BBB e o Cancelamento
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BBB e o Cancelamento

Big Brother e a cultura do cancelamento.

Ramon Penteado
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Big Brother.

Eu confesso que acho meio patético que tenhamos que falar sobre um programa tão vazio como Big Brother. Porém, é inegável que seu impacto, infelizmente, seja estrondoso em nossa sociedade.

Um dos poucos orgulhos que tenho em minha vida, é de poder dizer que eu não sei absolutamente NADA deste programa. Não sei quantas temporadas tem, quanto tempo dura, quando começa, quando termina, quem participa ou participou. Apenas sei que multidões pagam pacotes especiais de televisão para poderem acompanhar os participantes 24hs por dia. E sei também que pagam um milhão de reais, ou algo assim, para o vencedor.

Eu comecei com a ideia de falar sobre a frase do Fiuk “se desculpando por ser homem”, que tomou conta das redes sociais estes últimos dias. Mas hoje pela manhã, eu vi uma postagem do Ícaro de Carvalho, onde uma pessoa perguntava a opinião dele sobre o Fiuk. E ele disse mais ou menos assim: “Deixem o rapaz em paz, vocês ficam o dia todo procurando coisas pra xingar ele”. E isso me fez parar e refletir que ele tinha razão. O problema está muito longe de ser o Fiuk.

Um jovem que se deu ao trabalho de procurar um “profissional” para se adequar às normas da desconstrução social, realmente é o reflexo do que nos aguarda no futuro. Seres desprovidos de masculinidade, que acreditam fielmente que ser homem é uma desgraça. Se não fizermos nada e ficarmos apenas de braços cruzados, assistindo nossa sociedade, cultura, costumes, despencarem, olharmos para o “ilis”, “dilis”, ou “Elu” e apenas dermos risada, sem dúvida, teremos mais Fiuks do que qualquer tipo de “homem comum”. E não estou falando de físico, genialidade, dinheiro, nada disso. Estou falando do homem provedor, protetor, que respeita a sua mulher e a prove de segurança. Hoje, pagar a conta, abrir a porta, “brigar” com algum desrespeitoso que mexeu com ela na rua, são sinais de machismo para muitos. Amanhã, nascer com o órgão sexual masculino, será hediondo.

E isso vale para mulheres também. Ou vocês acham que a “Karol Comka” – e eu demorei para entender que o sobrenome era uma alusão ao “K” de seu primeiro nome – não é um retrato do que as meninas de hoje estão absorvendo do mundo? Um mundo que é exposto para elas como “dominado por predadores sexuais que devem ser vaporizados, pois representam o que há de pior na nossa sociedade” e mais, que não existe masculino e feminino, ele ou ela, dela ou dele. Tudo é neutro. Não existe identidade.

Entendam: Revoluções repentinas deram errado e então revolucionários aprenderam que, o plano no longo prazo teria muito mais chance de dar certo. E este plano de longo prazo é justamente isso: incutir, aos poucos, na mente do povo, novos padrões. Padrões que atendam aos anseios progressistas mais profundos.

Nas distopias “Fazenda dos Animais” – Revolução dos Bichos – e “1984”, conforme o tempo passa, os novos habitantes já não sabem mais como as coisas eram antes, pois nasceram num mundo totalmente transformado e, por sua vez, os velhos já têm dificuldade de lembrarem-se da vida antes da revolução, afinal, a história já fora alterada inúmeras vezes, o “normal” já passou por inúmeras reformas.

Graças a Deus, a esquerda, os progressistas, não aprenderam que imposições e revoluções forçadamente repentinas não funcionam tão facilmente com o ser humano. A autofagia do movimento já começa dar sua cara. “Cancelem a cultura do cancelamento”, publicou a página do “Quebrando o Tabu”. Ser chato, cansa os outros.

Mas vejamos o objetivo por trás destes “cancelamentos”.

George Orwell – e não me crucifiquem por citá-lo novamente, o que posso fazer se suas obras retratam maravilhosamente bem nossa sociedade – em “1984”, descreve o que seria o “cancelamento”.

Se você me acompanha no Instagram, viu que ontem postei no feed uma introdução do que falaria hoje, citando a Polícia das Ideias – se não me acompanha, deveria -. A Polícia das Ideias descrita por Orwell é o retrato dessa militância virtual que existe hoje. Que passa o dia fiscalizando redes sociais de opositores para conseguir uma frase que não esteja conectada com seus objetivos para que, através de uma captura de tela, destrua a reputação de uma pessoa.

Deixe-me fazer uma breve contextualização sobre o livro.

Winston, o personagem principal de 1984, é um cidadão comum. Trabalha, bebe um Gin e dorme. Está acostumado com aquela rotina tensa de, diariamente, ter que controlar seus pensamentos, palavras e atitudes. Winston, assim como todos os habitantes da Oceania, ou pelo menos aqueles que são considerados gente, trabalha para o Partido.

Winston Smith é funcionário do Ministério da Verdade e, pasmem: Sua função é alterar as notícias nas quais o Governo tenha cometido qualquer tipo de “equívoco”. Um equívoco seria, por exemplo, informar que a produção de chocolate dobraria em fevereiro, porém, passado o mês, a produção foi menor que em janeiro. Winston tomava o jornal com esta notícia, alterava “fevereiro” para “abril” e, como num passe de mágica, o Partido não havia cometido nenhum “equívoco”. Mas sobre isso, falaremos em outra oportunidade com mais detalhes. Este livro é simplesmente fantástico para abstrações de fatos contemporâneos.

Acontece que Winston tinha, dentro de si, uma necessidade premente de se conectar com algo ou alguém. Winston sentia necessidade de ser um indivíduo. Tentava conversar com os mais velhos para ouvir histórias de como era o mundo antes do “Grande Irmão” tomar posse do partido. Ele mesmo tinha breves lembranças de alguns fatos da sua infância. “O chocolate tinha um gosto diferente”, lembrava. Chegou até a se relacionar com uma moça, também, digamos, “reacionária” para os padrões do mundo.

Não vou contar o final do livro. Pelo menos não agora. Vou me ater a fatos diretamente ligados ao que estamos conversando agora.

A cidade era infestada de câmeras que vigiavam todos os habitantes. Na verdade, estas câmeras eram chamadas de Teletela pois, além de vigiarem, também passavam os recados e mensagens e novas regras do Grande Irmão, o Big Brother.

Das muitas regras ditadas pelo Big Brother, duas merecem destaque:

A Novilingua era uma linguagem nova como se pode imaginar, mais simplificada, com palavras que abrangiam conceitos inteiros, minando da população a necessidade de se prover de um extenso vocabulário. Na prática, retirando da população a capacidade de pensar. Perceberam a semelhança? Isso foi escrito em 1949 como uma crítica ao Regime Socialista Soviético genocida de Stalin. Deixem isso anotado na mente de vocês. 

A outra regra era o Duplipensar que, segundo a própria obra, era “O poder de manter duas crenças contraditórias na mente ao mesmo tempo, de contar mentiras deliberadas e ao mesmo tempo acreditar genuinamente nelas, e esquecer qualquer fato que tenha se tornado inconveniente.”. Ou seja, a total perda da consciência. Não existe certo ou errado, porém o Partido diz o que é certo.

Poderia retirar mais uma dúzia de paralelos desta obra com os dias atuais, mas creio que já conseguimos formar um argumento bastante convincente, não conseguimos?

Lembram-se da Polícia das Ideias. Pois é. Bastava algum descumprimento destes preceitos que ela te encontraria e você seria “vaporizado”. Ou devo dizer, “cancelado”?

Se trouxermos para nossos dias atuais a situação seria essa: Não usou pronome neutro? Cancelado! Não citou todas as letras do movimento LGBT? Cancelado! Não apoia o BLM? Cancelado! Apoia a religiosidade opressora? Cancelado! Não gosta de Paulo Freire? Cancelado!

E o duplipensar? Querem ver? Objetificar mulher é motivo de cancelamento! Mas Anitta subir num palco seminua é empoderamento! Aborto deve ser legalizado! Mas porte de armas deve ser terminantemente proibido! Quem não usa máscara deveria ser preso! Mas temos que falar sobre política de desencarceramento.

Eu poderia continuar por horas aqui, mas creio que vocês entenderam.

Não existe outro objetivo por trás desta estratégia que não seja extinguir por completo a consciência do indivíduo. Quem já teve algum quadro depressivo sabe o que estou falando. A sensação de não saber qual caminho trilhar, estar em contradição consigo mesmo o tempo todo, a memória totalmente comprometida.

É isso! O objetivo é esse. Criar tantas contradições impositivas, que o futuro de quem se permitir ter a vida regida por estes preceitos, será tornar-se um vegetal com habilidades mecânicas.

Mas você deve se perguntar agora: “Tudo bem, Ramon, eu entendi e concordo, mas e o BBB?”.

Vocês já repararam a estrutura da casa? Esta semana vi uma postagem da Giovana Mel sobre isso e recomendo fortemente que vocês entrem no perfil dela para entenderem melhor. Luzes fortes, cores quentes, ambiente constantemente bagunçado. Tudo isso tem método. Tudo é pensado para gerar desarmonia.

É impossível dizer a intenção do diretor. A não ser que você o conheça. Mas uma coisa nós podemos afirmar: Esta edição está mostrando para os fãs do politicamente correto, o quão nocivo isso pode ser.

Um negro rejeitado numa investida, que passa a fomentar o discurso de racismo, é cancelado pela negra que defende o pronome neutro junto com o branco que pede desculpas por ser homem e gostaria de ser chamado de “senhore”. Esta, que em setembro do ano passado, fez campanha do Setembro Amarelo, saúde mental, impõe uma guerra interna contra ele. Um outro negro comediante, taxado de machista por sugerir que, se deitasse ao lado de uma das participantes cometeria algum tipo de assédio.

O público que estava ansioso por “cancelar” o “macho tóxico branco”, se viu completamente em parafuso, ao perceber que o monstro do cancelamento estava atirando para todos os lados.

A solução foi implorar pelo fim do cancelamento.

Mas não adianta mais. A intenção sempre foi essa. Perda de personalidade, consciência e individualidade. Perceberam? Vamos defender o negro que bebeu e falou umas besteiras, ou a negra, amante do pronome neutro, que está praticando bullying contra ele? Será que os fãs de Big Brother Brasil serão obrigados a dar o título de vencedor a um branco, hétero?

Penso que não. Segundo consta, a temporada começou há poucos dias, muito ainda pode acontecer e, segundo “duplipensar”, ainda pode-se “esquecer qualquer fato que tenha se tornado inconveniente”.

A bolha do politicamente correto, desesperada em manter a narrativa das minorias, está lutando bravamente para impedir o cancelamento dos dois protagonistas desse episódio. A bolha quer que os “queridinhos” do progressismo possam coabitar em paz e avancem, mostrando que somente na bolha, há “paz, amor e perdão”. O público do BBB não pode olhar para tela e se identificar mais com o “macho tóxico” do que com a “negra ativista”. Você não pode dominar sua personalidade.

Na obra 1984, a vaporização, de fato, eliminava a existência da pessoa da face da terra. Documentos, menções, citações, livros, fotos, casa, mesa de trabalho, absolutamente tudo era eliminado. Era como se a pessoa nunca tivesse existido. O cancelamento de hoje, ainda, não tem esse poder, mas cumpre seu papel.

Com medo de serem isolados, como um dos personagens da casa o é, jovens, crianças e até mais velhos, deixam suas identidades de lado e assumem um papel imposto pela patrulha. Perdem sua individualidade e passam a ser mais um na massa de manobra do movimento.

Big Brother Brasil continuará sendo um programa desprezível para mim, e honestamente, ele nem é o problema. A cultura do cancelamento não foi inventada por ele. Na realidade, BBB nos fez o favor de escancarar o quão desprezível, mesquinha e ridícula é a cultura do cancelamento.

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