Por que ganhar pelo placar mínimo é tão estranho para quem torce para o Galo?
Nós até somos calejados pelas mais doídas derrotas, mas já vibramos com alegria nas mais variadas, deliciosas e inesquecíveis vitórias. Tem um punhado de 2x0 épico por aí, um par de inacreditáveis e históricos 4x1, viradas de toda sorte e goleadas memoráveis, que até quem estava de costas se lembra. Mesmo assim, parece que nada é mais estranho para quem torce para o Galo do que ganhar de 1x0. | ||
Não deveria ser. O primeiro Campeonato Brasileiro foi conquistado pelo Atlético em uma vitória pelo placar mínimo, contra o Botafogo, no Rio. Na única final nacional entre times mineiros, o jogo da taça também foi 1x0 para o Galo. Gol de Tardelli, ainda fresco na memória. | ||
Talvez seja isso: uma exclusividade das datas nobres. Porque no dia a dia, no feijão com arroz do Brasileirão, o 1x0 tem um sabor incompreendido ou incompreensível. Ninguém sabe lidar. | ||
Sofrer por quase tomar o empate e vibrar aliviado no final até que a turma assimila mais ou menos bem (uns mais, outros menos). O que parece tirar do sério mesmo é chegar pertíssimo do segundo gol e não fazer. A sensação é que o pessoal se irrita mais com isso do que nas derrotas. Fica sem rumo. | ||
Acabou! Pode comemorar, três pontos... Não. Quem torce pro Galo não lida bem com 1x0. | ||
Parece que faltou alguma coisa. Algum tempero. Aquele lance que alguém prendeu a bola no ataque com o outro livre do lado... Aquele gol perdido no final, cara a cara, no contra-ataque. | ||
A Beth Carvalho já está repetindo o "Vou Festejar'' pela terceira vez no som depois do apito final, mas o gol perdido pelo Galo ainda martela. "Poxa, era só tirar do goleiro, não sabe matar o jogo..." | ||
Vale a ressalva que se for o 1x0 suado, arrancado no finalzinho, tipo comida feita na hora para quem está com fome, até vai. Mas, fazer um gol no início e simplesmente cozinhar o jogo até o fim, sem tomar gol, nem mesmo passar perto de tomar o empate? Aí não. Tá errado. Pode saber que tem caroço no angu. Os planetas se desalinharam, uma tragédia está por vir, sei lá. Para quem torce para o Galo, isso não faz sentido. | ||
O 1x0 é até o sonho de consumo de alguns que conheço. Se outras torcidas invejam nossas viradas e nossos desempates inacreditáveis, por aqui tem quem admita sonhar com um Galo pragmático, capaz de fazer pouco e ganhar muito, igual alguns times que nos tomaram o Brasileirão nos últimos anos. | ||
Nesse caso, parece literalmente o sonho de consumir uma vitória. Meio fast-food assim. "A oferta do dia é o combo 1x0: gol no primeiro tempo, uma bola na trave chutada pelo adversário e três pontos no final. Junte 25 dessas e ganhe seu prêmio". | ||
Compreensível que muita gente ache sem graça e prefira pagar um pouco mais por um molho extra ou optar pelo à la carte. Escolher tudo que tem no cardápio, de bom e de ruim, e no fim conferir a conta, que às vezes é terrivelmente cara, mas saboreia-se muito mais. | ||
Quem torce para o Galo é um cliente complicado, do tipo que não sabe o que quer. A pedida inicial, muitas vezes, é: "meio a zero hoje é goleada!". Mas, se vem o 1x0, a porção em dobro, está ruim. Vamos reclamar com o garçom. Ou com o mestre cuca, mesmo se ele estiver sem alguns ingredientes: fora de casa, com seis desfalques. | ||
Um a zero para nós é meio indigesto. Não é ruim, mas o sabor é inusitado, meio agridoce. Talvez um dia a gente se acostume a saboreá-lo assim: no dia a dia, a qualquer hora, servido frio. Quem sabe neste ano. E aí não faria mal repetir o prato na ceia final mais uma vez. | ||
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