O uso eficiente de uma deficiente em uma campanha ineficiente
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O uso eficiente de uma deficiente em uma campanha ineficiente

A verdade é que se tem alguém deficiente nessa chapa a presidente essa pessoa é Simone Tebet;

HS Naddeo
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Geralmente as pessoas olham pra quem está sendo beijado, ou ao menos fecham os olhos.
Geralmente as pessoas olham pra quem está sendo beijado, ou ao menos fecham os olhos.

Simone Tebet escolhe usar Mara Gabrilli como vice em sua chapa

De cara preciso dizer: não tenho nada contra a senador Mara Gabrilli ser candidata a vice-presidente, fosse de quem fosse. Mas, em se tratando de Simone Tebet, e dos sequentes discursos que ela tem feito, não consigo deixar de ser cético quanto ao propósito da escolha e enxergar o fato como exploração da condição de deficiente física como ferramenta de marketing de uma campanha fadada ao fracasso. É até possível que qualquer candidato fosse acusado de explorar a condição de Mara Gabrilli caso a escalasse para vice. Mas, vindo de Simone Tebet, lastreado pelo papinho de "mulher vota em mulher", a apelação soa muito mais grosseira.

Honestamente, não esperava dedicar mais do que 2% dos parágrafos dos meus artigos para falar de Simone Tebet, mas o anúncio da escolha de sua vice me forçou a dizer o que penso sobre o assunto.

A senadora Mara Gabrilli tem uma carreira de verdade. Não dependeu do nome do pai para entrar na política e usou com honestidade sua carreira para promover a causa dos deficientes, primeiramente em São Paulo e depois no Brasil. Em sua primeira tentativa como candidata a vereadora em São Paulo terminou como suplente, mas foi convidada e dirigiu a Secretaria Municipal da Pessoa com Deficiência e Mobilidade.

Nesse cargo "desenvolveu dezenas de projetos na cidade de São Paulo em infraestrutura urbana, educação, saúde, transporte, cultura, lazer, emprego, entre outros. Isso resultou no aumento de 300 para cerca de 3 mil do número de ônibus acessíveis; na reforma de 400 quilômetros de calçadas adaptadas, inclusive na Avenida Paulista, que se tornou modelo de acessibilidade na América Latina; na criação de 39 núcleos municipais de reabilitação e saúde auditiva; no emprego de mais de mil trabalhadores com algum tipo de deficiência; nas versões em braile ou áudio de todos os livros das Bibliotecas Municipais (Ler pra Crer); na ida de 14 000 pessoas com deficiência ao cinema, teatro e exposições; entre outros" como consta na sua página na Wikipedia.

Em 2007 assumiu a vaga do titular e em 2008 conseguiu se reeleger, onde ficou até 2011.  Nesse período apresentou 60 projetos de lei. Sete foram aprovados e são Leis Municipais. Em 2014 foi eleita deputada federal. Como deputada federal, protocolou 57 projetos de lei, 2 propostas de emenda à Constituição e foi relatora de 17 projetos de lei, também segundo a wikipedia. Em 2018 candidatou-se ao Senado Federal sendo eleita e, com isso, deixando de fora Eduardo Suplicy, a outra vaga ficou com Major Olímpio. Na eleição presidencial do mesmo ano apoiou Doria ao governo de São Pulo e Geraldo Alckmin para a presidência. No segundo turno estadual manteve o apoio a Doria e declarou "apoio crítico" a Jair Bolsonaro.

Consta também em sua página na Wikipedia que "durante o período pré-eleitoral, Mara recebeu convite para ser vice de Jair Bolsonaro, mas ela recusou o convite por discordar de inúmeros posicionamentos do presidenciável". Sinceramente, eu não consigo crer que seja verdade, mas também não consegui desmentir. O que consegui além da wikipedia foi uma entrevista da própria Mara Gabrilli dada à Jovem Pan, que você pode ler clicando aqui. Mais nada.

Filha do ex-governador, ex-senador, ex-prefeito, ex-ministro e ex-deputado estadual Ramez Tebet, Simone Tebet tem uma carreira baseada no nome do pai. Foi prefeita de Três Lagoas, no Mato Grosso do Sul, cidade onde nasceu e da qual seu pai também foi prefeito e manda chuva político por muitos anos. Renunciou ao mandato para se eleger deputada estadual. Depois renunciou ao mandato para se tornar vice-governadora do MS na chapa de André Puccinelli. E em 2014 foi instada a se candidatar à governador após a prisão do governador Puccinelli, mas desistiu por alegadas" questões familiares" e saiu candidata ao senado e foi eleita. Talvez as tais questões familiares tenham mais a ver com o histórico de André Puccinelli, de quem foi vice, do que com a família. Um dos títulos da página dele na wikipedia é esse: Procesos, polêmicas e prisões. Também não a estou acusando de nada.

No Senado Federal Tebet se notabilizou por ter sido líder de bancada da bancada do MDB na casa e por ser a primeira mulher a dirigir a Comissão de Constituição e Justiça, se não a principal, uma das principais comissões do Senado. Sua posições como senadora valem a citação de trecho de sua página da Wikipedia:

Em agosto de 2016, votou a favor do processo de impeachment de Dilma Rousseff. Em dezembro daquele mesmo ano, votou a favor da PEC do Teto dos Gastos Públicos.Nas eleições para a presidência do Senado Federal do Brasil em 2017, Simone esteve como pré-candidata à presidente da casa. Porém, seu partido indicou o senador Eunício Oliveira para disputar tal cargo. Em julho de 2017, a senadora votou a favor da reforma trabalhista.Em outubro de 2017 votou a favor da manutenção do mandato do senador Aécio Neves derrubando decisão da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal no processo onde ele é acusado de corrupção e obstrução da justiça por solicitar dois milhões de reais ao empresário Joesley Batista.Em 2019, a senadora disputou a indicação de seu partido para a candidatura à presidência do Senado Federal. No entanto,Renan Calheiros foi indicado, perdendo a eleição entre os seus correligionários por 7 votos a 5. Posteriormente, Simone lançou candidatura avulsa ao cargo, mas acabou desistindo para aumentar as chances de uma vitória de Davi Alcolumbre (DEM) sobre Renan Calheiros, o que acabou se concretizando.Em junho de 2019, votou contra o Decreto das Armas do governo, que flexibilizava porte e posse para o cidadão.

Além da questão da deficiência, mas também em decorrência dela, a escolha de Simone Tebet tem um interesse muito claro. Ela, Tebet, foi eleita em 2014 com 640.336 votos, e, segundo consta, dada sua fraca atuação como senadora e as pessoas com quem se aliou e a maneira como se portou na CPI da Pandemia, corria sério risco de não se reeleger para a vaga de senadora. Já Mara Gabrilii foi eleita 2018 com nada mais nada menos do que 6.513.282 votos. Ou seja, ela, Gabrilli, eleitoralmente vale 10 Tebets. Precisa dizer mais alguma coisa?

O fato é que ao escolher Mara Gabrilli, sem demérito algum à sua atuação política  (ainda que eu tenha lá minhas divergências), Simone Tebet tenta se apropriar não apenas da causa que a senadora cadeirante representa, mas dos votos que Simone Tebet jamais receberia, mesmo que se candidatasse pelo maior colégio eleitoral do país. A mulher que vota em mulher deixou que duas mulheres, Dras. Nise Yamaguchi e Maira Pinheiro, fossem massacradas por um bando de homens (nem todos seriam) covardes na CPI da Pandemia e sem defendê-las de ataques vis, baixarias e depreciação de suas condições femininas. Defendeu ainda que "não é só porque desviaram dinheiro da pandemia que governadores devem ser investigados na CPI".

Simone Tebet é a banda podre da ala feminina do Senado Federal, que colocou suas pretensões (não passarão disso) acima da realidade dos fatos e decidiu, como todos os outros, também fazer da oposição a Jair Bolsonaro sua plataforma de campanha eleitoral, pois não tem absolutamente mais nada a oferecer ao país. Seu único mérito é ter rachado o MDB para que não caísse inteiro no colo de Lula, como queria Renan Calheiro e sua quadrilha, o que também não significa que a parte que a apoiou como candidata vai realmente fazer campanha para sua candidatura. Esta ala, inclusive, deve apoiar Jair Bolsonaro no segundo turno, fazendo contraponto no partido à turminha de Renan.

A verdade é que se tem alguém deficiente nessa chapa a presidente essa pessoa é Simone Tebet. Mara Gabrilli tem uma causa acima da causa político partidária, o que, politicamente falando, a torna apenas limitada em suas condições motoras, enquanto Simone Tebet é limitada inclusive politicamente. Mas, admito, é muito esperta. Está sabendo explorar a visibilidade que tem e sabe também que será muito mais simples justificar uma derrota à presidência - provavelmente usará misoginia e falta de compaixão à causa da deficiência quando perder - do que justificar uma derrota à uma tentativa de reeleição ao Senado ou ao governo do Mato Grosso do Sul.

Finalizando, o mais certo disso tudo é que haverá mais uma gastança desnecessária do dinheiro do pagador de impostos para financiar uma candidatura que já nasce inviável e elas deverão mesmo é cair no colo de Lula - se houver segundo turno.


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