capitalista cria consigo o técnico da indústria, o cientista da economia política, o organizador de uma nova cultura, de um novo direito”[8]. Cada política educacional aplicada no estado terá um intelectual que pensou essa política e também a articulou, levando à uma prática que beneficia o grupo da sociedade que o formou, mas sua propaganda tende a convencer o resto da população que essa visão de mundo é benéfica para todos como por exemplo, a formatação do novo Ensino Médio. | ||
O Partido para Gramsci é a fusão de vários elementos em uma única estrutura um desses elementos fundamentais é o papel dos “intelectuais orgânicos”, que auxiliam na organização do pensamento e da estrutura da sua classe, outro elemento dessa estrutura são os “organismos designados vulgarmente como privados”, que servem para proliferar as ideias dessa classe. Esses organismos estão ligados a princípio na Sociedade Civil que, em um primeiro momento para o autor, é um nível da estrutura separado do Estado (sociedade política). | ||
Seria possível mediar a “organicidade” dos diversos estratos intelectuais, sua conexão mais ou menos estreita com um grupo social fundamental, ficando uma gradação das funções e das superestruturas de baixo para cima (da base estrutural para o alto). Por enquanto, podem-se fixar dois grandes “planos” superestruturais: O que pode chamar de “Sociedade civil” (isto é. conjunto de organismos designados vulgarmente como “privados”) e o da “sociedade política ou Estado”, planos que correspondem, respectivamente, a função da “hegemonia” que o grupo dominante exerce em toda a sociedade e àquela de “domínio direto” ou de comando, que se expressa no Estado e no governo “jurídico”.[9] | ||
Posteriormente o autor entende que as duas estão entrelaçadas, ligadas, são dois lados diferentes, as leituras dos cadernos nos possibilitam visualizar ligação entre a Sociedade Civil e Sociedade Política, uma atua na outra de forma dialética, ou seja, Sociedade Civil e Sociedade Política não se separam. É o que entendemos como Estado Ampliado. A Sociedade Civil através dos partidos e dos seus transmissores ideológicos exercem uma influência nas políticas adotadas pelo Estado, o Estado por sua vez, centraliza seus aparelhos coercitivos para a manutenção da hegemonia. | ||
Estas funções são precisamente organizativas e conectivas. Os intelectuais são os “prepostos” do grupo dominante para o exercício das funções subalternas da hegemonia social e do governo político, isto é: 1) do consenso “espontâneo” dado pelas grandes massas da população à orientação impressa pelo grupo fundamental dominante da vida social, consenso que nasce “historicamente” do prestigio (e, portanto, da confiança) obtido pelo grupo dominante por causa da sua posição e de sua função no mundo da produção; 2) do aparelho de coerção estatal que assegura “legalmente” a disciplina dos grupos que não “consentem”, nem ativa, nem passivamente, mas que é constituído para toda a sociedade na previsão dos momentos de crise no comando e na direção, nos quais desaparece o consenso espontâneo.[10] | ||
Os aparelhos coercitivos do estado aparentemente são a polícia, GCM e o exército, entretanto coerção também são as pressões que os agentes superiores exercem nos agentes inferiores. Os dirigentes de ensino pressionam os supervisores que, consequentemente, pressionam os diretores e os coordenadores das escolas implementarem as normas que foram votadas pelos parlamentares. Assim, os coordenadores e professores, os profissionais mais abaixo da cadeia da educação paulista, reproduzem as normas e o currículo de maneira integral e cordial com medo das represarias que possam sofrer. É comum ouvir em reuniões pedagógicas, do diretor e das condenações, que não adianta discutir com o que está escrito, é para aceitar e realizar, pois é que o que é para fazer. | ||
Contudo é imprescindível verificar que as formas de dominação do sistema capitalista se modificam, mesmo porque, ao mesmo tempo, as classes subalternas não aceitam as condições impostas pelas classes dominantes de maneira passiva, sem resistências e sem possibilidades de constituir uma alternativa ao sistema capitalista, uma “nova civilità”. Com isso partilhamos da síntese de Edmundo Dias que define hegemonia: | ||
Hegemonia: projeto que permite expressar o programa, horizonte ideológico, no qual as demais classes se movem. Horizonte que, ao proceder à padronização, ao “conformismo”, desorganiza, inviabiliza, ou tenta, os projetos das demais classes. Desorganiza ativa ou passivamente; ativamente ao sobrepor com o seu projeto aos outros projetos e assim descaracterizá-los; passivamente pela repressão pura e simples aos demais projetos. Horizonte que é estruturação do campo das lutas, alianças, do permitido e do interdito. Racionalidade de classe que faz história e que obriga as demais classes a pensa-se nessa história que não são delas.[11] | ||
Por um ensino de história contra hegemônico | ||
Dois elementos foram fundamentais para iniciarmos uma mudança nas narrativas históricas aprendidas nas escolas de ensino básico, a primeira foi a lei que garantiu as cotas raciais nas instituições públicas de ensino superior e a segunda foi a lei número 10.639/2003, que acrescentou na LDB, os artigos 26 -A e 79-B. O primeiro, garantiu o ensino de história e cultura afro nas universidades e nas escolas e o segundo, oficializou o dia nacional da consciência negra, comemorado no dia 20 de novembro. | ||
É inegável que as cotas raciais e para pessoas trans tornaram as pesquisas universitárias mais plurais, ampliando as fontes e os sujeitos a serem pesquisados, criando para os professores das escolas de ensino base uma gama de materiais palpáveis para questionar a história oficial e criar uma educação contra hegemônica, antirracista, antissexista e antiLGTBTQ+fóbica. | ||
As cotas também proporcionaram o aumento de profissionais com ensino superior pretos nas escolas públicas, a representatividade desse avanço é significativo principalmente para os alunos de escolas periféricas ao observarem que quem dá a aula de história, quem fala sobre a África, é um professor preto ou uma professora preta. | ||
Mesmo com essas modificações nas leis de diretrizes e base da educação e com os ganhos sociais até aqui, essas ações paliativas ainda não cumpriram o papel de igualar a enorme desigualdade racial que vivemos nesse país. Estamos muito longe de possuir igualdade étnica nas figuras dos professores do ensino básico e também no ensino superior. | ||
O primeiro passo para que possamos transformar nossa sociedade é lutar não apenas por uma escola que seja pública, gratuita e de qualidade, para além dessa concepção, todas as decisões estruturais e de currículo devem ser discutidas e tomadas de forma coletiva, ouvindo e interagindo com pais, estudados, professores, coordenadores, inspetores, faxineiros, merendeiros e etc. | ||
Para a sobrevivência do Público, é preciso que se distinga radicalmente entre público e privado. Público é um bem-comum gerido democraticamente, é uma “instituição” social: privado é uma propriedade de alguém, uma “organização” administrada privadamente – tanto do ponto de vista do locus de poder quanto dos métodos. A concepção de sociedade neoliberal coloca a “organização empresarial” no centro das políticas sociais e do próprio Estado[12]. | ||
Dessa forma o que os alunos aprendem nas escolas é um conteúdo muito além do curricular, os alunos aprendem a tomarem decisões comunitária, a respeitar as falas dos colegas, a viver em comunidade a entender o seu lugar social, formando não apenas um aluno plural, mas uma escola mais igualitária, pois reforça a ideia de coletivo das comunidades no entorno das escolas. | ||
A segunda questão que ponderamos aqui é que deve manter e ampliar as políticas de cotas raciais, sociais e de gênero para os concursos e contratações de professores, assim a representatividade também estará presente nos lugares de destaque, nos primeiros contatos com as crianças. As cotas são reparações sócias necessárias para que a escola e a universidade se tornem espaços mais plurais e represente de fato o que é a nossa sociedade, sem diferenças de salários ou tratamento. | ||
A terceira e última importante questão que coloco aqui para pensarmos uma educação melhor é rejuvenescer os professores das escolas públicas e garantir que todos possuem uma formação não só universitária, mas que eles também lecionem nas suas matérias de origem. No senso da educação básica de 2015 a 2019, dos 270.958 professores que atuam na educação básica dos anos iniciais e finais, 87,2% dos professores que atuavam como professores de português possuíam licenciatura em língua portuguesa, 84,6% em matemática e apenas 10,1% dos professores que ministram as matérias de língua estrangeiras possuíam licenciatura na área equivalente. Somando todos os professores do Ensino Fundamental anos iniciais e finais e Ensino Médio apenas 35,7% dos professores possuem alguma especialização latus ou stritus senso. | ||
É comum nas escolas paulistas professores de todas as matérias lecionarem substituindo outros professores, muitas vezes essa substituição não é feita com o professor da mesma matéria. A secretaria de educação do Estado de São Paulo, possui a partir do cadastramento dos seus funcionários, na secretaria digital, todas as informações necessárias acerca da vida funcional de cada um dos concursados da pasta. Seria muito fácil, não apenas antecipar as faltas de professores, bem como substitui os professores afastados e preencher as vagas dos professores aposentados a partir de concursos. | ||
A falta de professores, o envelhecimento da categoria e o descaso com o plano de carreira, contribui para a insatisfação docente e respinga no aprendizado das crianças, logo na qualidade das escolas públicas. Investir em um plano de carreira que valorize o ensino e a pesquisa e capacite, não apenas os profissionais da educação que estão na ativa, bem como incentivem os jovens a ingressarem nas licenciaturas e optarem pela carreira docente, também colabora com o aumento da autoestima desses profissionais e com a melhora na qualidade do Ensino. | ||
A classe dominante sabe muito bem disso, por isso a privatização da educação vai além da lógica neoliberal de transformar o que antes eram serviços públicos em novas formas de extração do capital, educação também é controle e visão de mundo. | ||
A destruição do sistema público se dá paulatinamente pela introdução dos objetivos e processos das organizações empresariais no interior das instituições públicas. Com isso, a escola passa a ser uma “empresa” educacional, com procedimentos operacionais e não mais procedimentos típicos de uma instituição pública, homogeneizando-a a forma de uma “operação empresarial” com objetivos, processos, tempos e formas de controle definidos[13]. | ||
A reforma educacional proposta pelos governos liberais, tanto do PT, cabe lembrar que o projeto do novo ensino médio nasceu ainda no governo Dilma, retomada por seu sucessor, Temer, e aplicada agora, governo Bolsonaro, enfatiza que o problema da educação está na gestão pública e na falta de capacidade dos professores em se atualizarem. Com a mudança para gestões privadas da administração das escolas é mais fácil controlar o que os professores lecionam e por sua vez o que os alunos aprendem. | ||
Isso ainda permite que outro objetivo central do neoliberalismo seja atingido: ao obter, pelo acesso à gestão, o controle do processo educativo da juventude, instala a hegemonia das ideias neoliberais – e permite, por exemplo, a atuação de movimentos como o da “escola sem partido”, que coíbe as demais visões alternativas e críticas no interior das escolas[14]. | ||
Um professor que possui tempo para pesquisar, ver filmes, assistir série, ir ao cinema, ir ao teatro adquiri para si uma gama de informações e referências que podem e devem ser inseridas nas suas aulas, auxilia na formação ampla também dos seus alunos. Formam alunos que contestam visões fechadas de sociedade. Expandir o conhecimento do professor é expandir o conhecimento dos alunos. | ||
A solução para uma educação de qualidade não é otimizar o tempo dos professores para que eles produzam mais, não é preencher planilhas ou analisar dados estatísticos de aprendizagem a partir de questões fechadas e objetivas, a escola não precisa possuir Isso 9001 ou implementar os cinco S para uma melhor vivência e aprendizado, para isso, deve-se fazer justamente o oposto, é preciso permitir que visões conflitantes aflorem no âmbito das instituições, é investir em quadras poliesportivas e em materiais esportivos, em anfiteatros, em tecnologias para que a escola pública sai do século XIX e venha para o século XXI, é quebrar a quarta parede da escola, permitindo que a comunidade ingresse e usufrua do bem público que existe nas dependências da mesma. A escola tem que ser dialética com a sua comunidade. | ||
[1] FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005 | ||
[2] DIAS, Edmundo Fernandes. Hegemonia: Racionalidade que se faz história. Versão modificada do artigo “Hegemonia: nova civilità ou domínio ideológico”, publicado pela revista História & Perspectivas, nº 5, julho-dezembro de 1991, Universidade Federal de Uberlândia. p. 10 | ||
[3] Idem. | ||
[4] Idem. | ||
[5] Idem. | ||
[6]Ibidem, pág. 11 | ||
[7]GRAMSCI, Antônio. Cadernos do Cárcere. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2001. p.15 Vol. 2 | ||
[8]Idem | ||
[9]Ibidem p.20 | ||
[10] Ibidem p.21 | ||
[11] DIAS, Edmundo Fernandes. Hegemonia: Racionalidade que se faz história. Versão modificada do artigo “Hegemonia: nova civilità ou domínio ideológico”. p. 34. op. cit.. | ||
[12] FREITAS, Luiz Carlos de. A reforma empresarial da educação: nova direita, velhas ideias. São Paulo, Expressão Popular, 2018. p. 54. | ||
[13] Ibidem, p. 55 | ||
[14] Idem |